"Não tinha forças para abrir uma garrafa de água sozinha", diz portadora de esclerose múltipla
Administradora de empresas conta drama após descobrir doença, mas deu volta por cima
Saúde|Vanessa Sulina, do R7
Foram vários dias de formigamento nas pernas e falta de sensibilidade na parte inferior do corpo — inclusive sem sentir vontade de fazer xixi — até a administradora de empresas, Karina Rodrigues, 30 anos de idade, desconfiar que havia realmente algo errado com sua saúde. Como “corria sempre para tudo”, como ela mesma diz, inicialmente, pensou que tais sintomas aliados ao forte cansaço eram apenas decorrentes do “estresse”. Durante três meses, foram várias idas e vindas aos especialistas até descobrir o diagnóstico: esclerose múltipla.
— Até fecharem realmente o que eu tinha, senti muitas coisas: queimação nos pés, muito cansaço, formigamento. Perdi a coordenação e a força do lado esquerdo do corpo. Teve uma vez que estava jantando e não tinha força para segurar o talher. Até descobrirem o que eu realmente tinha, foram vários os diagnósticos: de virose até tumor na medula. Fiquei muito mal! Nunca pensei que poderia ter a doença. E pensei: agora acabou tudo. Foi um choque.
Sem cura, a esclerose múltipla atinge, principalmente, adultos, entre 20 e 40 anos de idade, principalmente mulheres, e compromete o sistema nervoso central, conforme explica Liliana Russo, neurologista da Abem (Associação Brasileira de Esclerose Múltipla). No Brasil, a doença atinge cerca de 30 mil pessoas.
— A esclerose é uma inflamação do sistema nervoso em que há uma desmielinização das proteínas da bainha de mielina, capa de proteção do axônio, que é por onde passam os impulsos nervosos. Com isso, há uma redução na velocidade no estímulo nervoso e pode trazer prejuízos para qualquer parte do corpo humano, como perda de visão de um olho, desequilíbrio, perda de força nos membros, descontrole da urina, fadiga e dormência.
Cerca de 2,5 milhões de pessoas sofrem de esclerose múltipla
Apesar dos sintomas serem diferentes em cada portador, a especialista afirma que um dos sintomas mais comuns é a fadiga (atinge de 70% a 95% das pessoas com esclerose múltipla). De acordo com Karina, realmente o cansaço era tão grande a tal ponto de ficar “jogada em cima da cama” dias e dias, sem ter forças até mesmo para trabalhar.
— Depois do meu diagnóstico, tive um surto e fiquei três dias no hospital tomando medicação para amenizar os sintomas. Lembro que foi horrível. Sentia um cansaço absurdo a ponto de querer levantar para ir ao banheiro e não conseguir, pois não tinha forças. Precisava de ajuda para abrir uma garrafa de água. Às vezes, eu chorava porque queria levantar da cama e não conseguia. Fiquei três meses afastada do trabalho.
De acordo com Liliana, normalmente, o sintoma pode aparecer e sumir em 24 horas, ou seja, ele vai e voltar. Por isso, é difícil o diagnóstico da doença, já que é puramente clínico. Hoje, não há exame que confirme a doença. O que existe são testes que ajudam a afastar outras doenças.
— A pessoa sente os sintomas e depois volta a ficar totalmente assintomática. Acha que o que sentia era uma indisposição, mal-estar, e tudo isso passa despercebido. O surto e a remissão podem acontecer diversas vezes durante anos. Por isso, a pessoa pode demorar para descobrir o diagnóstico.
Qualidade de vida é possível
Embora ainda sem cura, é possível ter qualidade de vida com a medicação que minimiza a atividade inflamatória e suas consequências para o sistema nervoso. Liliana explica que o tratamento serve para "minimizar a quantidade e a gravidade dos surtos, além de reduzir as incapacitações".
— Caso não faça o tratamento correto, na fase inicial da doença, os problemas podem se tornar permanentes, até mesmo com perdas de funções nervosa, motora, sensitiva e visual.
Os cientistas ainda não sabem ao certo a origem da esclerose múltipla. Segundo a neurologista, muitos fatores devem estar envolvidos ao desenvolvimento da doença.
— A pessoa pode ter suscetibilidade genética, mas não significa que é transmitida de pai para filho. Há também fatores ambientais, como estresse, poluentes, mudanças no estilo de vida, ou seja, é multifatorial.
Volta por cima
Apesar de não saber a origem de seu problema, conhecer mais a esclerose múltipla foi essencial para aceitar o problema e poder levar a "vida numa boa".
— Fiquei muito mal quando soube da doença, minha autoestima ficou lá embaixo, cheguei a fazer um ano e meio de terapia e tomei remédio para lidar melhor com o problema. Vi que teria que viver com limitações, mas poderia viver tranquila. Resolvi encarar numa boa. Sempre contei muito com ajuda da minha família e meus amigos e hoje minha vida é completamente diferente. Voltei a trabalhar, mas faço tudo com calma. Tenho alimentação regrada e faço muito exercícios físicos. Antes, eu vivia correndo, saia de casa sem tomar café. Hoje, penso muito na minha saúde, se não, ela te para mesmo!