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Imediatismo prejudica combate a enchentes em São Paulo

Especialistas apontam necessidade de planejamento de médio a longo prazo para enfrentar o problema que impacta o cotidiano da cidade

São Paulo|Guilherme Padin, do R7

Enchentes se repetem ano a ano na capital paulista
Enchentes se repetem ano a ano na capital paulista

O foco em soluções imediatistas para lidar com danos provocados pelas chuvas de verão é apontado como uma das principais razões pelas quais a cidade de São Paulo ainda sofre tanto com o problema. Para especialistas ouvidos pela reportagem do R7, apenas um planejamento a médio e longo prazo – e sua execução – poderia amenizar os estragos.

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“Há inúmeras ações possíveis para a minimização dos problemas, mas muitas não são executadas”, diz Angélica Benatti, professora e diretora do curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Mackenzie. Vereador e membro do Comitê de Chuvas e Enchentes da capital paulista, Gilberto Natalini (PV-SP) aponta uma “falta de visão estratégica” nas últimas gestões da cidade.

Especialistas apontam uma série de medidas em comum para enfrentar o problema com maior eficácia: permeabilização do solo, tratamento dos esgotos, reaproveitamento da água das chuvas e construção de parques lineares e espaços públicos com áreas verdes. Uma outra solução também é ter uma política voltada para o cuidado com as calçadas, que não entram no foco do poder público por serem de responsabilidade dos proprietários dos imóveis.

“Resiliência é uma palavra importante quando pensamos em soluções”, acrescenta Angelo Filardo, professor da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo). “Se vamos conviver por muito tempo com isso, é bom que saibamos como reagir enquanto a situação for recorrente”.


Filardo explica que, enquanto se desenvolve uma solução de médio e longo prazo, é preciso ser capaz de lidar rapidamente com danos enquanto o problema ainda não for sanado, tanto por meio de reforço nas operações de limpeza pública e como de ações da Defesa Civil. “Vamos lidar com enchentes catastróficas acima da nossa capacidade e precisaremos ter a capacidade de nos recuperar rápido dessas situações.”

E os piscinões?


Atualmente, cidade de São Paulo tem 32 piscinões; serão mais 5 até fim do ano
Atualmente, cidade de São Paulo tem 32 piscinões; serão mais 5 até fim do ano

Na avaliação de Natalini, a prefeitura e o governo do Estado, na tentativa de enfrentar o problema às pressas, acabam buscando nos piscinões a solução. “Qual cidade do mundo transforma um parque em piscinão? É um retrocesso ambiental terrível”, critica o vereador. “É um caminho, mas deve se analisar quando é e quando não é necessário.”

A Prefeitura de São Paulo havia prometido 19 piscinões, mas deve entregar somente 13 até o fim da atual gestão, em 2020.


Angelo Filardo, professor da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo), avalia o piscinão como solução viável, mas faz ressalvas. “Deve-se também avaliar os custos e compensar os prejudicados, implantando o piscinão junto com uma área de lazer, porque o benefício é grande”, afirma. “Quem imaginava que ganharia uma praça acaba ganhando uma grande banheira de água suja. Temos que melhorar o conceito do piscinão, entendendo que a população não pode ser penalizada, deve receber uma compensação por isso.”

A gestora socioambiental Annabella Andrade, representante do Movimento pela Praça São Crispim, que luta contra a construção de piscinões em Itaquera, Pompeia e Lapa, defende drenagens sustentáveis. “Desejamos fervorosamente resgatar, preservar e manter os poucos espaço verdes, os recursos hídricos e as águas subterrâneas da nossa cidade”, diz.

Esgoto

Contato com enchentes pode causar doenças como hepatite A e leptospirose
Contato com enchentes pode causar doenças como hepatite A e leptospirose

Outro ponto citado por Filardo é a redução da poluição na água da enchente, especialmente do esgoto não coletado e o lixo. “Tornar a água menos suja é importante porque a água da enchente traz doenças com a mistura de esgoto na água. Seria uma política de resistência temporária, ou de ‘quanto menos, melhor’”.

“São Paulo não tem uma política pública de reaproveitamento da água de chuva, nem se discute isso. É um atraso de vida”, complementa Natalini.

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Angélica Benatti alerta também para o risco de proliferação de doenças. “Os rios recebem hoje grande parte do esgoto doméstico sem tratamento, o que agrava muito a situação. Há mais do que danos materiais e financeiros”, alerta a professora. Para a professora, é necessário integrar o planejamento urbano ao ambiental.

Cuidados

Em períodos de verão e fortes chuvas, deve ser redobrada a atenção para se evitar doenças infectocontagiosas como leptospirose, hepatite A, diarreia e febre tifoide, cujos vírus e bactérias se espalham com mais facilidade onde há enchentes e transbordamento de rios e esgotos. Na capital, há 927 pontos de alagamento contabilizados pela Prefeitura.

Entre os principais cuidados, é necessário evitar a água contaminada, descartar alimentos que tenham tido contato com estas águas e impedir que crianças brinquem em enchentes e poças. Nos primeiros sintomas, como febre, dores na cabeça e no corpo – principalmente na panturrilha –, o médico deve ser procurado.

Consequências

O número de mortes em decorrência das chuvas no estado de São Paulo saltou 310%, segundo dados da Defesa Civil. Entre 1º de dezembro de 2017 e 5 de abril de 2018, foram dez mortos. No mesmo período, um ano depois, 41 pessoas morreram. Considerando-se apenas a capital, o número passou de 4 para 7 óbitos no mesmo período.

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Há impacto também na redução da cobertura vegetal da cidade. São Paulo possui, em média, 4m² de área verde por habitante. A recomendação da ONU (Organização das Nações Unidas) para metrópoles é de 12m². O registro de queda de árvores, por exemplo, foi 38% maior em 2019 (4.978 quedas) em relação a 2017 (3.611).

História

Os danos causados a São Paulo pelas chuvas estão ligados à história da cidade e seu processo de urbanização. A cidade passou por processos de impermeabilização do solo e privilegiou o transporte terrestre individual em detrimento de possibilidades hidroviárias. “Muitos rios foram sendo canalizados”, afirma Benatti.

“No fim do século 19 havia uma compreensão de que a engenharia resolveria o problema por meio da canalização. Mas isso só mudou o problema de lugar”, conta Filardo. “Como esse estrago está feito, e ninguém abandonará a cidade por isso, deve-se corrigir o problema com obras, que nunca irão resolver 100%. Apenas diminuir a frequência com que ocorrem”, conclui.

Poder público

A reportagem fez questionamentos à Prefeitura de São Paulo e ao governo do Estado sobre o combate às enchentes e quais são as ações realizadas em conjunto entre os dois poderes. Sobre a gestão da capital, qual seria a razão para os 19 piscinões não terem sido entregues como previamente prometido.

A gestão municipal de Bruno Covas, iniciada por João Doria (hoje governador), apontou a realização de serviços como limpeza de córregos, microdrenagem, limpeza e construção de piscinões, conservação de galerias e de obras de infraestrutura, como a entrega de cinco piscinões em 2019, além da canalização de córregos nas zonas sul e norte. No entanto, não esclareceu o motivo de não entregar os 19 piscinões prometidos.

De âmbito estadual, a DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo) citou o piscinão em Franco da Rocha, o pôlder (muro de contenção) da Vila Itaim – que ainda sofre com as inundações –, dois parques lineares (entre 2018 e 2019) e a limpeza e desassoreamento de piscinões e rios da cidade.

Sobre obras conjuntas, prefeitura e Estado destacaram os piscinões Guamiranga e Olaria, construídos pelo Estado e cuja manutenção está sendo assumida pela prefeitura, além dos cuidados com os rios Pinheiros e Tietê.

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