Plano de saúde: há falha em serviço que mostra reajuste de coletivo
Painel criado no site da ANS para dar transparência à correção de contratos não mostra composição total do cálculo e gera dúvidas
Renda Extra|Márcia Rodrigues, do R7
A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) divulgou nesta terça-feira (27) um novo serviço no seu site para o usuário de convênio médico conferir a evolução dos reajustes de planos de saúde coletivos e empresariais.
A discussão sobre os reajustes dos convênios coletivos e individuais veio à tona após a ANS decidir, no início de julho deste ano, que as mensalidades dos planos individuais sofrerão queda em 2021 de 8,19% a partir de agosto.
Apesar de a iniciativa ser bastante positiva e tentar atender uma reivindicação dos usuários de planos coletivos e empresariais – estima-se que 80% do mercado – o sistema só mostra as estatísticas centrais dos reajustes de planos coletivos (empresariais e por adesão).
Dessa forma, é possível verificar somente os percentuais mais aplicados e o reajuste médio, o que é uma falha do serviço e leva o usuário ao erro, segundo Rafael Robba, especialista em direito à saúde do escritório Vilhena Silva Advogados.
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Para ele, o “Painel de Reajustes de Planos Coletivos”, como é chamado, "usa como métrica de cálculo apenas os índices usados para calcular o reajuste financeiro, excluindo a informação sobre o reajuste aplicado por sinistralidade (frequência de uso do plano de saúde)".
Robba fez a análise com exclusividade para o R7 Economize após um pedido da reportagem.
O cálculo que as operadoras fazem para chegar ao índice que é aplicado anualmente nas mensalidades é composto por dois fatores%3A o reajuste financeiro%2C também conhecido pelo mercado como inflação da saúde%2C e a sinistralidade%2C que é a relação entre o uso do plano de saúde pelos beneficiários e a despesa da operadora com aquele pool de clientes.
Robba pontua que a sinistralidade é o principal fator de elevação no reajuste das mensalidades e justamente esse percentual foi excluído da métrica da ANS.
Para ele, a decisão de não informar o percentual de sinistralidade aplicado pelas operadoras evidencia problemas como falta de transparência, de fiscalização e de controle por parte da ANS.
O advogado também chama a atenção para as estatísticas informadas pela autarquia em relação aos reajustes, o que pode causar ainda mais questionamentos quanto à falta de critérios.
"Há uma discrepância, por exemplo, no reajuste financeiro aplicado para os contratos com 30 vidas ou mais e com até 29 vidas. O reajuste financeiro, ou seja, a inflação, tem que ser a mesma para todos. Por que essa diferenciação?"
O que diz a ANS?
Em nota a ANS diz que "o Painel de Reajuste de Planos Coletivos mostra as estatísticas centrais dos reajustes de planos coletivos (empresariais e por adesão). Dessa forma, é possível verificar os percentuais mais aplicados, o reajuste médio, o número de contratos e de beneficiários nos contratos, entre outros dados".
O documento também pontua que "consulta por operadora de plano de saúde mostra a média de reajuste por operadora. Não estão disponíveis ali o percentual de cada contrato de plano coletivo. Para conferir os reajustes praticados a contratos específicos, o contratante/beneficiário pode solicitar a informação à sua operadora, que tem obrigação de prestar o esclarecimento. Caso a dúvida permaneça, o contato deverá ser feito por um dos canais de atendimento da ANS".
E ainda diz que é "importante também esclarecer que reajuste financeiro é o reajuste anual aplicado pelas operadoras e informados à ANS. É incorreto, portanto, afirmar que o reajuste financeiro não considera a sinistralidade. A metodologia de cálculo de cada operadora pode variar – pode ser um índice já existente, como o IGPM, pode ser o índice definido pela ANS para os planos individuais ou familiares, pode ser um índice calculado com base em um conjunto de fatores. Logo, o painel não trata da formação desses índices, mas dos percentuais de reajuste de fato aplicados aos contratos coletivos e informados à Agência."
Por fim, a ANS orienta que em caso de dúvidas sobre as cobranças recebidas, que os consumidores questionem suas operadoras.
E, "caso não tenham as questões esclarecidas, devem entrar em contato com a reguladora por um de seus canais de atendimento: Disque ANS: 0800 701 9656; Fale Conosco em www.gov.br/ans e Central de Atendimento a Deficientes Auditivos: 0800 021 2105.
Tréplica do especialista
Em resposta à nota da ANS, o advogado Robba, especialista em direito à saúde, destaca que o reajuste financeiro, na prática do mercado, é a inflação, aquela variação de custo médico apurada pelo plano.
Ele também afirma que "o reajuste por sinistralidade é apurado a parte e, depois, é feito um índice único".
E, com isso, "a nota metodológica citada pela ANS no Painel de Reajuste de Planos Coletivos induz ao erro, quando eles citam 'reajuste financeiro' na parte de métricas".
"Existe uma instrução normativa que exige que a operadora apresente esses dois índices citados acima de forma separada, ou seja, a ANS teria como detalhar essa informação nesse painel, deixando as informações ainda mais completas e claras para os consumidores", acrescenta o advogado.
A instrução à qual o especialista se refere é a Instrução Normativa nº 13, em seu item 15 do anexo, exige que a operadora, ao informar à ANS o índice do reajuste aplicado, especifique o reajuste relativo à variação de custo assistencial e o reajuste relativo à utilização.
Usualmente, segundo Robba, o mercado adota o reajuste de custo assistencial como reajuste financeiro, enquanto o reajuste de utilização é denominado pelo mercado como reajuste por sinistralidade. "Os índices adotados pelas operadoras carecem de fiscalização, transparência e regulamentação da ANS, deixando os usuários desamparados por uma determinação arbitrária da própria operadora", cita Robba.
"Reforçamos que para aperfeiçoar o serviço disponibilizado no site da ANS e expor com mais clareza as informações aos consumidores, a Agência, em posse dos dados que ela mesma exige das operadoras, deveria apresentar as informações detalhadas no Painel de Reajustes de Planos Coletivos."
Consultas podem ser feitas de forma agrupada ou por operadora
Ao divulgar a criação do painel, a ANS o classificou como dinâmico e interativo por permitir a realização de pesquisas em vários formatos com base nas informações e filtros disponíveis.
De acordo com a ANS, as consultas podem ser feitas de forma agrupada ou individualizada por operadora.
Também é possível selecionar:
• Por mês e ano;
• Tipo de contratação (empresarial, adesão ou ambos);
• Porte do contrato ou da operadora; e
• Modalidade da operadora (autogestão, cooperativas médicas, filantropia, medicina de grupo e seguradoras).
Estão disponíveis dados de janeiro de 2016 a maio de 2021 dos reajustes aplicados aos contratos coletivos em vigor no mercado brasileiro que apresentam formação de preço preestabelecida, ou seja, com valor pré-fixado da mensalidade.
Em sua divulgação a ANS também destacou que o painel fornece várias medidas sobre as tendências centrais observadas no setor nesse período.
Entre elas, o reajuste médio que reflete a média ponderada dos reajustes levando em consideração o número de beneficiários de cada contrato.
O Painel de Reajustes de Planos Coletivos neste link.
Revisão de metodologia veio após auditoria do TCU
Em dezembro de 2018, após sofrer uma auditoria do TCU Tribunal de Contas da União, e ser alvo de uma ação civil pública, a ANS decidiu rever o método de cálculo para apuração dos índices de reajustes dos planos individuais e familiares, adotando critérios mais transparentes.
Robba também sugere que a ANS divulgue os dados recebidos das operadoras sobre os planos individuais.
"Enquanto os critérios de reajustes permanecerem obscuros e os mecanismos de informação não forem disponibilizados com clareza e transparência para o consumidor, a judicialização questionando os índices anuais aplicados às mensalidades permanecerá elevada nos tribunais de todo o país."
Veja a íntegra de nota da ANS
A Agência Nacional de Saúde Suplementar reitera que, ao contrário do mencionado na matéria, o painel de reajustes de planos coletivos utiliza os percentuais efetivamente aplicados pelas operadoras nos contratos coletivos, independentemente da forma de cálculo (índices financeiros, índice ANS, por sinistralidade e/ou outra metodologia) estabelecida nas cláusulas contratuais firmadas entre as partes.
Entenda-se por reajuste financeiro qualquer variação positiva, negativa ou igual a zero aplicada sobre o valor cobrado em contratos coletivos, excetuando-se apenas as variações do valor em razão da mudança por faixa etária, conforme definido na RN nº 171/2008 e na Instrução Normativa - IN/DIPRO nº 13/2006, que detalha o procedimento de envio de comunicados dos percentuais dos reajustes.
Com relação ao reajuste de planos individuais, os dados utilizados para o cálculo são públicos e estão disponíveis na página da ANS.
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