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"Fui eleita como bode expiatório", diz ex-diretora da Anac acusada em processo de acidente da TAM

Mulher disse estar disposta a trazer “toda a verdade” durante o interrogatório dela

São Paulo|Ana Cláudia Barros, do R7

Acidente da TAM em 2007 deixou 199 mortos
Acidente da TAM em 2007 deixou 199 mortos EUGENIO GOULART/AE

A ex-diretora da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) Denise Abreu afirmou que foi usada como “bode expiatório” no caso do acidente com o Airbus A320, que matou 199 pessoas, no aeroporto de Congonhas, em 2007. Denise, que está entre os três réus do processo, disse que sentia profundamente pelo ocorrido e falou estar disposta a trazer “toda a verdade” durante o interrogatório dela, ainda sem data marcada.

Ao sair do segundo dia de instrução do caso, no início da noite desta quinta-feira (8), ela destacou que será a primeira oportunidade que ela terá de trazer a verdade à tona.

— Eu mais do que ninguém aguardo esse depoimento. Eu também sou vítima. Fui eleita como bode expiatório do sistema político desse País, que escondeu todas as mazelas do sistema de aviação civil, que tinha sim, problemas e acabou elegendo um bode expiatório para que as CPIs não se encaminhassem para as investigações, como deveriam ter sido feitas.

Denise afirmou “confiar totalmente na imparcialidade do Poder Judiciário”, que, segundo acredita, comprovará a inocência dela. Enquanto falava, ela foi interpelada por parentes de vítimas. O empresário Roberto silva, que perdeu a filha na tragédia, disparou:


-Moça, faz seis anos que choro a saudade da minha filha.

Segurando um banner com a foto do filho, Maria Estela Outor Teixeira também se dirigiu à ex-diretora da Anac.


-Denise, olha meu filho. Nesta semana, peguei o atestado de óbito dele para fazer o inventário do pai dele, que vai fazer dois meses que morreu. [Meu filho foi] carbonizado, carbonizado, Denise. Como você deixou isso acontecer?

Denise Abreu se defendeu:


— Não fui eu e o Poder Judiciário trará a realidade. É impossível um diretor jurídico, que assina papel, ter qualquer responsabilidade direta e indireta em um acidente aéreo. De qualquer maneira, ninguém mais do que eu deseja a verdade dos fatos. Farei tudo que for necessário. A Anac não tinha essa competência legal e isso ficará comprovado nos autos. De qualquer maneira, mãe, eu sei quanto é a sua dor. Sou mãe também. Sou absolutamente solidária.

Neste momento, Maria Estela a interrompeu.

— Não sabe. Você não sabe, Denise.

Indagada pela imprensa sobre de quem seria a responsabilidade, ela se limitou a dizer:

— Não vou julgar. O Poder Judiciário está analisando, mas trarei todos os fatos e a verdade virá à tona em meu depoimento.

“Blindagem”

Denise Abreu destacou que “não competia à Anac liberação de pista” e sugeriu que a Infraero seria protegida.

-Desde 1950, o aeroporto de Congonhas funciona nesse País com administração aeroportuária realizada pela Infraero. O que eu me pergunto é por que tanta proteção para a Infraero? Não houve denúncia com relação a nenhum dos diretores ou presidência da Infraero, porque é um órgão do governo. A Anac não é um órgão do governo. É um órgão de Estado. É uma agência reguladora e, por isso, jogaram a culpa na Anac para blindar o governo.

Na avaliação dela, o depoimento da desembargadora da Justiça Federal Cecília Marcondes, que disse na quarta-feira (8) ter sido "enganada pela Anac" ao analisar um pedido de liberação da pista de Congonhas em fevereiro de 2007, contraria os depoimentos anteriores dados pela magistrada. Segundo Cecília, a Anac entregou à Justiça um estudo interno que previa a permissão dos pousos. O estudo não tinha validade, de acordo com desembargadora.

-Infelizmente, acho que ela [Cecília] ainda não conseguiu compreender que estava julgando um agravo de instrumento que tratava de três aviões: o Fokker 100 e os Boings 737-300 e 800. Em nenhum momento, o Airbus foi proibido pelo Poder Judiciário de pousar no aeroporto de Congonhas. Em nenhum momento, o Poder Judiciário pretendia fechar o aeroporto de Congonhas.

Ela contiunou:

— O que o Poder Judiciário fez, em primeira instância, e nós interpusemos – não nós, Denise Abreu, mas agência reguladora denominada Anac, que eu nem era presidente. A Anac interpôs o agravo de instrumento sobre as três aeronaves. E o Poder Judiciário, desde a primeira instância, sempre entendeu que o Airbus, seja o 319 ou o 320, tinha margem de segurança absoluta para pousar no aeroporto de Congonhas nas condições em que se encontrava.

Para a ex-diretora, alguns depoimentos foram feitos de “forma equivocada”.

—Nós entenderemos ao final dessa trágica e lastimável história, que alguns depoimentos foram feitos de forma equivocada, na pressão do contexto emocional, nas cobranças corretas feitas pela sociedade brasileira. Mas agora, passados seis anos, com toda frieza e imparcialidade do processo, tenho convicção de que o Poder Judiciário atuará dentro da mais absoluta legalidade.

Antes de ir, ela propôs que o interrogatório dela fosse aberto à imprensa e “veiculado em rede nacional”.

— Para que vocês mesmos, para que a população brasileira tomem conhecimento dos bastidores do ocorrido, da veracidade dos fatos e possam julgar através da minha postura, através das minhas convicções, através das minhas manifestações.

Denise Abreu é acusada de agir com imprudência, ao liberar a pista do aeroporto, a partir do dia 29 de junho de 2007, “sem a realização do serviço de grooving [ranhuras na pista que facilitam a frenagem das aeronaves] e sem fazer formalmente uma inspeção, a fim de atestar sua condição operacional em conformidade com os padrões de segurança aeronáutica”.

Foram essas imprudências que levaram, na análise do MPF, o avião a atravessar toda a pista do aeroporto sem conseguir parar, até bater em um prédio da TAM no lado de fora do terminal.

Seis anos

Passados seis anos do acidente, essas são as primeiras audiências do caso. As testemunhas de defesa serão ouvidas nos dias 11 de novembro (por videoconferência com a subseção Judiciária do Rio de Janeiro), 12 de novembro (também por videoconferência, com a Subseção Judiciária de Brasília e de Curitiba) e nos dias 3, 9 e 10 de dezembro, em São Paulo.

Além de Denise, serão julgados o vice-presidente de Operações da TAM, Alberto Fajerman e o diretor de Segurança de Voo da companhia, Marco Aurélio dos Santos de Miranda e Castro. Eles foram denunciados pelo procurador da República Rodrigo de Grandis e respondem pelo crime de “atentado contra a segurança de transporte aéreo”, na modalidade culposa.

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O procurador diz, no processo, que o diretor e o vice-presidente da TAM tinham conhecimento “das péssimas condições de atrito e frenagem da pista principal do aeroporto de Congonhas” e, mesmo assim, não tomaram providências para que, em condições de pista molhada, os pousos fossem redirecionados para outros aeroportos. Ambos também são acusados de não divulgar, a partir de janeiro de 2007, as mudanças de procedimento de operação com o reverso desativado (pinado) do Airbus-320.

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