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"Maduro perdeu o apoio da população mais pobre", diz especialista, sobre crise na Venezuela

Após greve geral e preparação de protestos, presidente tem tentado polarizar cada vez mais

Internacional|Eugenio Goussinsky, do R7

Novos protestos deverão polarizar ainda mais a Venezuela
Novos protestos deverão polarizar ainda mais a Venezuela

Base da ascensão de Hugo Chávez (eleito presidente pela primeira vez em 1998) ao poder, a população pobre da Venezuela, grande maioria na nação, está desencantada. E sem ela, o atual presidente, Nicolás Maduro, envolto em uma das piores crises da história do país, tem visto sua imagem desmilinguir enquanto se agarra a todas as suas possibilidades de se manter no poder, diante do vendaval do desabastecimento e da inflação galopante. Que assolam, como diria Geraldo Vandré, as escolas, as ruas, campos, construções venezuelanas.

Essa opinião tem ganhado cada vez mais adeptos, como a professora de Relacões Internacionais da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado), em São Paulo, Marília Carolina de Souza. E, após a greve geral desta sexta-feira (28), a posição da Assembleia Nacional pedindo a saída do presidente e a pressão pela realização do referendo revogatório, com novos protestos sendo preparados, o impasse se torna cada vez mais difícil de ser solucionado, para ela. 

— Maduro vem criando mecanismos e artifícios que têm intensificado a polarização no país. Houve o percentual das assinaturas coletadas, para aprovar o referendo, mas o governo alegou irregularidades, apontando uma série de votos não validados, de mortos, menores, acusados.

Segundo a professora, são fraudes e mecanismos que não só não foram aceitos pela oposição, que busca também o argumento de abandono de cargo, como pela sociedade civil em geral, ressaltando que a rejeição ao presidente beirava os 70% da população, segundo pesquisa do Instituto Verebarómetro divulgada no fim de setembro.


— Maduro foi para o Oriente Médio discutir aumento do preço do petróleio. Tem adotado uma lógica de medidas emergenciais econômicas, anunciando por exemplo, de maneira populista, o aumento de 40% do salário mínimo. Tudo isso é para ganhar tempo e tentar artifícios para se manter no poder.

Entrentanto, neste momento em que Maduro estende o braço para tentar ser salvo do abismo pelos moradores das favelas, pelas camadas menos favorecidas, as mesmas que levantaram a voz para serem ouvidas ao elegerem Chávez, elas já não respondem. E Maduro já não ouve aquelas vozes de apoio. Elas se transformaram apenas em um eco surdo. Em uma analogia, o governo de Maduro, agora, respira por aparelhos, segundo Marília.


— O espaço de manobra do Maduro está muito reduzido, não em termos de meios para forjar um golpe (pode até tirar o poder da Assembleia Nacional) e se manter no poder. Isso ele ainda tem, mas perdeu recursos em termos de apoio dentro da própria população mais simples. As camadas mais baixas já estão vendo com muito mais ceticismo o fôlego do chavismo e do bolivarianismo.

Últimos recursos


Como um general cada vez mais acuado por tropas inimigas, ele se descabela, esbraveja, lembra-se de seus sonhos de glória que neste momento não passam de delírios antes da despedida, na visão da especialista.

E somente a extrema eficiência de seus últimos recursos, como o apoio das Forças Armadas, o poder sobre o Judiciário e os legisladores eleitorais e um golpe de sorte milagroso em uma economia depauperada (com desabastecimento, inflação de 700% ao ano e queda de 8% do PIB) podem evitar que ele deixe o poder. Marília explica tal tese:

— O Chávez era um paraquedista, veio das Forças Armadas. Quando sofreu a tentativa de golpe em 2002, orquestrada, com a mídia local influência do governo americano, foi salvo e resgatado pelas Forças Armadas e tradicionalmente deu privilégios para essa classe. Uma série de denúncias de corrupção sobretudo nas regiões de fronteira, com aumento do narcotráfico e contrabando muito forte, na divisa com a Colômbia, tem as Forças Armadas envolvidas. Tornaram-se classe privilegiada no governo chavista e portanto dão apoio ao governo atual.

Mas, por mais que Maduro busque reverter a situação, cada vez mais complicada, que tende a aumentar o nível de violência sem, no entanto, chegar a uma guerra civil, na opinião de Marília, ele vai vendo suas possibilidades diminuírem. A professora diz que nem os intelectuais, sobretudo da Universidad Central de Venezuela, o apoiam mais. Outro sustentáculo que o teria abandonado.

Parlamento da Venezuela tenta levar adiante julgamento político de Maduro

A especialista vai além. E acredita que, se os ventos continuarem desfavoráveis ao presidente, diante de uma Venezuela isolada inclusive no continente sul-americano (só com o apoio de Equador e Bolívia), até mesmo as Forças Armadas poderão rever sua posição. Pelo simples motivo que, neste tenso jogo de xadrez, pode ser o mais decisivo para Maduro, segundo ela.

— Os grupos são muito pragmáticos. Se percebem a onda indo para outra polarização, as Forças Armadas realmente podem sim mudar de lado, porque a relação forte que havia para elas era com o Hugo Chávez e não com o Maduro. Ele não tem a mesma tradição e relação forte que o antecessor tinha.

O xeque-mate para Maduro, portanto, pode vir porque, no tabuleiro, ele não é Hugo Chávez.

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