O inquérito para apurar a morte do estudante Lucas Antônio Lacerda da Silva, eletrocutado ao encostar em um poste com câmeras para monitoramento no dia 4 de fevereiro de 2018 quando participava do pré-Carnaval de rua no centro de São Paulo, ainda não foi finalizado e está no IC (Instituto de Criminalística). O órgão é responsável por fornecer provas técnicas para auxiliar na resolução de casos criminais.Leia também:Especialistas: prefeitura falhou com jovem eletrocutado no Carnaval Segundo a SSP (Secretaria de Segurança Pública), o caso foi investigado e relatado em junho do ano passado, e quatro pessoas das empresas Dream Factory (organizadora dos Carnavais de rua de 2018 e 2019) e GWA Systems (terceirizada da Dream Factory para a instalação de câmeras de segurança) foram indiciadas por homicídio culposo. No entanto, no fim de novembro de 2018, o MP-SP (Ministério Público de São Paulo) devolveu o inquérito ao IC e solicitou novas diligências. Além disso, em janeiro deste ano, os advogados de defesa acrescentaram mais 40 questões. Ao término, serão enviados dois laudos, um em resposta ao MP-SP e o outro para os novos quesitos formulados. Após os complementos, o inquérito retornará à Justiça, que julgará o caso. Para o advogado da família da vítima, Alexandre dos Santos, o fato de o inquérito seguir em andamento após um ano da tragédia pode ser considerado um período dentro do normal para a Justiça. Mas para os parentes, conta, é um prazo longo. “Talvez seja pouco [tempo], pois é um inquérito com muitas variáveis e o tempo corre diferente para a Justiça. Mas para a família é muita coisa. Você tem que vivenciar essa dor diariamente e o sofrimento por não ter mais o seu filho, de passar pelo quarto dele e não poder abraça-lo, é muito difícil”. No momento, o advogado aguarda a devolução dos novos questionamentos para poder prosseguir com o processo. A morte de Lucas ocorreu quando o rapaz pulou uma grade de ferro e encostou a palma da mão no poste energizado, com as câmeras de monitoramento instaladas pela empresa GWA Systems na rua Matias Aires no cruzamento com a rua da Consolação, no centro de São Paulo. Lucas e amigos participavam do desfile do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta. No último sábado (2), Lucas faria 23 anos. A missa de um ano da morte do estudante do terceiro ano de engenharia biomédica da Universidade Federal do ABC (UFABC) foi realizada na noite do último domingo (3). A mãe de Lucas, Carla Maria Ramos de Lacerda Silva, fala que não ter uma definição até o momento só aumenta a angústia e revolta. “Quando teremos uma resposta? Queremos Justiça para o Lucas. Pode durar anos, mas estaremos cobrando os responsáveis”. E completa: “é triste perder um filho, ainda mais na circunstância como aconteceu”. Irmã de Carla Maria, Renata Lacerda era também madrinha de Lucas. A tia diz que a família se sente abandonada porque a Justiça ainda não foi feita. “O que sentimos é uma indignação muito forte porque o inquérito até hoje não foi resolvido”. Renata conta que a notícia da morte de Lucas desestruturou a família e de lá para cá tudo se resume a dor e choro. “O pai do Lucas chora todos os dias. A mãe está arrasada. Os parentes seguem completamente de luto.”Câmeras não estão mais instaladas no poste A reportagem foi ao local do acidente, no centro de São Paulo, acompanhada de um especialista em energia elétrica, o professor José Roberto Soares, para vistoriar o poste. Munido de um equipamento que aponta se há tensão e outro aparelho que mede a corrente, Soares constatou que, hoje, as estruturas metálicas não estão energizadas.Veja o vídeo abaixo: Na opinião do professor, o poste deveria ser melhor vistoriado. “Faltou alguém ir lá e testar efetivamente se tudo estava de acordo. Se foi feita uma vistoria no poste, aquilo lá passou despercebido.” O professor afirma que, ao segurar a grade com uma mão e, com a outra, se apoiar no poste, Lucas fez o suficiente para que a corrente cruzasse o corpo e atingisse o coração. “Provavelmente, o cabo instalado no poste ficou com tensão, alguma isolação rompeu e passou para o poste”, conta. A reportagem também teve acesso aos laudos do Núcleo de Engenharia do IC. Segundo os peritos, o poste ficou energizado pela falta de isolamento dos condutores elétricos instalados no interior de uma das câmeras. De acordo com o documento, a ausência de isolamentos desrespeita as normas técnicas e ameaça a integridade físicas das pessoas. O documento foi obtido com exclusividade pela Record TV.Promotor quer anular edital de Carnaval Em junho do ano passado, o promotor de Justiça Nelson Sampaio (Patrimônio Público e Social) protocolou uma ação civil pública de improbidade administrativa contra a Prefeitura de São Paulo e pediu a anulação do edital do Carnaval de rua de 2018 e de 2019. Sampaio solicitou ainda que um novo fosse elaborado. Segundo a ação, a Dream Factory teria sido favorecida no processo de licitação e há inúmeras irregularidades na parceria firmada.Outro lado A reportagem fez contato com as empresas Dream Factory e GWA Systems e enviou os questionamentos. A GWA Systems enviou a seguinte nota: "A empresa GWA SYSTEMS vem a público para esclarecer que sempre colaborou com as autoridades e órgãos públicos competentes na busca pela verdade, a fim de apurar os eventos que redundaram com o trágico falecimento de Lucas Antônio Lacerda da Silva. Nesse sentido após o relatório final da D. Autoridade Policial foram apresentados argumentos ao Poder Judiciário que indicavam uma série de discrepâncias técnicas presentes na investigação policial, especialmente no que diz respeito aos laudos periciais. Sendo assim, os autos do inquérito policial foram remetidos ao Instituto de Criminalística para serem esclarecidas as divergências apontadas. A empresa GWA SYSTEMS aguarda os esclarecimentos técnicos pelo Instituto de Criminalística, a fim de comprovar que seus equipamentos e instalações não tiveram qualquer relação com o acidente que infelizmente vitimou Lucas Antônio Lacerda da Silva". A Dream Factory ainda não se pronunciou. A Prefeitura de São Paulo afirmou que o processo de escolha da empresa organizadora do Carnaval foi "conduzido de forma regular e transparente". "Cabe destacar que não houve destinação de recursos públicos para o Carnaval de 2018, sendo que a parceira ficou responsável pela captação da doação e patrocínios, como também pela operação logística do Carnaval de rua. A prefeitura prestará todas as informações solicitadas pela Justiça."