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Policial expulso no Ceará vê PM despreparada para conter manifestações em 2014

“Você trata a sociedade como inimiga”, revela soldado sobre os intramuros da corporação

Cidades|Thiago de Araújo, do R7


Ex-soldado da PM do Ceará teme pelo que pode acontecer em atos
Ex-soldado da PM do Ceará teme pelo que pode acontecer em atos

Expulso pela Polícia Militar do Ceará após publicar um livro no qual prega a desmilitarização no Brasil, o soldado Darlan Menezes Abrantes, de 39 anos, disse temer pelos resultados das muitas manifestações que se desenham para todo o ano de 2014. Segundo ele, a impressão causada por ações policiais desastrosas, que geram confrontos violentos, é culpa justamente do que ele chama de “falta de preparo” dos policiais para conter esses movimentos.

Apesar de não ter atuado na linha de frente da PM durante os protestos do ano passado, Abrantes explicou que tentou abordar o tema em seu livro, “Militarismo: um Sistema Arcaico de Segurança Pública”.

— Essas manifestações do ano passado eu não peguei porque estava em processo disciplinar, não podia trabalhar e só ficava dentro do quartel. De fato, ele [policial militar] não tem preparo para essas manifestações que aconteceram e que vão acontecer por conta da Copa. Tem um capítulo novo que coloquei no livro em que um comandante do Rio de Janeiro diz “não temos preparo para trabalhar nessas manifestações”. É algo novo para eles, porque o povo está no seu direito de reivindicar, se manifestar dentro da democracia, e eles não sabem como [agir], eles veem todo mundo como inimigo.

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Durante atuações controversas da PM, como na registrada em São Paulo no último dia 25 de janeiro, quando o estoquista Fabricio Chaves, de 22 anos, acabou baleado com dois tiros por policiais militares, não são poucos os policiais acusados de não estarem devidamente identificados, com o nome e patente em seus uniformes. A atitude — contrária aos regulamentos da própria PM — por vezes vem por orientação até de superiores, segundo Abrantes.


— O policial, mesmo se estiver com um colete particular, tem que colocar [a identificação], com nome. Sempre tem que estar identificado. Eles são até orientados, por causa da imprensa, de que é bom tirar o nome porque senão vai ficar fácil, né? Isso às vezes é orientação mesmo, depois dá desculpa, mas é balela mesmo. Eles mandar colocar o colete sem identificação por cima da gandola [espécie de manta militar], entendeu? Aí mandam desculpa. Qualquer coisa, se perguntarem, dizem que chegaram coletes novos e não deu tempo de colocar o nome, essa é a desculpa deles.

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Ciente das muitas críticas que policiais militares recebem, sobretudo antes, durante e depois das manifestações por todo o País, Darlan Abrantes tentou também defender colegas de farda, muitos deles também “vítimas” da corporação. Ele relembra que a pressão sobre os soldados, já durante o curso de treinamento, é bastante intensa e contínua, o que contribui para “enlouquecer” pessoas que poderiam ter atitudes diferentes no contato com a população.

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Ele ainda diz acreditar que “tratar a sociedade como inimiga” não é o melhor caminho, sobretudo durante as manifestações. E ele cita a situação de um ex-colega, que teria passado maus momentos durante o treinamento na academia.

— Teve um curso aqui no Ceará que um dos alunos não aguentou a pressão e ficou agarrado com a privada. A imprensa não ficou sabendo disso, mas nós lá dentro ficamos. O cara ficou agarrado com a privada, chorando, dizendo que não queria mais, com aquela pressão. O cara chega para você, durante 24 horas, e fica falando “seu m...”, se você não tiver personalidade boa, uma cabeça boa, você enlouquece. Em um curso desses que é para você pensar, se tornar policial, pensar mil vezes antes de dar um tiro em uma pessoa inocente... no militarismo não, a emoção fica nas alturas. É uma pressão enorme dentro do treinamento. Muitos policiais desistem, muitos como esse da privada. Um curso que era para treinamento mais psicológico, educacional, para agir e tratar bem a sociedade, não, você trata a sociedade como inimiga.

Tal quadro só reforça a impressão de Abrantes de que é preciso desmilitarizar a PM e criar uma nova polícia, mas sem simplesmente unir militares com civis — “que são como óleo e água”, de acordo com ele. É necessário, sim, na opinião dele, criar uma polícia nova, genuinamente brasileira, sem buscar modelos em outros países. Mais do que quebrar um modelo que data da Ditadura Militar, Abrantes acredita que é uma questão de segurança pública.

— É só olhar para as ruas, a polícia não consegue mais enfrentar o crime organizado, porque ele é de fato organizado e moderno. A polícia é desorganizada e atrasada (...). Primeiro passo é desmilitarizar. Depois une [com a Civil] e cria uma nova polícia. Aí você vai unir, encaminhar e cair como uma luva com a Polícia Civil e vai fazer uma reforma nesse segurança pública brasileira que não funciona. Ela faliu. Mas tem que ser uma polícia brasileira. Às vezes a gente quer buscar modelo nos Estados Unidos, na Europa, mas a gente tem que parar de ser ingênuo. Brasileiro parece que tem medo de criar, ele vai copiar algo lá de fora? Tem que criar uma polícia moderna, com cara de Brasil. Tem que mudar, do jeito que está não tem condição não.

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