Vacina contra a dengue não será a solução imediata para conter a doença, avaliam especialistas
Vacina em análise na Anvisa conseguiu reduzir apenas 60,8% dos casos de dengue
Saúde|Fabiana Grillo, do R7
A dengue não tem tratamento e já matou 132 brasileiros no primeiro trimestre deste ano, segundo o Ministério da Saúde. No mesmo período de 2014, foram registradas 102 mortes. Como em todo o mundo não há nenhuma maneira de prevenir a doença, a luz no fim do túnel brilha quando uma vacina for capaz de proteger contra os quatro sorotipos do vírus que circulam pelo País. Embora uma vacina já exista e esteja aguardando aprovação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), especialistas ouvidos pelo R7 avaliam que essa não é a solução de curto prazo para combater a dengue.
Para a bióloga Denise Valle, pesquisadora do Laboratório de Biologia Molecular de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz, a vacina surge como uma medida complementar de controle.
— A cada ano, temos novas promessas contra a dengue, que não devem ser vendidas como a solução. Mesmo com a chegada da vacina, não podemos descuidar do Aedes aegypti porque ele também transmite o vírus da febre chikungunya.
Governo e população falham na prevenção da dengue e doença ainda pode se estender por meses
Cauteloso, o professor Marcos Boulos, da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) e coordenador do departamento de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, concorda que ainda é cedo para falar que a vacina vai resolver o problema da dengue.
— Sou otimista, mas temos que esperar. Ainda é muito precoce dizer qualquer coisa. Pode até ser que a vacina consiga conter o avanço da dengue, mas temos que aguardar alguns anos para saber no que vai dar essa pesquisa.
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Por enquanto, a Sanofi Pasteur é quem está mais avançada com os estudos. Após 20 anos de pesquisa, a vacina conseguiu reduzir 60,8% dos casos contra os quatro tipos de dengue, comemora Sheila Homsami, diretora médica do laboratório. Segundo ela, a meta da OMS (Organização Mundial de Saúde) é reduzir 50% a mortalidade por dengue e 25% a morbidade da doença até 2020.
— A vacina foi testada em bebês de nove meses até pessoas de 60 anos, mas mostrou diferença de eficácia em cada faixa etária. Ainda não sabemos para quais idades a Anvisa vai liberar, mas sabemos que quanto maior a idade, melhor a resposta da vacina.
No dia 30 de março, a Sanofi Pasteur submeteu a conclusão do estudo à análise da Anvisa e Sheila acredita que a aprovação aconteça até o final deste ano.
Na opinião do infectologista Celso Granato, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a solução da dengue vai ser a vacina, já que não há outra alternativa para conter esse mosquito que está extremamente bem adaptado ao meio ambiente. No entanto, o médico ressalta os pontos falhos que ainda precisam ser considerados.
— Em termos de proteção, os 60% que a vacina da Sanofi oferece é pouco. Além disso, serão três doses injetáveis, o que não é algo simples e prático, sem falar no custo.
O Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz também têm estudos para o desenvolvimento da vacina contra a dengue, mas ainda em fase muito inicial. Inclusive, o Butantan informou que enviou um pedido à Anvisa para antecipar a terceira fase dos testes clínicos, incluindo 17 mil pessoas. No cronograma atual, essa etapa está programada para ser iniciada somente no segundo semestre deste ano.
Segundo Granato, a vacina do Butantan mostrou eficácia de 80% em dose única até o momento. No entanto, ele pondera que os testes foram realizados em um grupo muito pequeno, de 300 pessoas.
— Por isso, ainda não podemos dizer que isso vai ser mantido com uma única dose e quais serão os efeitos colaterais. Caso o resultado se mantenha, a vacina do Butantan será mais ágil e mais barata do que a concorrente.
Enquanto não há imunização, o biólogo Paulo Roberto Urbinatti, pesquisador da Faculdade de Saúde Pública da USP, avisa que educar a população para eliminar o criadouro é o melhor caminho.
— O governo precisa investir em mais campanhas educativas para mostrar a necessidade de identificar e eliminar os criadouros da casa das pessoas. Essa sim seria a melhor solução para diminuir o número de casos de dengue no Brasil.
Os quatro tipos de dengue
O vírus da dengue possui quatro variações — DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4 —, mas, uma vez que a pessoa é infectada por um dos tipos, tem proteção permanente contra esse sorotipo específico e imunidade parcial e temporária contra os outros três, explica Denise.
— O vírus que está circulando atualmente em São Paulo é o tipo 1 que não circula há muito tempo no País. Dessa forma, aumenta a chance de a população ser infectada.
Como os primeiros sintomas da dengue são febre, dor de cabeça e mal-estar, muitas vezes ela pode ser confundida com gripe. A diferença, segundo Boulos, é que “a gripe ataca a parte respiratória, causando coriza e tosse, já a dengue causa fortes dores muscular e de cabeça”.
— O princípio das doenças pode ser parecido, mas, depois que a dengue se caracteriza, não há como confundir. O quadro começa a piorar quando as dores abdominais e os vômitos se tornam persistentes e começam a aparecer manchas na pele e até sangramentos. Aí sim a doença é grave.
Granato ressalta que crianças, pacientes de doenças crônicas e idosos estão mais vulneráveis à dengue. No entanto, a maioria dos infectados não vai ter a forma hemorrágica que é a mais grave, já que ela responde por 3% dos casos e é mais frequente em crianças pequenas.
— Se a pessoa tiver dengue uma vez, precisa ficar mais atenta na segunda, mas não é certeza que a doença virá na forma hemorrágica.
Como não existe tratamento específico contra o vírus da dengue — a doença dura de cinco a sete dias, mas a pessoa pode sentir mal-estar e dor no corpo por até três meses, os analgésicos, com exceção do ácido acetilsalicílico, entram em cena apenas para aliviar os sintomas, explica Teixeira. Dessa forma, o jeito é vistoriar com frequência cada canto da sua casa para exterminar de uma vez por todas esse temido mosquito, reforçam os especialistas.