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Empoderamento do paciente é fundamental para tratamento

Especialistas criticam medicina paternalista; consulta agora é consultoria

Saúde|Ana Luísa Vieira, do R7

Manter hábitos saudáveis no dia a dia coloca o paciente no controle do tratamento das doenças crônicas
Manter hábitos saudáveis no dia a dia coloca o paciente no controle do tratamento das doenças crônicas Manter hábitos saudáveis no dia a dia coloca o paciente no controle do tratamento das doenças crônicas (Celso Pupo Rodrigues/Getty Images/iStockphoto)

Além de ir ao médico e realizar exames frequentemente, manter hábitos saudáveis no dia a dia e tomar as rédeas do próprio tratamento é fundamental para pessoas com doenças crônicas como diabetes e hipertensão. Parece óbvio, mas durante muito tempo a recuperação dos pacientes era tida como responsabilidade exclusiva da medicina, conforme explica Roberto Zagury, endocrinologista e mestre em nutrologia pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

— Historicamente, a medicina se moldou de forma paternalista. Foi sempre uma relação de cima para baixo, desigual. E isso impediu, por muito anos, o empoderamento dos pacientes. Atualmente, nós olhamos para essa questão com mais cuidado. Cada vez mais, a consulta médica é encarada, como o próprio nome sugere, como um serviço de consultoria — em que ambas as partes colocam suas intenções, discutem, encontram um caminho adequado para aquela situação e trabalham juntas para que o paciente seja dono de seu tratamento.

Dados do Ministério da Saúde revelam que o número de pessoas diagnosticadas com diabetes na última década cresceu 61,8%. Os hipertensos, por sua vez, aumentaram 14,2%. A ideia de que hoje esses pacientes se consideram mais responsáveis pela própria saúde vem ao encontro de uma nova pesquisa divulgada pela Abbott — empresa de produtos farmacêuticos e cuidados com a saúde. Segundo o levantamento, 45% dos brasileiros com diabetes e hipertensão mudam os próprios costumes após o diagnóstico para ter uma maior qualidade de vida. A análise ouviu 960 pessoas [entre diabéticos e hipertensos] de capitais de todas as regiões brasileiras em junho de 2017.

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Responsabilidade compartilhada

De acordo com Marcus Malachias, presidente da SBD (Sociedade Brasileira de Cardiologia), o sucesso do tratamento deve ser uma responsabilidade compartilhada entre médico e paciente.

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— O autocuidado é a base da solução, até porque o universo da consulta é restrito. É um tempo pequeno para que o médico faça o diagnóstico, converse com o paciente, escute suas angústias, solicite exames, passe os medicamentos, recomende exercícios físicos, dieta e ainda faça a pessoa entender que ela é dona do próprio tratamento.

Mudança de postura

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De acordo com a pesquisa, uma das principais chaves para a mudança de vida, depois do diagnóstico, é a prática de atividades físicas. Entre as pessoas ouvidas, 55% começaram a se exercitar após serem diagnosticadas. Outros focos importantes de preocupação são a alimentação diária e o sono: 87% dos entrevistados dizem tentar realizar as principais refeições do dia; 86% acham importante beber até oito copos d'água diariamente e 77% afirmam dormir de seis a oito horas por noite.

A escritora Mariana Barros, de 32 anos, é um exemplo de quem repensou os próprios costumes ao receber o diagnóstico de diabetes tipo 1, aos 15 anos de idade. “Minha vida mudou drasticamente porque tive de me adaptar a uma nova rotina de alimentação. Parei de comer fast-food, passei a priorizar refeições feitas em casa e tenho sempre de fazer escolhas melhores. Toda vez que me oferecem um doce, por exemplo, pondero se vale a pena comprometer meus níveis de glicemia por causa dele”, conta.

Mariana aponta que o hábito de frequentar a academia de ginástica — adotado desde que ela recebeu o diagnóstico — é um dos fatores que a fazem se sentir no controle de seu próprio tratamento.

— Tento ir cinco vezes por semana. Os exercícios auxiliam muito na absorção da insulina. Se eu não me exercito, noto uma grande diferença nos níveis glicêmicos. Eu percebo que sou a grande responsável pela eficiência do tratamento — e acho que deve ser sempre assim com quem tem diabetes. O médico ajuda, mas o paciente tem que fazer acontecer.

Participação da família

Entre os dados preocupantes mostrados pela pesquisa, chama atenção o índice de pacientes que interromperam o tratamento ao menos última vez nos últimos cinco anos por indisciplina ou porque os sintomas desapareceram: mais de 40% daqueles que sofrem com diabetes ou hipertensão. Na opinião de Letícia Campos, nutricionista clínica e membro do departamento de nutrição da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes), o apoio da família é crucial para que os hábitos saudáveis não sejam abandonados no longo prazo. 

— Quando se fala em planejamento de saúde para um paciente, existe o bem estar físico, o bem estar emocional e o bem estar social. Então, se existe um processo de reeducação, o ideal é que a família toda se envolva nisso. Os pacientes com diabetes geralmente reclamam de não poder comer de tudo quando saem com os amigos ou vão a uma festa de aniversário. Agora, se além de todos esses desafios encontrados fora de casa, eles tiverem de enfrentar dificuldades dentro de casa também, a situação fica muito mais complicada.

A mãe de Mariana Barros, por exemplo, deixou de pedir pizza aos fins de semana depois que a filha foi diagnosticada com diabetes: “Logo que recebi o diagnóstico, ela também me ajudava a buscar informações, preparar refeições mais equilibradas e, inclusive, passou a trabalhar em uma farmácia especializada em diabéticos para ficar por dentro do meu universo”, relata a escritora.

Busca por informações

Troca de informações na rede gera empatia e serve como estímulo para seguir com hábitos saudáveis em dia
Troca de informações na rede gera empatia e serve como estímulo para seguir com hábitos saudáveis em dia Troca de informações na rede gera empatia e serve como estímulo para seguir com hábitos saudáveis em dia

O levantamento da Abbott mostrou que 40% dos diabéticos e hipertensos no Brasil acessam mecanismos de buscas na internet para saber mais sobre a própria doença, enquanto 28% procuram os dados em sites especializados.

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A vantagem é que, na rede, os pacientes acabam conhecendo outras pessoas que sofrem das mesmas condições — o que também serve como estímulo para seguir com os hábitos saudáveis em dia, conforme explica Mariana Barros. Há dois anos, a escritora criou um blog só para debater a diabetes. Hoje, a página já tem mais de 3.000 acessos diários. 

— Antes, nós não éramos incentivados pela nossa família ou pelos médicos a falar sobre o que sentíamos. Para quem é de fora, a diabetes é tratada como uma doença ‘fácil’, quando na verdade você vira refém dos índices de glicemia em tempo integral. Quando conhecemos, dentro e fora da rede, mais gente na mesma situação, o efeito imediato é a identificação. Percebemos que não estamos sozinhos. E isso, para mim, é parte essencial do tratamento.

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