Financiamento público de campanha é primeiro passo para a reforma política, defendem cientistas políticos
Especialistas cobram, porém, fiscalização rigorosa e sugerem licença a candidato à reeleição
Brasil|Carolina Martins, do R7, em Brasília
A mudança na forma de destinar dinheiro para os partidos políticos realizarem campanhas eleitorais é a primeira etapa de uma reforma política no Brasil. É essa a opinião de especialistas ouvidos pela reportagem do R7, que defendem o financiamento público de campanha.
Conforme as regras atuais, qualquer pessoa ou empresa pode dar dinheiro para partidos ou candidatos realizarem suas propagandas eleitorais. Bancos, empreiteiras e empresas de mineração estão entre as organizações que mais investem em políticos.
No entanto, o financiamento privado de campanhas nunca é desinteressado. Segundo o cientista político da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas de São Paulo) Francisco Fonseca, as empresas sempre “cobram a fatura” quando o candidato financiado é eleito.
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Na visão do especialista, é assim que começam, por exemplo, as fraudes em licitações públicas para favorecer a empresa que colocou dinheiro na campanha.
— O financiamento público torna-se essencial para desprivatizar [sic] a vida política brasileira. Esse é o ponto de partida. Sem financiamento público não acredito que a vida brasileira possa ser minimamente democrática.
Com o financiamento público, empresas e pessoas físicas ficam proibidas de fazer doações de campanha. Todo o dinheiro necessário sai dos cofres públicos. O governo fica encarregado de repassar a verba para os partidos por meio de contas bancárias.
No entanto, para evitar farra com dinheiro público, os especialistas lembram que será necessária uma fiscalização rigorosa da aplicação dos recursos.
O cientista político da UnB (Universidade de Brasília) David Fleischer ressalta que uma das medidas essenciais que devem ser adotadas junto com financiamento público é o reforço do quadro da Justiça Eleitoral.
— Se vai proibir contribuições de pessoas jurídicas e de pessoas físicas, a Justiça Eleitoral tem que ter muito mais recursos materiais e humanos para fiscalizar. Este é outro assunto muito importante, a fiscalização.
Segundo o professor da UnB, o modelo sugerido é que cada partido tenha uma conta bancária vinculada ao governo para que o dinheiro seja repassado, proporcionalmente, ao tamanho da legenda. Depois, o recurso seria redistribuído aos Estados e aos municípios.
O cientista político reforça que cada uma dessas contas teria de ser monitorada, para evitar desvios de dinheiro público.
Reeleição
Com o financiamento público, outro ponto que precisar ser discutido é a questão do político que se candidata à reeleição.
Segundo os especialistas, para evitar problemas de favorecimento dos candidatos que têm a máquina pública na mão, o ideal seria o licenciamento do cargo.
O cientista político da FGV sugere uma espécie de “quarentena” e reforço na fiscalização do repasse de dinheiro para o candidato à reeleição.
— Teria que alterar esse aspecto da reeleição, ou seja, ter mais mecanismos de fiscalização e de controle. E obrigar o licenciamento do político que está se candidatando à reeleição.
O especialista da UnB também sugere um afastamento de, pelo menos, seis meses do cargo, para evitar o conflito de interesses.
— Uma sugestão é que o candidato que vai para reeleição tenha que se desincompatibilizar e deixar o governo. Quem vai para reeleição tem que entregar o cargo ao vice seis meses antes da disputa.
Eleições 2014
O financiamento de campanha seria um dos pontos tratados no plebiscito, sugerido pela presidente Dilma Rousseff, para realizar a reforma política. O PT também já se manifestou a favor da mudança e trabalha para que a nova regra seja válida nas eleições de 2014.
O presidente do partido, Rui Falcão, declarou que acabar com as doações de campanha contribuiria para o fim da corrupção.
— Para nós, as mudanças que deveriam ocorrer devem ser já para 2014, pelo menos a questão do financiamento privado das campanhas eleitorais, que favorece o poder econômico e induz a corrupção. Pelo menos esse item nós entendemos que deveria valer já pra 2014.
O tema também esté entre os principais debates no grupo formado na Câmara dos Deputados para elaborar um projeto de reforma. O coordenador do colegiado, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), declarou que os temas que têm mais chances de irem a voto são a forma de financiamento das campanhas e o sistema eleitoral.
— Desta vez, vai haver, sim, reforma política. O sentimento que tenho com os deputados é que todas as pessoas querem uma mudança e eu atribuo esse sentimento aos protestos e manifestações da população.
Para que as novas regras passem a valer na próxima eleição, as alterações devem ser aprovadas pelo menos um ano antes do pleito. Ou seja, o Congresso precisa aprovar o fim das doações de campanha até, no máximo, o início de outubro deste ano.