Butantan poderá exportar soro anticovid, caso seja aprovado
Em entrevista exclusiva, diretora de desenvolvimento do Butantan explica estudo de soro que poderá tratar casos moderados e graves
Saúde|Homero Augusto, da RecordTV
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) liberou a realização de testes em humanos de um soro com anticorpos para o coronavírus, desenvolvido pelo Instituto Butantan. O objetivo é criar um medicamento eficaz para pacientes já contaminados com a covid-19. O jornalismo da RecordTV conversou com Ana Marisa Tavassi, diretora do Centro de Desenvolvimento e Inovação do Butantan, sobre essa nova etapa nos estudos e planos futuros para o soro, no Podcast JR 15 Minutos. As expectativas são altas. Entenda:
O que é o soro anti-coronavírus?
O soro foi produzido a partir da injeção do Coronavírus em cavalos. O animal, que possui um sistema imunológico resistente, produz anticorpos em larga escala. Estes anticorpos são coletados através do plasma do sangue do cavalo e transformados em um soro, que poderá ser aplicado de maneira intravenosa em pacientes já contaminados pelo coronavírus, da mesma maneira que os soros antiofídicos, produzidos pelo Butantan há décadas. “A ideia é que o soro reconheça o coronavírus e impeça que este se multiplique. Isso evita que a inflamação se agrave e que os sintomas aumentem”, diz Ana Marisa.
O soro é uma “vacina instantânea”?
Segundo Ana Marisa, não. O propósito de uma vacina contra o coronavírus é ensinar o corpo humano a produzir anticorpos por conta própria e prevenir que o vírus se multiplique ao entrar em contato com o organismo humano. Já no caso deste soro, os próprios anticorpos injetados atuarão no combate ao vírus em pacientes que foram contaminados. Ou seja, ele é muito mais parecido com um medicamento antiviral, do que com uma vacina. Segundo a pesquisadora, o ideal é que, futuramente, a vacina e o soro sejam aliados no combate ao coronavírus.
O soro funciona em pacientes com sintomas graves da Covid-19?
Essa é a pergunta que os pesquisadores do Instituto buscam responder na fase de testes clínicos. Como o soro impede a multiplicação do vírus, a ideia é que ele seja mais eficaz em pacientes ainda em estágio mais leve dos sintomas. Caso ele mostre resultados positivos, poderá ser capaz de reforçar as defesas dos pacientes com sintomas graves e, assim, prevenir a fatalidade. É importante lembrar que o soro não pode ser usado como medicamento preventivo em pessoas saudáveis. Ele atua no combate ao vírus já inserido no corpo.
Como funcionará o estudo clínico em pacientes humanos?
Segundo Ana Marisa, o estudo ocorrerá em duas fases e locais diferentes. O soro será aplicado em pacientes internados com covid-19 no Hospital do Rim e Hospital das Clínicas, em São Paulo. Por ser um medicamento de combate ao vírus, a pesquisadora espera encontrar resultados já na primeira semana de aplicação. “Você está entregando o anticorpo pronto para combater (o vírus). Então, neste primeiro momento, serão pessoas que têm alto ou altíssimo risco de evoluir para uma doença grave. Os pacientes não tomarão em casa, não é um soro caseiro”.
Os resultados foram positivos em animais?
“Os testes com animais não são perfeitos. Nos animais que testamos, nós vimos a geração de anticorpos, são animais que desenvolvem problemas no pulmão, (...) e o resultado foi uma infecção mais branda, sintomas mais leves”. Segundo a pesquisadora, todas as etapas regulatórias dos testes foram cumpridas à risca e o resultado é muito promissor.
Existem efeitos colaterais ao soro?
Apenas os testes clínicos poderão afirmar, mas Marisa mantém o otimismo: “O Butantan tem muita experiência em soroterapia. Não temos histórico de gravidades relacionadas ao soro, mas é claro que pode acontecer algum caso de reação alérgica, é para isso que faremos a soroterapia. Mas não conhecemos histórico de reações com soros, é muito incomum. Nós seguimos todas as etapas regulares de testes, justamente para descobrir qual a quantidade correta a ser injetada, todas as reações causadas em animais... E todos os resultados foram positivos até então”.
Se aprovado, o soro poderá ser distribuído para outros países?
Diferente da vacina, o soro anticoronavírus não depende de insumos para a produção. Então ele pode ser produzido por outras instituições que se responsabilizam pela produção de soros ao redor do mundo. “O soro pode ser traduzido como um antiviral, um medicamento. Se ele se mostrar muito positivo, poderá haver uma demanda de outros países. Mas aí veremos como será a logística: se iremos transferir essa tecnologia para outros países. Existem outros produtores de soro em todo o mundo. Então eles também têm possibilidades de produção”.
A produção do soro afetará a velocidade de produção da vacina Coronavac?
Não. As fábricas que produzem a Coronavac e o soro anticoronavírus são diferentes. O Butantan possui uma fazenda de cavalos onde o plasma no sangue dos animais é coletado, para depois produzir o soro em laboratório. A equipe que produz este soro não trabalha na produção de vacinas e vice-versa. A pesquisadora conta que no Butantan já está levando mais cavalos para a fazenda para acelerar a produção do soro, caso ele se torne um medicamento aprovado pela Anvisa.
Quando o soro poderá ser distribuído para a população?
Tudo depende da velocidade e dos resultados da terceira fase de testes do possível medicamento. Duas coisas essenciais devem ser analisadas: a eficácia do medicamento no combate ao vírus em pacientes contaminados e a possibilidade do surgimento de efeitos colaterais após a aplicação.
O objetivo do Instituto é apresentar resultados positivos o mais rápido possível para já iniciar a produção em larga escala, devido à urgência do agravamento de casos e aumento no número de mortes por covid-19. Como os testes não requerem grupos tão grandes de pessoas, como no caso das vacinas, espera-se que a divulgação dos resultados e, possivelmente, a aprovação do soro, venham dentro das próximas semanas.
A entrevista completa você confere no podcast JR 15 Minutos, com Celso Freitas, logo mais.