“É a aniquilação do SUS”, diz presidente do Conselho Nacional de Saúde sobre aprovação da PEC dos gastos
Porém, para professor, medida não causará grandes impactos no sistema público
Brasil|Fernando Mellis, do R7
A saúde pública brasileira deverá entrar na UTI nos próximos anos, caso a PEC (proposta de emenda à Constituição) que limita os gastos do governo siga adiante. Essa é a opinião do presidente do CNS (Conselho Nacional de Saúde), Ronald Ferreira dos Santos.
Deputados aprovaram em primeiro turno, no começo da madrugada desta terça-feira (11), o texto que impõe um teto para as despesas federais nos próximos 20 anos. Uma previsão feita pelo CNS aponta que o SUS (Sistema Único de Saúde) deixará de receber nesse período mais de R$ 434 bilhões. A PEC 241 ainda precisa ser votada mais um turno na Câmara e novamente no Senado.
Santos classifica a proposta do governo como “uma ruptura” com a Constituição de 1988, que garante aos brasileiros o direito à saúde.
— É simplesmente a aniquilação desse sistema. É a inviabilização desse sistema. Tudo o que a Constituição de 88 garantiu vai por água abaixo. E com um Congresso que não tem o poder constituinte originário, que o povo não delegou o poder de escrever uma nova Constituição.
Para o presidente do CNS, os primeiros impactos deverão refletir na ausência de recursos para a saúde básica.
— Ao longo desses últimos anos, o SUS conseguiu fortalecer principalmente a atenção primária, a saúde básica. Esse sistema vai ser liquidado. [...] O que vamos ver é fechamento de hospital, é fechamento de unidade básica de saúde, é fechamento de estruturas da saúde da família, é redução de estrutura de Samu. Muito provavelmente, a farmácia popular é outra que não perdura, porque tudo isso tem um subsídio.
Hoje, a União é obrigada a gastar um percentual mínimo da Receita Corrente Líquida com saúde (13,2%). Essa parcela chegaria a 15% em 2020. A PEC 241, antecipa os 15% para 2017, mas congela os gastos nesse patamar pelos próximos 20 anos. Na prática, o mínimo de gasto se torna o máximo, que será corrigido anualmente pelo IPCA, índice que mede a inflação.
Santos calcula que se a PEC tivesse sido aprovada há 13 anos, o corte no orçamento da saúde em 2015 seria de um terço.
— Com o orçamento do ano passado, que já foi executado, foi de R$ 100 bilhões o que a União aplicou em saúde. Se essa regra tivesse sido iniciada em 2003, esse orçamento seria de R$ 69 bilhões. Imagine como seria esse insuficiente que a gente tem hoje com um terço a menos.
O governo insiste que não faltará dinheiro para saúde e educação. Mas o presidente do CNS discorda.
— É uma falácia. Se você for pegar, a própria justificativa do envio da PEC, que o presidente e o ministro da Fazenda apontam, são os gastos com saúde e educação.
Outro lado
O professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) Alvaro Martim Guedes, especialista em administração pública, explica que “a proposta, do jeito que está apresentada para o Congresso Nacional, não impõe uma restrição de gastos para as áreas de saúde e educação”. Em podcast divulgado pela universidade, Guedes explica que a PEC 241 apenas aplica uma regra para limitar gastos públicos.
— Nada impede que os valores mínimos sejam maximizados, aumentados. A base desses valores mínimos tem que obedecer a variação da inflação no período anterior. O que fica restrito é o valor total máximo, que é a despesa que calcula o volume de receitas correntes. O que está se está tentando fazer é um disciplinamento fiscal de longo prazo, de 20 anos.
Resumidamente, diz o especialista em administração pública, “o efeito da PEC é no sentido de dizer que, pelo menos nas próximas gestões de presidentes da República, não vai haver um desequilíbrio fiscal”.
— O equilíbrio das receitas primárias significa justamente manter essas receitas primárias nas atividades sociais e não transferir esses recursos para bancos. Acho até estranho alguém ser contra essa proposta porque justamente resguarda interesses sociais.
A Câmara dos Deputados aprovou, por 366 votos a favor e 111 contrários, a proposta que limita os gastos da União pelos próximos 20 anos. Houve ainda duas abstenções.
A PEC 241 cria um teto para as despesas primárias do governo federal, que será reajustado pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), impondo limites individualizados para os poderes Executivo, Judiciário, Legislativo, Ministério Público da União e Conselho Nacional do Ministério Público e da Defensoria Pública da União.