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Diante de crise hídrica, moradores de Itu recorrem à bica para armazenar água em casa

Desgastados e sem paciência, alguns chegam a se exaltar; rotatividade no local é grande

São Paulo|Ana Cláudia Barros, do R7*

Os moradores são obrigados a armazenar água por causa do racionamento
Os moradores são obrigados a armazenar água por causa do racionamento

A rotatividade de pessoas na bica da Vila Santa Terezinha dá uma ideia da proporção da crise hídrica enfrentada por Itu, no interior de São Paulo. O local, na zona oeste, atrai gente de diferentes bairros e classes sociais e a formação de filas são comuns.

Garrafas pet, galões, baldes, panelas e até caixas d’água são usados para garantir um pouco de água e tentar minimizar os transtornos provocados pelo racionamento.

Desgastados e sem paciência, alguns chegam a se exaltar. O eletricista José Décio, morador do Parque Industrial, na zona sul, teve que usar a diplomacia para evitar uma briga.

Para encher mais rápido a caixa d’água na caçamba da picape, ele ocupou duas torneiras ao mesmo tempo.


— Um rapaz ficou alterado e falou que eu estava com duas mangueiras. Aí, dei lugar para ele pegar. Ele tem o direito de pegar [...] Há uns dez dias está faltando água no meu bairro. Chega a água, mas ela não tem pressão para ir até à caixa.

Há praticamente cem dias com as torneiras secas, a aposentada Márcia Leite, 53 anos, moradora da rua Piauí, no Bairro Brasil, também recorre à bica. Márcia diz que muitos vizinhos e consultórios da rua estão comprando água de caminhão-pipa, mas como a necessidade é frequente, o custo se torna alto e ela não tem condições de arcar com a despesa.


— Tenho três galões de 20 litros de água potável para beber e mais uns 10 galões de cinco litros, que uso na bica. Vou lá buscar água. Faço isso três, quatro vezes por semana. Da minha casa até lá dá uns quatro quilômetros [...] Às vezes, vou à casa da minha sogra. Ela tem um reservatório grande e é sozinha. Pego os galões, levo as louças e lavo por lá. No dia em que eu e os meus filhos vamos, tomamos banho na casa dela. Dia de lavar a cabeça tenho que ir lá.

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Morador da Vila Guitti, na região sul, o comerciante Roberto Costa Freitas, 39, vai à bica de três a quatro vezes por dia para encher a caixa d’água da casa onde mora com outros três familiares.

— Tive que comprar outra caixa d’água para colocar no chão. Gastei R$ 180, mais R$ 220 na bomba. Quer dizer, foi um investimento de R$ 400, sem contar o transtorno. O mais caro é o transtorno. Hoje (terça-feira), estou deixando de trabalhar à tarde para pegar água, porque não tinha uma gota na minha torneira. É um absurdo.

Ele relata que a situação no bairro dele está crítica.

— No meu bairro está complicado, porque é alto. Dificilmente chega água com força para subir na caixa. Faz uns 30 dias que não sobe água na caixa. Vem água de madrugada. Dura [o fornecimento] 40, 50 minutos, no máximo. Até 15 dias atrás, a água estava chegando dia sim, e dia não. Agora, está demorando de quatro a cinco dias. Sem contar que a gente não dorme, esperando a água chegar. Fica até quatro, cinco horas da manhã acordado, aguardando para ver se vem uma gota d’água. Vai trabalhar no dia seguinte cansado, sem dormir. E é essa a rotina que a gente está vivendo no meu bairro.

Revoltado, ele desabafa:

— Fico com raiva. O povo está sendo feito de idiota. Não é justo com a gente. É um problema de muitos anos. É inacreditável como os políticos não resolvem nosso problema.O povo ituano gostaria de entender porque fazem isso com a gente.

O mesmo tom de indignação também é observado no discurso do contador Marcos de Oliveira, contador, 42, morador da Vila Lucinda, também na zona sul.

— Faz quatro dias que estou sem água na minha casa. Então, a gente tem que vir buscar [na bica]. Tenho criança em casa, pessoa de idade. Parece que a prefeitura não toma providência em relação à falta de água na cidade, não tem responsabilidade com o munícipe.

Ele acrescenta que, algumas vezes, quando chega água encanada, o líquido vem barrento.

— Não dá nem para lavar a roupa.

Vontade de ir embora

Há 30 anos, a cabelereira Maria Leite Rosendo, 49, vive em Itu. Moradora do Jardim Aeroporto, na região sul, ela fala, em tom de desânimo, que sente vontade de deixar a cidade toda vez em que abre a torneira e não encontra água.

— Dá revolta. Dá vontade de ir embora de Itu. Faz 30 anos que moro aqui. Todo ano é a mesma coisa. É problema antigo.

Enquanto enchia panelas e galões na bica Santa Terezinha, Maria contava que fazia uma semana que não tinha água encanada e que chegou a ficar nesta situação por um mês.

— Na minha casa não vem água mesmo. Vem nos vizinhos, mas na torneira de fora. Para eu pegar algum balde de água, tenho que usar a mangueira para encher algum tambor. Tenho dois gêmeos dentro de casa. No meu salão, meu marido precisa subir [até à caixa d’água], levar água para cima, porque eu tenho que trabalhar.

A prefeitura de Itu informou que segundo a agência reguladora AR-Itu, a água dessa bica é de origem subterrânea, de um poço profundo com processo de cloração para garantir sua desinfecção.Afirmou que ela é própria para consumo humano.

*Colaborou Gilmar Júnior

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