Repressão policial em protestos mira Passe Livre e estudantes
Levantamento exclusivo mostra que, dos últimos 7 atos do MPL em 2015, 3 foram reprimidos
São Paulo|Do R7*
Bombas de gás, balas de borracha, cassetetes e escudos viraram artifícios comuns em quase todas as manifestações de rua que acontecem em São Paulo. Não raro, esses objetos vêm acompanhados de imagens de manifestantes feridos e um cenário de verdadeiro caos nas principais avenidas e estações de metrô da cidade.
Nesta quinta-feira (25), MPL (Movimento Passe Livre) faz novo protesto contra o aumento nas tarifas do transporte público em São Paulo, após uma série de atos reprimidos com violência em janeiro. E o problema enfrentado pelo grupo não é novidade. Desde 2013, a capital paulista tem sido palco de manifestações, convocadas por diferentes entidades, com públicos e vieses políticos diferentes. Impulsionados pela divulgação nas redes sociais, muitos desses atos atraíram milhares de pessoas, como aqueles que pediram o impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2015.
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O R7 fez um levantamento dos fatos que marcaram os principais protestos que aconteceram em São Paulo entre 2015 e 2016 (veja na tabela abaixo). De sete grandes manifestações pelo Passe Livre convocadas pelo MPL neste início de ano, pelo menos três foram violentamente reprimidas pela polícia. Um dos atos, marcado para o dia 12 de janeiro, nem sequer iniciou seu trajeto. Na ocasião, a PM formou cordões de isolamento e “envelopou” os manifestantes, atirando bombas e tiros de bala de borracha.
Nos outros quatro atos, foram registradas denúncias de agressões a manifestantes por parte de policiais e funcionários das estações de metrô.
Para o professor de sociologia brasileira da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), Paulo Silvino Ribeiro, com os dados contidos no levantamento, “fica evidente que as manifestações do MPL, por conseguirem reunir mais pessoas, são também as que sofrem mais repressões”.
Ribeiro acredita que a idade média dos manifestantes é um fator decisivo para a atuação violenta da PM, já que, para o especialista, “os jovens possuem um ímpeto mais transgressor e crítico”. No entanto, ele afirma que essa postura não necessariamente deveria ser vista como algo negativo, já que faz parte do perfil dessas pessoas.
Por outro lado, nas centrais sindicais que convocaram as manifestações em defesa da presidente Dilma Rousseff em 2015, “predominam pessoas mais velhas”. Nessas, não houve repressão policial.
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Assim como “na história de modo geral”, Ribeiro também acredita que o discurso da esquerda tem sido mais reprimido nas manifestações, por ser “o discurso mais crítico, que questiona a ordem e o Estado”.
Diálogo com o governo
Assessor do programa Justiça da Conectas, Henrique Hollunder afirma que a disposição de um maior efetivo policial em determinadas manifestações é uma escolha política da polícia. Para ele, mesmo com a lei de acesso de informação, a sociedade civil não tem mecanismos claros sobre a atuação da PM em protestos, e, portanto, “não tem nem como começar uma discussão sobre isso”.
Hollunder acredita ainda que manifestações como as que pedem passe livre no transporte público e se opõem à reorganização escolar têm “pautas mais claras”, e atraem “um debate direto entre governo e manifestantes”.
— Nesses casos, o governo aceita ou não dialogar, enquanto o movimento pelo impeachment é uma pauta mais em aberto, já que (os manifestantes) não estão pedindo algo para uma pessoa em específico.
Não vai ter Copa
A assessora de direitos humanos da Anistia Internacional, Renata Neder, acrescenta à lista de manifestações reprimidas com violência pela PM os atos contra a realização da Copa do Mundo do Brasil de 2014. Neder traça um paralelo entre essas manifestações e as do MPL deste ano. Em ambas, a polícia tem uma “postura hostil ou clara de impedir o protesto acontecer”.
A especialista rechaça também o argumento do despreparo da PM para lidar com grandes manifestações de rua, muito usado para justificar a brutalidade com a qual os policiais lidaram com os primeiros grandes protestos em 2013.
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— Três anos depois, vemos que a intenção clara da PM é reprimir os protestos usando a força. E não dá para aceitar a justificativa que alguns atos são pacíficos e outros não, porque temos evidências de depoimentos e vídeos para mostrar que, em diversos protestos que seguiam pacíficos, a polícia de São Paulo fez o primeiro movimento violento para dispersar a manifestação.
Neder ressalta, ainda, que o aparato ostensivo da polícia nas ruas ajuda a criar “uma animosidade” do lado dos manifestantes, aumentando as chances de haver violência no ato.
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— Quando você coloca um aparato de guerra, como os blindados, em uma manifestação, já é uma estratégia de medo que revela a clara intenção de dispersar e reprimir. A ação da polícia nunca deve ser no sentido de escalar a tensão.
Outro lado
A reportagem do Portal R7 solicitou entrevista com um representante da SSP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo). O órgão respondeu com uma nota, na qual afirma que "a PM acompanha protestos dos mais variados tons políticos, como no caso das manifestações do MTST ou da Força Sindical contra o aumento da tarifa do transporte público e do protesto pró-impeachment na Marginal Pinheiros". Segundo a SSP, nessas manifestações, "os organizadores comunicaram o local e o trajeto do ato à PM e não foram registrados incidentes".
Para a secretaria, "o MPL se diferencia dos outros organizadores de protestos". A pasta justifica dizendo que a entidade "afronta reiteradamente a exigência constitucional de comunicação prévia do local e horário da manifestação", e diz que o movimento "abriga em seus atos vândalos e criminosos conhecidos como black blocs".
*Por Luis Jourdain
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