Apesar de visibilidade na internet, casos de racismo que viram processos judiciais ainda são minoria no DF
Somente 24 casos foram parar na Justiça em 2014. Modelo do DF foi uma das vítimas recentes
Brasília|Fred Leão, do R7
As redes sociais trouxeram mais visibilidade para os casos de racismo, como o recente ataque sofrido pela atriz Taís Araújo no Facebook. Nesta sexta-feira (20) é comemorado o Dia da Consciência Negra, que alerta para questões de preconceito racial e, assim como em várias partes no mundo, as vítimas do Distrito Federal têm tornado públicas as agressões raciais sofridas. Mesmo assim, as ocorrências que se convertem em processo na Justiça do DF ainda são minoria, 7,9% do total de agressões registradas nas delegacias.
De acordo com dados levantados pelo TJDF (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios) a pedido do R7 DF, em 2014, somente 22 casos de injúria racial viraram processo na Justiça. Ainda em 2014, somente dois processos de crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor foram parar no tribunal.
Em 2015, de acordo com a Polícia Civil do DF, foram registrados nas delegacias 236 casos de injúria racial entre janeiro e outubro. No ano passado, foram 303 registros. As denúncias em delegacias não refletem a totalidade dos casos. Um estudo feito pela Sepir-DF (Secretaria Especial da Promoção da Igualdade Racial do Distrito Federal) , em 2014, revelou que apenas 33% das pessoas que presenciam ou sofrem racismo no DF denunciam.
Para Indira Quaresma, vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-DF (Ordem dos Advogados do Brasil no DF), é preciso um esforço conjunto para tentar vencer o racismo, o que passa pela educação em casa, nas escolas e também pelo Judiciário. A advogada ressalta que não se pode minimizar e deixar que este tipo de crime fique impune, já que a maioria dos casos acaba em absolvição dos acusados.
— O Judiciário tende a desqualificar as ofensas. Para isso é preciso melhorar a formação dos profissionais neste aspecto.
No ônibus, Facebook e até no trabalho, moradores do DF são vítimas de racismo
Uma das vítimas de ataques racistas no DF que resolveu se manifestar foi a modelo Nayce Samara. No fim de setembro, a jovem de 22 anos foi alvo de preconceito de duas mulheres que estavam no mesmo ônibus que ela, em Ceilândia (DF). Pelo Facebook, Nayce publicou um relato em vídeo sobre o caso, que alcançou mais de um milhão de visualizaçãos. No episódio, ela ouviu: “era até bonita, mas com aquele lenço de macumbeira para cobrir o cabelo ruim, ficava feia”.
O lenço ao qual elas se referiram era um turbante. No vídeo, ela respondeu ao que considerou um insulto a ela e a religiões tradicionais de origem africana. " Não é lenço de macumbeira, e se elas se referiram a alguma religião do tipo candomblé ou a umbanda, é uma pena que elas não conheçam as religiões porque elas são lindíssimas, os cultos são incríveis".
Ela não registrou queixa sobre o fato ocorrido no ônibus. Mas resolveu abrir um boletim de ocorrência, quando recebeu ofensas com o vídeo postado por ela na internet sobre o caso.
— Os oprimidos só se sentem seguros de falar sobre racismo, denunciar quando acontecer, quando tem representatividade. Precisam do exemplo de alguém que assim como a grande maioria (preto e pobre), que abriu a boca e gritou pro mundo que isso não está certo.
Boca no trombone
O comportamento de não se "aquietar" diante de um caso de racismo é um passo importante no combate ao racismo. Denúncias de ataques como os que foram sofridos pela atriz Taís Araújo - em sua página do Facebook - fazem parte de uma mudança de postura. E ela é necessária para que casos assim tenham o tratamento devido e não sejam minimizados, o que é comum dentro da cultura racista no Brasil, de acordo com a vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-DF.
— As vítimas não podem se calar e precisam reagir à altura. Quando nos manifestamos contra ataques como este, ajudamos a reforçar que a postura racista é criminosa.
A modelo Nayce conta que, devido à visibilidade de seu caso, recebe "centenas de mensagens de apoio, de desabafos".
— E isso mostra que as pessoas estão se sentindo a vontade pra rasgar o verbo e não aceitar mais calados essa opressão.