Armazém Utopia: zona portuária ganha murais feitos por alunos e professores da rede municipal
Iniciativa tem objetivo de reconhecer potencial artístico nas manifestações urbanas
Rio de Janeiro|Do R7
O Armazém da Utopia, na zona portuária do Rio ganhou, nesta quinta-feira (09), murais compostos por ladrilhos pintados a mão por alunos e professores de seis instituições da rede municipal de ensino.
Fixadas nos muros do armazém, as peças são fruto de um trabalho que a Associação Inscrire Brasil realiza, há cerca de quatro anos, com o objetivo de motivar a expressão dos estudantes sobre o que aprendem nas escolas sobre direitos humanos.
O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, que participou da cerimônia de lançamento, se mostrou impressionado com um desenho que retratava uma situação de bullying entre crianças.
— A importância desses projetos está no esforço das crianças e na beleza de cada um dos desenhos. Vivemos um momento de violência anômica e talvez já tenhamos perdido uma parte de uma geração. Mas não queremos perder mais nada, nem ninguém. É preciso levar à consciência de nossas crianças os valores eternos dos direitos humanos. Quem olhar esses desenhos nos azulejos verá que as nossas crianças se esmeraram.
O projeto contou com a participação de alunos e professores de seis unidades de ensino da zona norte: Creche Municipal Geralda de Jesus Aleixo (Jacarezinho); Escola Municipal Vinícius de Moraes e Escola Municipal Jean Mermoz (Cachambi); Escola Municipal Oswaldo Cruz (Higienópolis); Escola Municipal Pernambuco e Escola Municipal Pace (Maria da Graça). Cada unidade compôs um painel com desenhos interpretativos sobre direitos humanos.
Além disso, a partir de uma iniciativa assinada por Françoise Schein para homenagear o Bicentenário da Missão Artística Francesa, a Inscrire fez com que a arte de Jean-Baptiste Debret tomasse os muros do armazém com uma releitura de sua obra por sete artistas urbanos do grafite: Afa, Airá "O Crespo", Lya Alves, Gil Faria, Meton Joffily e Ràl Dozanime.
A importância do grafite como manifestação cultural também foi ressaltada por Crivella, que se referiu a este tipo de trabalho como "uma arte que sai da alma para os olhos de quem vê":
— São desenhos que simbolizam sentimentos como a dor, o sofrimento, a melancolia. Mas, ainda assim, nos apresenta uma beleza clara, esfuziante. É algo, de fato, fantástico. Isso é arte e não podemos esconder isso de ninguém. Grafite nada tem a ver com pichação e, nas ruas, só traz beleza.
Lya, que retratou um escravo vendendo rosas para o seu proprietário e cocos para comprar sua liberdade, teve seu trabalho premiado com uma viagem a Paris, na França. A artista, que mora em Niterói, e descobriu a arte urbana em 2008.
— As correntes da escravidão não fazem mais parte da nossa realidade, mas seu peso ainda permanece. É muito importante, neste trabalho sobre direitos humanos, lembrar que o passado ainda se faz presente. E ver a participação de crianças nesse processo é gratificante. Elas precisam, muito mais do que aprender a história, contextualizar essas informações para que compreendam o motivo de termos chegado até aqui.
A secretária municipal de Cultura, Nilcemar Nogueira, ressaltou que a iniciativa é um reconhecimento ao grafite como expressão artística que merece ser valorizada.
— Estamos prestando um reconhecimento à legitimidade do grafite como expressão artística. Vamos trabalhar sempre para valorizar a street art. Devemos defender a sua permanência. É uma arte disseminada no mundo todo. Essa iniciativa nos coloca na dianteira do apoio às manifestações culturais. Viva a arte e seu poder transformador.
Segundo a Inscrire, essa foi a primeira vez em que a história de uma cidade e de sua pós-colonização tomaram forma através de uma obra participativa que envolveu crianças e artistas. Por isso, a missão de disseminar temas como cidadania, direitos fundamentais, entre outros, em escolas e creches públicas prosseguirá.
— Essas pessoas deram outra vida a esse lugar. São painéis monumentais. Iniciamos esse projeto nas estações de metrô francesas e hoje vemos nossa ideia de aliar a arte aos direitos humanos ganhar o mundo. Esse trabalho no Rio de Janeiro só foi possível porque contamos com grandes parceiros - disse o diretor da Inscrire Brasil, Philippe Nothomb.
Entre as crianças, as alunas Mariana Ferreira Morais e Eduarda Cardoso de Carvalho, de 9 anos, da Escola Jean Mermoz, falaram com orgulho sobre o trabalho que fizeram juntas, em defesa das crianças que sofrem bullying, e que recebeu muitos elogios do prefeito. Para Mariana, o problema acontece com frequência nas escolas e precisa ser combatido:
— Já vimos várias pessoas da nossa escola serem tratadas dessa forma. Nas ruas acontece a mesma coisa. Resolvemos nos dedicar a esse trabalho para que isso não aconteça mais. É uma coisa muito feia e não gostamos disso.
Para Eduarda, a exposição do trabalho em uma área pública representa uma "oportunidade maravilhosa" de conscientização das pessoas sobre este tema.
As duas iniciativas contaram com o apoio da Secretaria Municipal de Cultura e da Embaixada e Consulado da França, além de parceiros como a Secretaria Municipal de Educação, Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro, Instituto EixoRio, Concessionária Porto Novo, Circlesgroup Brasil e UFRJ, além do próprio Armazém.