Quando alguém comete um crime grave, geralmente envolvendo um homicídio, é comum ouvirmos sem mais nem menos que o acusado é um “psicopata”. A palavra, entretanto, envolve outras características além do fato de alguém ter feito uma maldade. Para ser considerado um psicopata, o sujeito deve preencher uma série de requisitos – e eles são igualmente assustadores. De acordo com a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro Mentes Perigosas – O psicopata mora ao lado, essas pessoas frias e sem nenhum tipo de sentimento pelo próximo representam 1% das mulheres e 3% dos homens da Terra. Segundo ela, não se trata de uma doença que pode ser adquirida, mas de uma “maneira de ser”. — Por isso, chamamos de transtorno de personalidade. A pessoa nasce com aquele tipo de funcionamento. Com o tempo, a personalidade dela vai se manifestando a partir deste tipo de funcionamento.Leia o especial completo sobre os psicopatas no R7 Este “tipo de funcionamento” é explicado pela psiquiatra como uma disfuncionalidade cerebral. Os psicopatas não teriam um funcionamento “normal” do chamado sistema límbico do cérebro, que é o sistema emocional, responsável pelos sentimentos. Ele é o que nos faz sentir empatia pelo outro e reagir afetivamente.Como age um psicopata? O psicólogo Robert Hare é o criador da chamada Psychopathy Checklist, um dos métodos mais usados no mundo por profissionais da área de psiquiatria na identificação de psicopatas. Em seu livro Sem Consciência – O mundo perturbador dos psicopatas que vivem entre nós, ele faz um resumo geral dos traços e comportamentos dos psicopatas deixando claro que a Psychopathy Checklist é um instrumento complexo que deve ser usado apenas por profissionais. Segundo Hare, os psicopatas costumam ser eloquentes e superficiais, egocêntricos e grandiosos, não sentem remorso ou culpa, não têm empatia, são enganadores, manipuladores e demonstram emoções “rasas”. No cotidiano, eles ainda podem se mostrar impulsivos, com fraco controle do comportamento, necessidade de excitação, falta de responsabilidade e comportamento adulto antissocial."Muita gente acha que maldade genuína não existe", diz psiquiatra O psicólogo Christian Costa, do Ceccrim (Centro de Estudos de Comportamento Criminal), explica que o comportamento antissocial na vida adulta não quer dizer distante, mas, sim, violento. Ele acrescenta ainda que psicopatas podem apresentar, na infância e na adolescência, transtorno de conduta e, na vida adulta, promiscuidade sexual. Ele ressalta que a principal força dessas pessoas está na manipulação e na mentira patológica. — Eles têm um charme superficial. Mentem em tudo. Estão sempre se colocando em evidência. Quando são pegos na mentira, mudam a história calmamente. Sempre vão conseguir uma mentira. Outras características citadas por Costa são o estilo de vida parasitário do psicopata e sua incapacidade de assumir a responsabilidade por seus atos, sempre procurando alguém para culpar pelos seus erros, seja sua “infância sofrida” ou o “governo que não deu oportunidade de emprego”. No caso dos psicopatas com tendências ao crime sexual, é muito comum ainda culpar a vítima e dizer que foi seduzido. — Ele é um parasita. Ele faz as pessoas trabalharem para ele, darem dinheiro para ele. Ele vai viver de seguro social, vai ser irresponsável com os filhos, não vai pagar pensão. Além disso, segundo o psicólogo, os psicopatas têm tendência ao tédio, o que faz com que ele precise estar sempre sendo estimulado. Segundo o especialista em psicologia clínica e criminal Sidney Shine, da USP (Universidade de São Paulo), a principal diferença entre um psicopata e uma pessoa “normal” é que psicopatas não têm empatia em relação ao outro, que pode ser manipulado, usado ou até morto, segundo sua necessidade. — O que caracteriza o psicopata seria uma condição em que não haveria o freio, comum a todos nós, do sentimento de culpa. Podemos falar de uma certa insensibilidade.Reconhecendo um psicopata Apesar de nem todos eles cometerem homicídios, podem ser capazes de tomar várias outras atitudes reprováveis e catastróficas na vida de suas vítimas. Costa ressalta que eles são experts na arte de se camuflar e que pode ser bem difícil reconhecê-los no dia a dia. — Eles são capazes de enganar até mesmo peritos experientes que não foram treinados para ter esse tipo de observação.Veja como se proteger dos psicopatas no trabalho A psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva defende que temos muito mais chances contra os psicopatas se aprendermos a reconhecer seus principais traços. Só assim podemos nos proteger e evitar que façam estragos em nossa vida. Ela relembra que eles vivem de imagem, de manipular e seduzir, por isso, é preciso ter cuidado com aqueles que chegam como se fossem “grandes amigos de infância”. — Todo psicopata entra na sua vida causando uma ótima impressão. Até mesmo um estelionatário, um psicopata "leve". Um grande estelionatário é um grande sedutor.Temos mais psicopatas hoje em dia? Costa afirma que a maior habilidade do psicopata é se camuflar porque ele sabe que está errado. Por isso, o especialista não acredita que o mundo atual ajude a criar mais psicopatas. — Hoje, com o advento da internet, de câmeras de filmagem da prefeitura, da polícia, da escola, do condomínio, todos estão mais vigiados. O psicopata não age quando está sendo vigiado. A psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva também não acredita que haja mais psicopatas atualmente. Ela explica que eles sempre existiram na história da humanidade e deu como exemplos outros tempos mais tenebrosos da história do mundo, como a inquisição e as guerras. Ana Beatriz, no entanto, diz que é possível que em algumas sociedades os “valores psicopáticos”, como o da esperteza, estejam sendo mais propagados, fazendo com que os psicopatas sejam tidos como pessoas bem vistas. — Aumentaram as possibilidades e eles passaram a ser vistos como grandes empresários, grandes políticos... E o poder de manipulação da massa ficou muito maior, a comunicação facilitou muito isso. Sidney Shine acredita que é necessário se fazer algumas questões. Existem instituições e situações em que “os fins justificam os meios”? É certo e importante o “cada um por si e Deus para ninguém”? Incentivamos as pessoas a terem sucesso e dinheiro mesmo que a custa do sofrimento dos outros? — Se tivermos algumas partes do mundo agindo assim, talvez estejamos cultivando um espaço potencial para o psicopata agir.Veja como funciona o cérebro de um psicopata*Amanda Martins, estagiária do R7