Embate em torno de R$ 230 milhões trava criação de parque público na Chácara do Jockey
Valores de avaliação distintos para área de 151 mil m² paralisam apelo popular
São Paulo|Thiago de Araújo, do R7

A luta por mais áreas verdes em São Paulo ganha cada vez mais adeptos ano após ano. Depois de ativistas e moradores buscarem a criação do parque Augusta, na região central da capital, paulistanos que vivem nas zonas oeste e sul pedem a criação de um parque onde hoje está situada a Chácara do Jockey Club de São Paulo. Mesmo com negociações e discursos de todas as partes a favor do parque, há um “pequeno” entrave: R$ 230 milhões.
A reportagem do R7 procurou moradores, vereadores e a direção do Jockey Club para falar sobre o assunto. Segundo se apurou, a direção do Jockey, encabeçada pelo presidente Eduardo Rocha Azevedo, avaliou a área de 151 mil metros quadrados em R$ 300 millhões, enquanto a Prefeitura de São Paulo fez a sua avaliação entre R$ 40 milhões, de acordo com fontes do Jockey, e em R$ 70 milhões, conforme informou um parlamentar. O valor é muito abaixo até mesmo da dívida de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) do Jockey, estimada em R$ 150 milhões pela atual gestão.
Para se ter uma ideia do tamanho da área em discussão, ela corresponde aos parques da Aclimação e Buenos Aires juntos e a um terço do Ibirapuera. A área serviria justamente como uma nova opção para os próprios frequentadores do Ibirapuera. Além de eventos, a Chácara do Jockey abriga apenas as atividades do Clube Pequeninos do Jockey, que é voltado à formação de jogadores de futebol e funciona no local há 43 anos. De acordo com Carlos Antônio de Almeida, diretor de esportes do clube, o impasse para a criação do parque repousa justamente nessa discordância de valores.
— O imbróglio está aí. Existe a dívida do Jockey com o IPTU, que até hoje ninguém passou o valor real, mas que está mais ou menos em R$ 150 milhões. Para dar em troca, faz se o levantamento da área, só que a prefeitura avaliou a Chácara em R$ 40 milhões. Aí é brincadeira, né? Só para você ter uma ideia, o metro quadrado nessa área, em frente ao Jockey, é R$ 3.000. Lógico que eles não estão pedindo isso, estão pedindo em torno de R$ 2.000. É aí que está o problema. Independente disso, eu me reuni com a população no intuito de criarmos um parque para o público, seguimos batalhando para isso.
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Em entrevista à rádio CBN, em setembro deste ano, o prefeito Fernando Haddad ressaltou que a área mais próxima de se tornar um novo parque público municipal, diante das negociações mais recentes, era justamente aquela que hoje abriga a Chácara do Jockey. A meta do governo municipal seria justamente uma troca simples da dívida com a cidade pela área completa.
— Nós estamos trabalhando, por exemplo, na questão do Jockey Club, com a sessão da Chácara do Jockey Club, na região do Butantã, para transformá-la em parque. Mas isso não vai envolver recursos [públicos] porque nós vamos receber aquilo como parte do pagamento do IPTU.
Moradores aumentam a pressão por parque
Quem vive na região do Butantã e nos bairros adjacentes da zona oeste e sul de São Paulo se movimenta há pelo menos cinco anos pela criação do parque na área da Chácara do Jockey. A discussão se iniciou ainda na gestão de Marta Suplicy (PT), quando a sugestão da construção de prédios do projeto Cingapura não avançou. Mais recentemente, durante o governo de Gilberto Kassab (PSD), o DUP (Decreto de Utilidade Pública) assinado pelo então prefeito previa o parque, mas o prazo expirou em abril deste ano.

Para o padre Darci, da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, no Butantã, um dos entusiastas do projeto do parque na área, há “boa vontade” por parte da prefeitura, da Câmara Municipal e da sociedade para que a ideia se torne realidade, mas ainda restaria vencer o impasse político da medida e a especulação imobiliária que valorizou a área nos últimos anos.
— São mais de 150 mil metros quadrados de área verde, onde vamos encontrar uma área verde desse tamanho em São Paulo? [A proposta do parque] está contemplada no Plano Diretor da Subprefeitura do Butantã, pode ser votada como parque público. Essa é a nossa esperança agora.
Além da coleta de mais de 2.000 assinaturas para a criação do parque, os moradores organizam para o próximo sábado (14) um piquenique, em favor do projeto. A meta era que acontecesse no domingo (15) – por isso o nome do evento ser “Domingo no Parque” –, mas não houve acordo com a direção da Chácara do Jockey. Segundo Alessandra Piacentini, idealizadora da mobilização, a região não comporta mais empreendimentos imobiliários, ainda mais com os problemas de mobilidade existentes. De acordo com ela, é preciso buscar alternativas por uma melhor qualidade de vida para quem vive na área.
— Fizemos um mapeamento que comprovou o quanto essa área é central para diversas regiões da cidade. Tem espaço para fazer uma biblioteca municipal, um espaço para terceira idade, tem prédios maravilhosos ali, não é questão de chegar e derrubar tudo. É manter o patrimônio e aproveitá-lo para outras questões.
Há em trâmite na Câmara um projeto de lei, de número 647/2013, de autoria do vereador Floriano Pesaro (PSDB), que pede que a Chácara do Jockey seja novamente declarada de utilidade pública, o que pode ser feito por Haddad em abril do próximo ano. Tal medida impediria qualquer intervenção na área por pelo menos mais dois anos, cabendo à prefeitura buscar previsão orçamentária para a criação do parque.
— A gente apresentou o projeto de lei que é autorizativo, que é para transformar a Chácara do Jockey em parque público através de decreto de desapropriação e a gente fez um requerimento ao prefeito para que nos fosse respondido se há intenção. Ao mesmo tempo, fizemos uma emenda para garantir recursos no orçamento do ano que vem para a desapropriação. Então a gente consegue fechar o círculo: emenda, projeto de desapropriação e autorização legislativa.
Pesaro completou:
— No caso do parque do Jockey nós colocamos em torno de R$ 70 milhões na emenda, no orçamento, que é um valor que a própria área de patrimônio da prefeitura havia nos passado. Seja como for, ali tem um patrimônio ambiental que não dá para estimar valor. Entregar aquilo para a cidade de São Paulo como parque público é algo imperativo, não tem nem o que pensar. É diferente do parque Augusta, que, embora eu o defenda, é em uma área menor. Lá não, é uma área gigantesca, é um terço do parque do Ibirapuera, não é brincadeira.
Jockey Club diz colaborar em favor do parque
Em viagem aos Estados Unidos, o presidente do Jockey Club Eduardo Rocha Azevedo não pôde conceder entrevista ao R7. Por intermédio da assessoria de imprensa, ele destacou que “a única conversa em curso em relação à Chácara do Jockey é com a Prefeitura de São Paulo”. Foi uma resposta às alegações de alguns moradores e de movimentos da região que veem grandes incorporadoras por trás do imbróglio, tentando supostamente inviabilizar o parque.
Pesaro revelou que pediu ajuda às construtoras que teriam interesse na região. Na visão do vereador, elas podem ganhar muito mais com o parque do que com a compra da área para novos empreendimentos imobiliários dentro daquela área.
— Cheguei a sugerir em um encontro com incorporadoras, que tinha interesse na área. Disse a eles que valeria muito mais a pena eles trabalharem para ajudar a prefeitura no sentido de transformar aquilo em parque e comprar o entorno, onde é permitida a verticalização, que eles vão ganhar um mar [de dinheiro] nos empreendimentos deles. É algo inteligente fazer isso, no entorno do parque, com vista pra ele, do que verticalizar.
Muito próximo à direção do Jockey, Carlos Antônio de Almeida explica que não há prazo ou pressa para um desfecho acerca da criação do parque, pelo menos por parte dos atuais detentores da área. Entretanto, a demora não é vantajosa também para o Jockey, que pode ver a sua dívida aumentar enquanto não acontece uma decisão. A única vantagem com o imbróglio, segundo ele, é não ter ocorrido algum tipo de invasão do terreno nos últimos anos.
— O presidente do Jockey está disposto a criar o parque, a população quer o parque, o prefeito Haddad é a favor do parque, e a Câmara dos Vereadores também. Se pegarem aquela área, o investimento é mínimo, está tudo pronto. Então não é algo a ser desprezado (...). Sabe quem que vai usar [enquanto o acordo não sai]? Quem está usando a 43 anos, que é o Pequeninos do Jockey. A área só não foi invadida também porque eles a ocupam, senão já teria acontecido isso.















