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Depois de reforma, particulares cortam mais de 500 professores

Professores afirmam que mudanças devem causar precarização do trabalho

Brasil|Giuliana Saringer, do R7

Estudantes mostram insatisfação com mudanças
Estudantes mostram insatisfação com mudanças

Faculdades particulares de todo o país demitiram professores de suas redes de ensino e propuseram mudanças pedagógicas nos cursos universitários apenas no mês de dezembro. 

Segundo dados preliminares do Sinpro-SP (Sindicato dos Professores de São Paulo) e professores, as demissões devem ultrapassar 500 docentes.

A diretora do sindicato, Silvia Barbara, afirma que a instituição está avaliando as demissões no Estado. Para ela, as universidades estão se reorganizando para aumentar a margem de lucros.

— Estamos avaliando isso [as demissões] com muita preocupação. Desde o início a gente sustentava que as em massa estão acontecendo por uma reorganização das instituições, porque elas ganharam muito dinheiro com o financiamento do Fies em 2014, ano que mudaram as regras. Elas estão se organizando para manter a margem de lucro.


Silvia diz que há diversos fatores que contribuem para o cenário de demissões no país: mudanças e flexibilizações permitidas pelo MEC (Ministério da Educação) e pelo Conselho Nacional da Educação, a reforma trabalhista e a competição do mercado. Para ela, a reforma cria um ambiente que possibilita as demissões e a competição faz com que as instituições lutem sempre por mais alunos por menores custos, causando as reestruturações.

— Eles [MEC e Conselho Nacional de Educação] têm flexibilizado regras, autorizando redução de carga horaria dos cursos, por exemplo. São medidas que, falsamente, são tidas como pedagógicas, mas facilitam a flexibilização para eles [instituições de ensino] acumularem mais dinheiro. Quando as universidades pegam uma parte do curso e transformam uma disciplina flexível, isso reduz custos e a qualidade de ensino.


Em contrapartida, a vice-presidente da Anup (Associação Nacional das Universidades Particulares), Elizabeth Guedes, afirma que a movimentação nas universidades tem sido a mesma de momentos anteriores e que este ano tomou grandes proporções por causa de "acusações irresponsáveis" dos sindicatos de professores.

— Eu acho que isso tudo é uma tentativa dos sindicatos de manter a contribuição sindical, que não é mais obrigatória.


Para Elizabeth, o movimento é "artificial" e os desligamentos e mudanças de carga horária acontecem todos os anos. Os professores têm estabilidade e só podem ser demitidos nos períodos de férias, segundo as determinações legais. "A Anup está totalmente ao lado das escolas que estão fazendo os desligamentos. Elas estão fazendo isso dentro da lei."

Procurado pelo R7, o MEC afirma que “as instituições privadas de ensino têm autonomia sobre as relações de trabalho do seu próprio corpo docente”.

A pasta diz, no entanto, que as universidades precisam respeitar as normas do ministério: “As instituições devem manter os mesmos padrões definidos no momento da regulamentação. Por exemplo, no caso de universidades, a Lei 9394/2006 (LDB) define que elas devem ter pelo menos um terço do corpo docente composto de mestres e doutores”.

Os alunos que se sentirem prejudicados podem fazer denúncias pelo telefone 0800616161, do Fale Conosco (http://portal.mec.gov.br/secretaria-de-regulacao-e-supervisao-da-educacao-superior-seres/fale-conosco) ou enviar um ofício endereçado à Seres (Secretaria de Regulação e Supervisão da educação Superior).

Demissões sinalizadas

A socióloga e ex-professora da Metodista Luci Praun foi uma das profissionais demitidas em dezembro. Luci afirna que as demissões já estavam sendo sinalizadas, já que o corpo técnico-administrativo da instituição vinha sofrendo cortes.

— Se vê o desejo urgente desses setores [da educação] de se apropriarem da precarização no ensino superior a partir da reforma trabalhista.

Luci diz que, além da reforma trabalhista, sancionada pelo presidente Michel Temer (PMDB) em 11 de novembro deste ano, as demissões também estão atreladas a questões internas e à missão proposta pela atual gestão da universidade.

— Eles [reitoria] negaram o tempo todo. A gente sempre dizia que existiam listas de demissões. Os alunos começaram a ficar angustiados com a possibilidade de perder professores históricos dos cursos.

Segundo um professor da FMU/ FIAM-FAAM, que pediu para não ser identificado pela reportagem, o número de demissões na universidade respeitou a quantidade normal já vista em semestres anteriores. No entanto, as mudanças na grade vão impactar significativamente no salário dos profissionais.

FMU terá redução de carga horária
FMU terá redução de carga horária

Os cursos vão ter redução de 4 horas diárias para 3 horas. O docente afirma que a redução da carga causará diminuição de 25% em seu salário, já que recebe por hora/aula.

Na carteira de trabalho, por exemplo, professores são registrados com o valor que recebem por hora, não pelo valor que totalizam ao final do mês. Este docente conta que lecionava 28h por semana e, com a mudança, o número será de 21h.

Para ele, ao diminuir o número de aulas que os estudantes terão durante o semestre, o trabalho do professor é prejudicado. Ele terá uma hora a menos por dia para aplicar todo o conteúdo programático da disciplina.

O docente complementa que a instituição afirma que o trabalho, que era de 20 semanas, passará a ter 22 semanas, mas, ainda assim, haverá impacto no vencimento mensal.

— Eu vou entrar em uma disciplina que eu tinha 4 horas. Eu também vou ter 25% menos de tempo.

Segundo relato recebido pela reportagem de uma professora demitida da FIC (Faculdades Integradas do Ceará), houve 118 demissões nesta instituição em Fortaleza. Ela afirma que a maior parte deles estavam na empresa há pelo menos 10 anos, “quase todos mestres e doutores”.

— O que mais me entristeceu foi ver que já existe edital aberto para a contratação de novos professores, mas eles só podem ser graduados ou especialistas.

Diagnosticada com crises de pânico e ansiedade generalizada em agosto, ela atribui os problemas de saúde à pressão e estresse que era submetida constantemente no local de trabalho.

— O sentimento de exploração e descaso é enorme por todos nós. Muitos sofriam pressão com desvio de função para ter de captar novos alunos através de ligações, de panfletagem em dia de Enem e Enade. Eu mesma já fiz tudo isso que nunca teve nada a ver com minha função.

A FIC-CE não respondeu aos questionamentos do R7 até o fechamento da reportagem, solicitando o número de demitidos, o motivo das demissões e se as vagas serão preenchidas com novos profissionais. A FMU, FIAM/ FAAM também não.

Mudanças nas universidades

Veja a situação de cada uma das universidades procuradas pela reportagem do R7:

Universidade Presbiteriana Mackenzie

O Mackenzie não respondeu qual o número de professores desligados da empresa, o motivo e nem se as vagas serão reocupadas.

A universidade afirma que houve mudanças educacionais desde a implementação de um novo modelo em 2014, mas que continuam buscando pela “excelência na qualidade de ensino”. Leia a nota na íntegra:

“A Universidade Presbiteriana Mackenzie implementou em 2014, os novos Projetos Pedagógicos de Cursos de Graduação (PPCs) cujas matrizes curriculares foram atualizadas para vigorar a partir do primeiro semestre de 2018.

Essas mudanças pedagógicas foram introduzidas nos PPCs para atender às diretrizes do MEC (Ministério da Educação) e às demandas do mundo do trabalho, que se encontram em constante transformação.

As alterações refletem a busca contínua pela excelência na qualidade de ensino e a preservação das horas totais de integralização dos cursos, observando e respeitando cuidadosamente a legislação que orienta cada um deles.

O semestre letivo será ampliado de 17 para 19 semanas de aula, com até 5 aulas de 50 minutos, garantindo aos alunos a manutenção das cargas horárias totais de seus cursos, as quais permanecem inalteradas. Desta forma, os alunos terão maiores oportunidades para realizarem atividades de pesquisa e de extensão no próprio turno em que frequentam a Universidade”.

Estácio

Segundo o Sinpro-SP, a Estácio já demitiu 209 professores no fim deste ano. O grupo ainda complementa que as demissões não têm ligação com a reforma trabalhista, mas sim com uma “restruturação educacional”. Leia a nota na íntegra:

“O Grupo Estácio promoveu, ao fim do segundo semestre letivo de 2017, uma reorganização em sua base de docentes. O processo envolveu o desligamento de profissionais da área de ensino do grupo e o lançamento de um cadastro reserva de docentes para atender possíveis demandas nos próximos semestres, de acordo com as evoluções curriculares.

Esta reestruturação não tem nenhuma relação com as novas regras estipuladas pela chamada 'Reforma Trabalhista'. As novas contratações ocorrerão exatamente no mesmo regime de trabalho dos professores que estão sendo desligados. Portanto, a alegação de que a companhia supostamente estaria realizando desligamentos para se beneficiar das novas regras trabalhistas não procede. Não se trata de recontratação dos mesmos professores que estão sendo desligados.

A legislação brasileira determina que eventuais desligamentos de professores só ocorram em janela muito restrita, o que faz com que o volume de desligamentos fique concentrado em curto espaço de tempo. Prova disso é que não há desligamentos de docentes ao longo dos demais meses do semestre.

A reestruturação está levando em consideração a qualificação dos professores de acordo com exigências do órgão regulador. A Estácio manterá o mesmo rigor na contratação de seus docentes. A Estácio reafirma seu compromisso em manter a qualidade de ensino que conquistou com muito trabalho ao longo dos últimos anos.

A Estácio não divulgou números relacionados a essa reestruturação. A reorganização tem como objetivo manter a sustentabilidade da instituição e foi realizada dentro dos princípios do órgão regulatório”.

Faculdade Cásper Líbero

Procurada pelo R7, a faculdade afirma que, neste ano, houve demissão de 13 profissionais, sendo que, em 2016, o número foi de 18.

Em nota, a instituição afirma que os docentes foram demitidos com base nas “necessidades de atualização do corpo docente para o próximo ano, de acordo com avaliação realizada” e que já há um processo seletivo programado para janeiro para reposição das vagas.

Na faculdade, alguns dos professores demitidos fizeram posts em redes sociais sobre o assunto, como é o caso do ex-vice-diretor da instituição, Roberto Chiachiri.

Minha #Cásper. Foram quase 14 anos de dedicação numa casa em que fui muito feliz. A grande riqueza que ali conquistei...

Posted by Roberto Chiachiri on Thursday, December 14, 2017

Metodista

Professores e alunos protestaram contra demissões
Professores e alunos protestaram contra demissões

A Universidade Metodista afirma, em nota, que devido ao “ambiente econômico brasileiro”, as instituições de ensino precisam se adequar com “restrições orçamentárias”.

Os estudantes da pós-graduação da universidade produziram uma carta aberta, afirmando que houve mais de 60 demissões e que os cortes na pós "foram responsáveis pelo desmonte de um programa prestes a completar 40 anos de vida".

Leia a nota na íntegra:

“O ambiente econômico brasileiro, ainda desfavorável, tem imposto às Instituições de Ensino Superior (IES) algumas restrições orçamentárias, por isso adequações são necessárias e inadiáveis.

Neste sentido, em diálogo com as escolas que integram a Universidade Metodista de São Paulo, novos critérios de atribuição de aulas e atividades acadêmicas foram definidos para 2018, que resultaram na readequação do quadro docente e em revisões de carga horária. O Conselho Universitário da UMESP, órgão deliberativo superior, aprovou o orçamento de 2018 com essas alterações.

É importante enfatizar que todas as ações empreendidas visam ao fortalecimento institucional, à manutenção de uma estrutura acadêmica viva, ágil e focada em uma agenda que priorize não apenas o ensino qualificado, mas a relevância da pesquisa e da extensão. Nos programas da pós-graduação, todos os trabalhos em andamento terão continuidade.

Reafirmamos a busca de uma universidade mais dinâmica, com novos cursos e parcerias internacionais, abrindo novos e promissores caminhos aos quadros discente e docente, mantendo os valores da nossa confessionalidade cristã metodista.

Nosso norte para os próximos cinco anos, construído ao longo de 2017, será o PDI (Plano de Desenvolvimento Institucional), endossado pela intensa participação de alunos, professores e funcionários técnico-administrativos, que encaminharam mais de mil propostas, e cuja redação final será conhecida no início do ano letivo de 2018”.

ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing)

A ESPM afirmou à reportagem que o número de demissões foi condizente com os anos anteriores e que foram feitos porque a instituição tem priorizado docentes que podem se dedicar integralmente à ESPM. 

"A ESPM informa que, como ocorre normalmente ao final dos semestres letivos, neste semestre a rotatividade de professores ocorreu nas mesmas proporções. Destaca, ainda, que este é um fenômeno comum no segmento educacional.

Aproveita também para esclarecer que o desligamento de alguns docentes se dá em função do aumento do número de professores contratados em regime integral de trabalho, o que permite aumentar a qualidade no ensino oferecido aos seus estudantes.

A escola ressalta que não houve qualquer fechamento de curso e que a troca de professores na ESPM ficou dentro da média encontrada nos semestres anteriores".

Universidade Anhembi Morumbi

A Anhembi afirma que é comum as instituições promoverem mudanças no quadro de docentes "com contratações, promoções, realocações, substituições e desligamentos de professores, em função do ciclo natural do segmento". Leia a nota na íntegra: 

"A Universidade Anhembi Morumbi não informa o número de demissões, não só por política da instituição mas também por respeito aos profissionais. Aproveitamos a oportunidade para esclarecer que, no encerramento de cada semestre letivo, as instituições de ensino superior promovem alterações no quadro de docentes, com contratações, promoções, realocações, substituições e desligamentos de professores, em função do ciclo natural do segmento. Por convenção coletiva da categoria, essas movimentações só podem acontecer duas vezes ao ano, justamente no fim de cada semestre. Isso vale para todas as instituições de ensino superior, não só para a Universidade Anhembi Morumbi. Eventuais ajustes têm como base o processo semestral de avaliação de desempenho realizado pela universidade, que leva em consideração a opinião dos alunos, coordenadores de cursos, além de considerar também assiduidade, faltas, atrasos, bem como questões administrativas, entre outros, sempre em total obediência à legislação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes)".

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