Adolescentes indígenas lutam por seus direitos e revolucionam comunidades no interior da Guatemala
Jovens buscam promover direitos sexuais e reprodutivos e acesso à educação e à saúde
Internacional|Do R7*
Conhecida por ter uma grande riqueza cultural principalmente indígena, a Guatemala também é, por outro lado, palco de grandes desigualdades sociais e de violência. De acordo com dados do Instituto de Direitos Humanos do Arcebispado da Guatemala, mais da metade da população guatemalteca vive em condições de pobreza.
Além disso, o país tem uma das mais altas taxas de morte por armas de fogo no mundo: são cerca de 40 óbitos por 100 mil habitantes.
Dentro de um contexto como este, não é difícil prever que as crianças e os adolescentes sofram alguma forma de violência física, sexual ou psicológica. No caso das mulheres, a situação é ainda mais grave: além da falta de acesso à educação e à saúde, as jovens precisam lidar com uma realidade extremamente machista, que dificulta a conquista de diversos direitos e as torna quase invisíveis.
Nas regiões rurais e em povos indígenas, é comum a ideia de que as mulheres só podem trabalhar em casa e cuidar dos filhos. Sem conseguir completar os estudos e quase sem perspectiva de futuro, muitas jovens se tornam mães antes dos 18 anos.
EUA prometem R$ 568 milhões à América Central para reduzir migração ilegal
Malala, Nobel da Paz, é idolatrada no mundo e rejeitada em seu país
Em Concepción Chiquirichapa, porém, esta situação começa a mudar. Apoiadas pela organização Let Girls Lead, com sede na Califórnia, adolescentes guatemaltecas lutam por seus direitos como mulher e buscam transformar suas comunidades.
A região é uma das mais pobres da Guatemala e fica no interior do país. Na pequena localidade, menos de 10% das meninas de origem indígena termina os estudos e mais da metade delas se casa e tem filhos ainda na adolescência.
Segundo Veronica Buch, coordenadora da Let Girls Lead na Guatemala, “nosso trabalho se foca na promoção e proteção do direito das adolescentes, principalmente quanto aos direitos sexuais e reprodutivos”.
Ela conta que o projeto desenvolve um processo de formação das jovens guatemaltecas em várias áreas diferentes. As adolescentes têm educação sexual e contraceptiva, para poderem atrasar a maternidade, e recebem apoio para terminar os estudos.
— Muitas adolescentes não têm acesso à educação por uma cultura machista. Este é um desafio muito forte, ir rompendo com estas barreiras. Trabalhamos de acordo e respeitando a cultura das jovens, mas levamos em conta que há aspectos culturais que podem impedir o exercício do direito das adolescentes. Lutar contra o início precoce de uma vida sexual também tem sido um desafio.
Além disso, as jovens têm instrução jurídica e midiática, com o propósito de se tornarem líderes e poderem ser escutadas nos diferentes espaços onde são tomadas decisões — no nível comunitário, municipal, departamental e nacional. Elas lutam pela garantia de seus direitos sexuais e reprodutivos e pelo acesso à educação e à saúde.
Emelín, de 15 anos, é umas dessas líderes. De origem indígena maia, ela mora na aldeia de Duraznales, em Concepción Chiquirichapa, e participa do Let Girls Lead Guatemala desde os 14. As meninas do grupo conseguiram provocar uma série de mudanças no contexto em que vivem, principalmente quanto à orientação de políticas públicas específicas para as adolescentes.
As jovens fizeram suas reivindicações serem ouvidas pelo governo local e lutaram pelo funcionamento efetivo dos Institutos para a Infância e Adolescência. Estes órgãos são previstos por lei na Guatemala e precisam desenvolver projetos para esta faixa etária, mas muitas vezes são “escritórios fantasmas”: têm o nome e o espaço, mas não põem em vigor as ações necessárias.
Esta conquista foi contada no documentário Poder, lançado em março deste ano pela Let Girls Lead.
Agora, Emelín trabalha com a promoção dos direitos sexuais das jovens de sua comunidade, compartilhando o conhecimento sobre métodos anticoncepcionais e sexualidade. O objetivo é evitar o inicio precoce de uma vida sexual e permitir que as adolescentes concluam seus estudos.
“Me interesso muito por este trabalho porque podemos nos manifestar mais e fazer com que todas as pessoas das comunidades nos apoiem e nos respeitem. As adolescentes precisam de educação e proteção. Elas devem poder ter seus direitos respeitados e que saber que têm tanto direitos quanto responsabilidades”, diz Emelín.
Além de Concepción Chiquirichapa, a Let Girls Lead promove a liderança de jovens em várias partes da Guatemala. A organização trabalha a nível nacional e tem maior representação no ocidente do país e na capital.
As ideias do projeto, porém, não se restringem à Guatemala. A Let Girls Lead também apoia histórias parecidas em outros países da América Central e da África, como Honduras, Libéria e Maláui.
Denise Dunning, fundadora da Let Girls Lead, define que o foco do projeto é permitir que garotas façam mudanças em suas próprias vidas, famílias e comunidades:
— Meninas não são vítimas. Meninas são líderes e podem ser importantes causadoras de mudanças. Quando investimos em adolescentes, elas podem ir muito além do que poderíamos imaginar.
Criada em 2009, a organização estima já ter impactado na vida de cerca de 3 milhões de adolescentes em todo o mundo.
* por Maria Cortez, estagiária do R7