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Projeto de mais de R$ 2 bilhões, Hidroanel desafia SP a mudar mentalidade até 2040

Transportar cargas e passageiros pelos rios Tietê e Pinheiros é mais viável do que se pensa

São Paulo|Thiago de Araújo, do R7

Hidroanel de São Paulo projeta muito mais do que a simples melhora da mobilidade urbana na capital
Hidroanel de São Paulo projeta muito mais do que a simples melhora da mobilidade urbana na capital

Congestionamentos, superlotação e aumento de custos. Não é segredo que São Paulo e os principais municípios da região metropolitana da capital estão em busca de alternativas para a mobilidade urbana. Entretanto, praticamente nenhuma delas leva em conta seriamente a participação dos rios Tietê e Pinheiros, algo que pode mudar com o Hidroanel. A empreitada soa fantasiosa, mas possui viabilidade para sair do papel.

Chamado oficialmente de Hidroanel Metropolitano de São Paulo, o projeto que foi desenvolvido pela equipe da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) da USP (Universidade de São Paulo), contratada pelo governo do Estado para estudar a viabilidade de tornar os rios que cortam não só a capital, mas 22 dos 39 municípios do Estado, navegáveis. O trabalho, iniciado oficialmente em 2009, já rendeu resultados. O custo estimado passa dos R$ 2 bilhões.

Segundo a proposta, uma rede de vias navegáveis formada pelos rios Pinheiros e Tietê e pelas represas Billings, Taiaçupeba e Guarapiranga integrarão uma rede de mais de 170 km de hidrovias urbanas. Com pelo menos três canais (um central de navegação e drenagem e outros dois, às margens, com túneis para o esgoto), o Hidroanel romperá com o conceito de “canais de esgoto a céu aberto, emparedados por rodovias”, definição dada pelo professor Alexandre Delijaicov, um dos coordenadores do projeto.

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Em entrevista ao R7, Delijaicov defendeu a viabilidade do projeto, mas explicou que mais do que dinheiro, é preciso repensar a forma de buscar soluções para a metrópole e que a ideia de tornar o Hidroanel uma realidade é uma decisão muito mais política do que técnica. Delijaicov é um dos coordenadores do projeto ao lado dos também professores Antonio Carlos Barossi e Milton Braga, do arquiteto da Prefeitura de São Paulo, André Takiya, e conta com o apoio direto de Casemiro Tércio dos Reis Lima Carvalho, diretor do Departamento Hidroviário do governo de São Paulo.


— Estamos falando de um projeto acabado, não é retórica. As cidades brasileiras são hoje acampamentos improvisados e perversos, que massacram a população, mas também são obras de arte abertas, de arquitetura coletiva. Já existe uma eclusa, outra será feita e os valores (para o Hidroanel) são insignificantes em comparação com qualquer investimento público, como a Copa de 2014. Os benefícios diretos são palpáveis, mas não é algo rápido, já que envolve uma mudança de mentalidade.

A proposta ganhou um pequeno impulso há duas semanas, quando o governador Geraldo Alckmin anunciou a construção de uma eclusa na região da Penha, na zona leste da capital. Será a segunda dentro da cidade, que já conta com uma na área do Cebolão, na zona norte, na foz do Rio Pinheiros.


— Vamos pagar a eclusa (da Penha) com a economia do dinheiro do desassoreamento no Parque Ecológico (do Tietê), do rio, a montante da barragem da Penha até Suzano, até Mogi. Só a economia de transporte - você tira caminhão e faz por hidrovia - vai pagar a obra.

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Contudo, ainda longe das 20 eclusas — cada uma a um custo estimado de R$ 100 milhões — previstas para os mais de 170 km do Hidroanel, com conclusão estimada para 2040.

Hidroanel é alternativa aos piscinões

A chegada do período das chuvas na Grande São Paulo, durante os meses do verão, sempre traz à tona o temor das já tradicionais enchentes em diversas regiões da capital e de alguns municípios metropolitanos. Um dos pontos favoráveis ao Hidroanel é justamente auxiliar no controle da vazão dos rios que cortam essas cidades, de acordo com o professor Alexandre Delijaicov. Seria uma alternativa crível aos polêmicos piscinões.

— Piscinões são buracos vazios, mas que não vão se espraiar. Já no Hidroanel o nível dos rios vai aumentar e diminuir dentro de uma operação, controlada por um maquinário, como uma torneira. Seria como funcionam as barragens na Holanda, abrindo e fechando (segundo o fluxo de água). Na nossa proposta, três barragens na zona leste formarão lagos perenes, propiciando a criação de parques fluviais urbanos. Com esses deltas artificiais, formados por canais de derivação de afluentes, um lugar como o Jardim Pantanal, que vive um drama a cada ano, seria o melhor lugar para morar.

O avanço do projeto do Hidroanel também daria mais consistência ao programa já existente de retirada de sedimentos dos rios Pinheiros e Tietê. Nas últimas décadas, a preocupação nessa área se dá mais intensamente na época de chuvas, entre os meses de dezembro e fevereiro, embora o governo estadual enfatize que a dragagem e limpeza dos dois rios são constantes nos últimos anos. Mas é necessário avançar.

— A FAU fez questão de conceituar essas cargas públicas. São elas que devem ou deveriam ser gerenciadas pelo poder público, caso contrário elas é que vão continuar a contribuir com a poluição de rios e canais. Não há mais natureza virgem em São Paulo, temos rios carregando muitos sedimentos e não é possível parar a retirada deles. Não tem conversa, os rios urbanos hoje são esgotos a céu aberto, então é preciso dragas fixas para os grandes afluentes e móveis para os menores. Com isso já poderíamos justificar o investimento no sistema hidroviário, começando com essas cargas públicas, e avançando.

A questão de dejetos é levada em conta no projeto com a criação de postos ao longo do Hidroanel chamados de Triportos, os quais atacariam o conceito atual de aterros urbanos, propiciando a separação do lixo e um melhor reaproveitamento daquilo que for reciclável. Mais do que isso: no processo a maior parte dos caminhões de lixo seria retirada das ruas. Outros pontos desenvolvidos pela equipe da FAU preveem a criação de piscinas públicas urbanas, reconstituição do verde às margens do rio da capital e a introdução da chamada agricultura urbana, com a criação de Ecoportos.

Nesse último aspecto, de cunho ambiental, Delijaicov acredita que seria um passo viável, mas que ainda depende de uma maturidade que os gestores e a população no País ainda não possuem. Contudo, ele vê avanços, e acredita que em algumas décadas, a ideia de ser possível encontrar os amigos e estudar às margens do rio Tietê, algo comum em cidades como Berlim, na Alemanha, vai ganhar força e sair do papel.

— Não estamos falando de algo rápido aqui. Acho que o projeto do Hidroanel abre várias frentes, mas estamos traçando metas e ideias para gestores que ainda não nasceram também. É uma miséria essa cultura de projetos que temos no Brasil hoje, com elevados metálicos e um isolamento sobre trilhos sendo vistos como solução para o transporte das pessoas na cidade. Ainda não sabemos enfrentar os problemas aqui, mas estamos avançando e é importante insistir, demonstrando a viabilidade de projetos que possam oferecer alternativas ao que está aí. Sair ou não do papel depende muito da cidade que queremos para o futuro.

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