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Jovem cumpre pena no lugar de criminoso que confessou participação e desapareceu

Danilo dos Anjos foi condenado a mais de seis anos por tentativa de latrocínio contra PM

Cidades|Ana Ignacio, do R7

Luana e Francisca dos Anjos recebem cartas de Danilo toda semana; crime ocorreu a poucos metros da casa da família
Luana e Francisca dos Anjos recebem cartas de Danilo toda semana; crime ocorreu a poucos metros da casa da família Luana e Francisca dos Anjos recebem cartas de Danilo toda semana; crime ocorreu a poucos metros da casa da família

“Sei que é doloroso tanto pra mim quanto pra você aceitarmos essa realidade... estou muito triste, as grades me fazem chorar, a saudade vem me visitar, está sendo muito difícil ter a mente sã, pois o clima por aqui é sempre tenso. Às vezes chego a pensar que estou enlouquecendo... Sinto medo, pessoas comuns nunca irão entender o que se passa na cabeça de um detento. Para o Estado sou apenas o 793505 e mais nada!”. 

Toda semana, Luana dos Anjos recebe cartas de seu irmão Danilo, de 30 anos. Condenado a 20 anos de prisão – reduzidos para seis anos e oito meses – o jovem cumpre pena na penitenciária de Osvaldo Cruz, distante 558 km de São Paulo. A cada 15 dias, Luana e sua mãe, Francisca, embarcam em um ônibus na capital paulista e encaram sete horas de viagem. O horário de visita, das 8h às 16h, é aproveitado integralmente. Essa tem sido parte da rotina das duas desde abril de 2013, quando Danilo foi condenado por tentativa de latrocínio. Desde então, a família briga para provar a inocência do jovem.

O dia 13 de janeiro de 2013 foi um domingo ensolarado. Luana conta que, no meio da tarde, a família estava reunida na sala de estar e assistia ao filme Dois Filhos de Francisco. Danilo estava no andar de cima, em seu quarto. Após alguns meses desempregado, no dia seguinte iria começar um trabalho novo, em uma loja de móveis, e estava animado. Naquela tarde, uma vizinha do bairro Vila Califórnia, zona leste de São Paulo, passou para dar uma notícia: havia ocorrido uma tentativa de assalto a poucos metros dali, em uma loja de botijão de gás. Um dos bandidos havia morrido no local e o outro, fugido.

Não demorou muito para que o movimento de viaturas, o som de sirenes e a presença do helicóptero no bairro fossem percebidos. A irmã conta que, após o rebuliço – que pôde ser observado da janela do quarto por Danilo – o rapaz desceu, comeu um pedaço de pizza e avisou que ia sair para buscar sua filha, então com cinco anos, na casa da mãe da garota, como de praxe.

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A pé e sem documentos, saiu de casa. No caminho, foi abordado por dois policiais militares. Desse momento em diante, a vida de Danilo e de sua família mudou, como lembra Luana.

— Os policiais disseram que as características dele batiam com a do ladrão que tinha fugido e pediram para que o Danilo os acompanhasse. Ele, na inocência, topou. Só que ao invés de levar o Danilo para a delegacia e apresentar para a autoridade policial, levaram ele para o PS da Vila Alpina.

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No local, a vítima da tentativa de assalto, um policial militar da Rota, mancava após torcer o pé na confusão. Ele e sua mulher chegaram de carro para comprar o botijão de gás e, após o anúncio do assalto, o policial deu voz de prisão, trocou tiros e acabou matando um dos suspeitos com oito disparos. No hospital para onde o PM foi levado, Danilo foi reconhecido pela vítima como o suspeito que havia fugido e acabou preso em flagrante. A família, inconformada, contesta essa conclusão.

— A única prova contra o Danilo é o reconhecimento. Reconhecimento este que foi feito de forma ilegal já que ele tinha que ter sido levado para uma autoridade policial e isso não ocorreu.

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No entanto, dois meses depois do crime, na primeira audiência do caso, uma grande novidade. Após uma denúncia anônima, um jovem se apresentou na delegacia e confessou ser o suspeito que havia conseguido fugir no dia 13 de janeiro. Luana se encheu de esperança e chegou a respirar aliviada.

— A juíza cancelou a audiência e designou outra para abril para ouvir o rapaz que estava assumindo a autoria do crime e de duas testemunhas que confirmavam a confissão dele. Eu estava certa de que meu irmão não seria condenado.

Porém, em abril, na segunda audiência, o suspeito não apareceu. Dias antes, um oficial de Justiça foi até o endereço do jovem para intimá-lo, mas ele havia ido viajar e voltaria apenas em maio, conforme informou o padrasto do rapaz. Dessa forma, com a confirmação da vítima de que Danilo era o culpado e sem a presença do suposto criminoso confesso, Danilo foi condenado. Luana, que é advogada, não consegue acreditar no ocorrido.

— Nos autos do processo consta apreensão de duas armas. Uma pertencia ao ladrão que morreu no local e outra era da vítima. O laudo residuográfico do Danilo consta negativo. Temos testemunhas dizendo que ele estava em casa na hora do crime que não foram ouvidas e, segundo a vítima, o bandido que tentou fugir saiu dirigindo o carro dele e acabou batendo e saiu a pé. Por que tiraram o carro do local do crime? Por que não deixaram sob custódia do Estado para comparar as digitais? Isso não foi feito. Baseado somente no reconhecimento do policial, o Danilo foi condenado a 20 anos reduzidos para seis anos e oito meses.

Procurado, o Tribunal de Justiça de São Paulo informou que o caso está em segredo de Justiça e declarou que "os processos são julgados com base nas provas produzidas nos autos. As partes têm o direito de recorrer, caso não concordem com a decisão".

Confira o especial que traça um raio x da impunidade no Brasil: Invisíveis

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