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Pesquisadores preveem verão extremamente quente no Brasil, com calor intenso até abril de 2024

Estimativa é da Organização Meteorológica Mundial e considera a influência e os efeitos do fenômeno El Niño no clima do país

Brasil|Agência Brasil

Calor extemo pode se prolongar até abril de 2024
Calor extemo pode se prolongar até abril de 2024

A onda de calor dos últimos dias, que atinge as regiões Sudeste e Centro-Oeste do país com mais intensidade, não deve dar trégua para o brasileiro tão cedo. Pesquisadores da OMM (Organização Meteorológica Mundial) estimam que as temperaturas muito altas podem se prolongar pelo menos até abril de 2024, período durante o qual os efeitos do fenômeno El Niño vão continuar a ter maior influência sobre o clima do Brasil.

"Tudo indica que teremos um verão extremamente quente. É um El Niño de intensidade muito forte que, juntamente com o aquecimento global, produz esses efeitos que nós estamos vendo", diz Saulo Rodrigues Pereira Filho, coordenador da Rede Clima da UnB (Universidade de Brasília).

Como efeitos do fenômeno climático, ele também cita a seca no Amazonas e as chuvas intensas no Sul do país.

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Nesta semana, os termômetros do Rio de Janeiro superaram os 40°C em algumas ocasiões. Na capital do estado, por exemplo, a sensação térmica ficou acima de 58°C nesta terça-feira (14), de acordo com informações do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia). Cuiabá, no Centro-Oeste, foi a capital mais quente do país nesse dia.


Ricardo de Camargo, meteorologista do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP (Universidade de São Paulo), também diz que o calor intenso pode continuar, com pequenos intervalos de tempo mais ameno.

"Realmente podemos enfrentar situações parecidas como essa justamente por conta da influência do El Niño. É bem provável que a gente tenha as condições propícias para o acontecimento de novas ondas de calor. O que não dá para fazer é uma antecipação tão fidedigna e tão assertiva de quando isso pode acontecer", afirma.

O que é o El Niño?

O fenômeno climático é caracterizado pelo enfraquecimento dos ventos alísios, os que sopram de leste para oeste, e pelo aquecimento anormal das águas do oceano Pacífico, as localizadas na superfície da porção leste, na região equatorial.

Com essas mudanças, a interação entre a superfície oceânica e a baixa atmosfera também se modifica, e a dinâmica de circulação das massas de ar adota novos padrões de transporte de umidade, afetando a temperatura e a distribuição das chuvas, o que tem consequências no tempo e no clima de diversas partes do planeta.

O El Niño ocorre em intervalos de tempo que variam entre três e sete anos e persiste, em média, de seis a 15 meses. Saulo Rodrigues, da UnB, explica que, no Brasil, o fenômeno provoca seca nas regiões Norte e Nordeste, enquanto o Sul tem chuvas torrenciais e ciclones extratropicais.

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No Sudeste, a transição para o regime de chuvas, que é esperada para esta época do ano, está demorando mais que o normal, observa Ricardo de Camargo, da USP.

"Estamos tendo um período extremamente longo, em que não há atuação de nenhuma frente fria. Elas não estão conseguindo avançar em direção ao Sudeste e ao Centro-Oeste. Chove muito no Sul, e as frentes frias vão embora direto para o oceano."

O meteorologista explica como a movimentação no oceano Pacífico está ligada a essa situação. "A atmosfera sente a mudança do posicionamento das águas quentes que saem lá de perto da Ásia, da Austrália e da Oceania e vêm ocupar porções mais centrais ou até mais próximas da América do Sul. E aí existe um impacto. Uma das assinaturas é justamente essa dificuldade dos sistemas frontais conseguirem avançar mais em direção ao Sudeste e ao Centro-Oeste." 

Aquecimento global

Embora costumem ser abordados em contextos muito parecidos, aquecimento global e El Niño não são a mesma coisa. Além disso, só o El Niño não seria suficiente para explicar a atual situação climática do Brasil, avalia Rodrigues, da UnB.

Para ele, o fenômeno tem uma influência importante, mas a análise desses eventos extremos deve considerar, em primeiro lugar, o aquecimento global. O pesquisador alerta para o fato de que as projeções sobre ocorrências de fortes chuvas, calor extremo e secas severas deverão ficar mais frequentes e mais intensas. São episódios que podem desencadear desastres socioambientais e problemas de saúde.

"Já existe um conhecimento científico sólido sobre a capacidade que as mudanças climáticas possuem de produzir grandes perdas e danos para a sociedade e para as atividades produtivas. As populações vulneráveis se tornam muito potencialmente vítimas desse cenário", observa.

Distribuição de água no vale do Anhangabaú, em São Paulo
Distribuição de água no vale do Anhangabaú, em São Paulo

De acordo com Ricardo de Camargo, não dá mais para duvidar que as mudanças climáticas estejam em curso. "É inegável que as temperaturas estão cada vez mais altas em todos os lugares do planeta de uma maneira quase geral. Não há mais espaço para negacionismo com relação a isso."

O meteorologista e pesquisador da USP diz que, apenas por meio da análise do que é publicado pela imprensa, já é possível perceber que o mundo inteiro está enfrentando situações de episódios climáticos severos.

"As projeções indicam que os sistemas transientes [que nascem, se deslocam de uma região para outra e se dissipam] e os eventos extremos devem ficar mais frequentes, mais comuns, e vão atingir [as localidades] com maior severidade."

Camargo, entretanto, faz uma ponderação: "É difícil atribuir um percentual de responsabilidade da mudança climática nessa onda de calor que estamos vivenciando agora", avalia. Ele diz que é possível associá-la à mudança no regime de precipitação que é observada, "mas com algum cuidado".

Políticas públicas

Para Saulo Rodrigues, os principais responsáveis pelo aquecimento global são os países desenvolvidos, que emitem maior quantidade de gases de efeito estufa. O papel do Brasil nessa questão, ele diz, é desafiador.

"Nós temos uma matriz energética com grande percentual de energia renovável, 90% composta de energia renovável. Poucos países do mundo têm essa capacidade de produzir energia com baixas emissões de carbono, e o Brasil tem esse ativo. O Brasil também tem a floresta amazônica e o cerrado, que retiram carbono da atmosfera. Isso é muito importante para o equilíbrio climático, então o Brasil é parte da solução. O principal problema brasileiro é a questão do desmatamento", avalia.

O pesquisador da UnB cita a queda das taxas de desmatamento neste ano como um resultado positivo, mas alerta sobre a necessidade de o governo elaborar políticas públicas que visem aos efeitos de médio e longo prazo.

"Somos reconhecidamente um dos países mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas, porque [o Brasil] se localiza em uma faixa tropical onde as temperaturas normalmente já são mais elevadas. O aquecimento global tende a intensificar essas temperaturas", finaliza.

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