Um dia após recorde de mortes, Bolsonaro insiste em cloroquina
Em Uberlândia (MG), presidente investe contra quarentena, ataca imprensa de novo e afirma que país terá vacinas da Pfizer em abril
Brasil|Daniel Trevor, da Record TV
Um dia depois de o Brasil registrar o novo recorde diário de mortes decorrentes da covid-19, o presidente Jair Bolsonaro voltou a falar em tratamento precoce, hidroxicloroquina e criticar as medidas de isolamento social para arrefecer o contágio do novo coronavírus e atacar a imprensa.
Bolsonaro também antecipou que o país deverá receber "alguns milhões" de vacinas da Pfizer em abril.
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No Aeroporto de Uberlândia (MG), antes de se dirigir à inauguração do trecho da ferrovia Norte-Sul, que corta o Triângulo Mineiro, em São Simão (GO), o presidente discursou a apoiadores, em tom de desabafo.
"Eu tenho dito há muito tempo que os problemas a gente tem que enfrentar, não adianta ir para debaixo da cama. [...] Todos nós, inclusive eu aqui, temos defeitos. E nós estamos com problema enorme no Brasil. Um ano já, a questão do vírus. Mas temos um outro problema, que eu sempre falei, que precisa ser tratado com a mesma responsabilidade e de forma simultânea: o desemprego", afirmou, sob aplausos de seguidores.
"O desemprego leva à miséria, à depressão, a uma série de outros problemas, que mata muito mais do que o vírus. Eu não estou negando o vírus, muito pelo contrário, estou dizendo que temos que enfrentar os problemas", acrescentou. "Se todo mundo for ficar em casa, vai morrer todo mundo de fome."
Novamente, o presidente voltou a dizer que o STF (Supremo Tribunal Federal) o desautorizou na condução do combate à pandemia, delegando a prefeitos e governadores a função.
"Impuseram o estado de sítio no Brasil via prefeituras. Isso está errado."
Na verdade, o STF, em julgamento de três ações em 2020, entendeu que as gestões regionais têm a prerrogativa de planejar ações no âmbito da saúde pública em seus respectivos territórios, incluindo quarentenas, por exemplo. Mas isso não afastou o governo federal no planejamento de estratégias em âmbito nacional no combate à pandemia.
O presidente classificou, novamente, de pânico as notícias sobre a situação sanitária no país. "Estamos preocupados com mortes, sim. Mas sem pânico. A vida continua."
Pelo segundo dia seguido, nesta quarta-feira (3), o Brasil tem um recorde de mortes por covid-19. Os estados reportaram ao Ministério da Saúde 1.910 óbitos e 71.704 novos casos confirmados da doença, segundo balanço do Conass (Conselho Nacional dos Secretários de Saúde).
Os novos números levam o total de mortos nesta pandemia a 259.271. O número de casos acumulados passa dos 10,7 milhões.
Tratamento precoce
O presidente voltou a fazer campanha para o tratamento precoce no Brasil, com uso de hidroxicloroquina, remédio sem eficácia científica comprovada.
O uso do medicamento como medida de profilaxia para prevenir uma infecção de covid-19 foi "fortemente" desaconselhado por um grupo de especialistas internacionais do Grupo de Desenvolvimento de Diretrizes da OMS (Organização Mundial da Saúde), que também defendeu que outros medicamentos sejam pesquisados.
"O médico, ele é ensinado, é direito dele, não tendo o medicamento para aquela doença, ele buscar a alternativa. Ele não vai fazer do paciente uma cobaia, ele vai chegar no paciente e dizer: 'Olha, a situação está complicada, para não evoluir, temos observado que esse medicamento aqui que é para outra coisa tem dado certo. Posso aplicar no paciente?' É obrigação do médico, é um direito do médico. Eu não sou médico. Eu me tratei com hidroxicloroquina [...], então, por que negar?", disse.
"Quem fala sobre tratamento precoce no Brasil passou a ser criminoso no Brasil. [...] Por que querer criminalizar? Qual o efeito colateral da hidroxicloroquina? Diziam que era arritmia. Depois a Sociedade Europeia de Cardiologia disse que não causava arritimia e continuam negando no Brasil."
No fim de janeiro, a Procuradoria da República no Distrito Federal instaurou procedimento, que pode ser convertido em ação de improbidade administrativa, no uso de verba pública para a compra, em larga escala, do medicamento aos estados.
Spray de Israel
A aposta da vez de Bolsonaro é o spray nasal de Israel, uma proteína desenvolvida inicialmente para o tratamento de câncer, mas que acabou sendo testada em pacientes com covid-19 no país do Oriente Médio. O estudo é considerado preliminar e não comparou a droga a um placebo.
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Uma comitiva deverá ir no sábado (6) até Israel para tentar tentar um acordo com a fabricante. O objetivo é fazer com que a terceira fase de testes seja realizada com pacientes brasileiros.
"Depois de amanhã parte uma equipe chefiada pelo ministro Ernesto Araújo das Relações Exteriores para Israel. Já temos um protocolo de intenções. O que nós queremos: nós usarmos a terceira fase aqui de um spray aqui para casos graves. O cara está intubado, na iminência de ser intubado. Ele bota um spray no nariz... lá, 30 pessoas, deu certo em todas elas. Então é muito promissor isso: nós vamos buscar em qualquer lugar do mundo tratamento para o covid, como sempre fizemos."
Sobre vacinas, Bolsonaro disse que vai comprar todos os imunizantes disponíveis no mercado e atacou a imprensa. "Como eu sempre disse, quando a Anvisa aprovar, nós vamos comprar, não importando a sua origem."
"O Pazuello assinou ontem contrato com a Pfizer. E a Pfizer é clara, está lá no contrato: não nos responsabilizamos por qualquer efeito colateral. O pessoal fala, né? Falei que vai virar jacaré. Não tem mais figura de linguagem no Brasil, para esses idiotas da imprensa. Então já que o Congresso falou que pode comprar essa vacina, o Pazuello ontem assinou o contrato para comprar, o mês que vem, eu não sei a quantidade, vai chegar já alguns milhões aqui no brasil", afirmou. "Eu lamento que boa parte da imprensa seja canalha no Brasil."