Militar diz que Bolsonaro ficava 'assustado' quando alertado de que não poderia reverter eleições
Ex-comandante da Aeronáutica diz que orientou ex-presidente a reconhecer a derrota nas urnas para acalmar o país
Brasília|Augusto Fernandes, do R7, em Brasília
O ex-comandante da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Junior afirmou em depoimento à Polícia Federal que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) "ficava assustado" ao ouvir que não seria possível reverter o resultado das eleições presidenciais de 2022 e que o suposto plano golpista organizado por ele não serviria para mantê-lo no poder.
O militar disse que em uma das reuniões que teve com o ex-presidente após as eleições "deixou claro a Jair Bolsonaro que tais institutos não serviriam para manter o então presidente da República no poder após 1º de janeiro de 2023" e "que o ex-presidente ficava assustado".
Baptista Junior comentou que Bolsonaro sabia que não houve fraude nas eleições e que o ex-presidente foi alertado de "que todos os testes realizados não constataram qualquer irregularidade [nas urnas] e que era preciso reconhecer o resultado das eleições, com o objetivo de acalmar o país".
O ex-comandante da Aeronáutica declarou à PF que "deixou evidente a Jair Bolsonaro, que não haveria qualquer hipótese do então presidente permanecer no poder após o termino de seu mandato" e "que deixou claro ao então presidente que não aceitaria qualquer tentativa de ruptura institucional para mantê-lo no poder".
Ele afirmou "que a Aeronáutica não apoiaria qualquer tentativa de manutenção no poder do então Presidente da República no poder, após 1º de janeiro de 2023" e que "insistiu que não haveria qualquer justificativa para decretação dessas medidas".
Nesta sexta-feira (15), o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes retirou o sigilo dos depoimentos de militares e civis no inquérito que investiga uma suposta tentativa de golpe de Estado durante o governo de Jair Bolsonaro.
Ameaça de prisão
Em depoimento à Polícia Federal, o ex-comandante da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Junior afirmou que o ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes ameaçou prender o ex-presidente Jair Bolsonaro caso ele não desistisse de levar adiante um plano golpista para seguir no poder em 2022.
Durante o interrogatório, Baptista Junior disse "que em uma das reuniões dos comandantes das Forças com o então presidente da República, após o segundo turno das eleições, depois de o Presidente da República, Jair Bolsonaro, aventar a hipótese de atentar contra o regime democrático, por meio de algum instituto previsto na Constituição - GLO (Garantia da Lei e da Ordem) ou Estado de Defesa ou Estado de Sítio. O então comandante do Exército, general Freire Gomes, afirmou que caso tentasse tal ato teria que prender o Presidente da República".
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Freire Gomes também prestou depoimento à PF sobre o suposto plano de Bolsonaro e disse que "inclusive chegou a esclarecer ao então presidente da República Jair Bolsonaro que não haveria mais o que fazer em relação ao resultado das eleições e que qualquer atitude, conforme as propostas, poderia resultar na responsabilização penal do então Presidente da República".
O ex-comandante do Exército disse que era contra as ideias de Bolsonaro. Ele ressaltou que "deixou evidenciado ao então presidente da República Jair Bolsonaro e ao então ministro da Defesa Paulo Sérgio que o Exército não aceitaria qualquer ato de ruptura institucional".
O comandante disse que Baptista Junior também não apoiava uma tentativa de golpe. De acordo com Freire Gomes, o ex-comandante da Aeronáutica "da mesma maneira se colocou contrário a qualquer medida que pudesse gerar uma ruptura institucional".
O ex-comandante do Exército afirmou que, em reunião com os então comandantes das Forças Armadas, com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), foi apresentada uma minuta do golpe com o mesmo teor da encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Segundo o general, Torres estava incumbido de prestar suporte jurídico para as medidas descritas na minuta.
Freire Gomes teria ressaltado que deixou claro tanto para Bolsonaro quanto para o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que o Exército não aceitaria qualquer ato de ruptura institucional.
O então comandante do Exército disse em seu depoimento que o brigadeiro Baptista Júnior também se posicionou contrário a qualquer medida que pudesse resultar em ruptura institucional.
Baptista Júnior afirmou em depoimento que o ex-presidente Jair Bolsonaro apresentou uma minuta que "decretava a realização de novas eleições e a prisão de autoridades do judiciário".
Segundo ele, o documento foi apresentado em uma reunião no Palácio da Alvorada, no dia 7 de dezembro de 2022. O encontro contou com a presença de Freire Gomes, do ex-comandante da Marinha, almirante Garnier, e do ministro da Defesa, Paulo Sérgio. O documento , segundo o depoimento do ex-chefe do Exército, é o mesmo encontrado na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres.
Baptista Junior relatou que participou de uma reunião com os chefes das Forças Armadas, o então Advogado-Geral da União Bruno Bianco, o ex-ministro da Defesa e o ex-presidente. No encontro, Bianco teria informado que as eleições "transcorreram de forma legal, dentro dos aspectos jurídicos e que não haveria alternativa jurídica para contestar o resultado". A reunião teria acontecido em 1º de novembro de 2022.
Freire Gomes também disse que o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos teria apoiado Bolsonaro na tentativa de golpe após as eleições de 2022 e colocado a corporação à disposição dele para levar o plano adiante.
Segundo o ex-chefe do Exército, em uma reunião realizada no Palácio da Alvorada em 7 de dezembro de 2022, Bolsonaro apresentou aos então comandantes de Marinha, Exército e Aeronáutica um documento para decretar estado de sítio no Brasil e operação de Garantia da Lei e da Ordem.
Relatório sobre urnas
À PF, Baptista Junior disse que as Forças Armadas não detectaram fraudes ou falhas nas urnas eletrônicas. Ele afirmou que, com base nos resultados obtidos pela Comissão de Fiscalização da Defesa, está certo de que não houve qualquer irregularidade relacionada ao sistema de votação eletrônico.
O documento informava não haver irregularidades no processo eleitoral e que os boletins estavam em conformidade com os dados fornecidos pelo TSE.
Embora não tenha apontado sinais de fraude, o relatório das Forças Armadas alertava sobre a possibilidade de um eventual "código malicioso" representar um risco à segurança, algo que foi negado por Baptista Junior em seu depoimento.