Cúpula da CPMI do 8 de Janeiro fala em 'reta final', mas falta de acordo pode pôr 800 pedidos em votação
Presidente da comissão quer apresentação do relatório em 17 de outubro, mas relatora não se compromete com data
Brasília|Bruna Lima, do R7, em Brasília
A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro caminha para um desfecho, ainda que os trabalhos tenham até o fim de novembro para ocorrerem. O presidente do colegiado, Arthur Maia (União Brasil-BA), já fala em "reta final" e sugeriu que o relatório fosse apresentado em 17 de outubro. Por outro lado, a relatora, Eliziane Gama (PSD-MG), não firmou compromisso com essa data, apesar de sinalizar que não pretende pedir prorrogação do prazo final dos trabalhos.
"Se a relatora puder ler o relatório dela no dia 17 de outubro, a gente faria a leitura e teria a outra sessão para o debate e votação do relatório", sugeriu Maia, dizendo que cabe a Eliziane, que é "a dona do parecer", acatar ou não a ideia.
•Compartilhe esta notícia no WhatsApp
•Compartilhe esta notícia no Telegram
Os parlamentares contam com mais 12 reuniões até lá e, na avaliação de Maia, devem ser dedicadas a finalizar os depoimentos. "A relatora está na fase final de trabalho. Ela tem, obviamente, prioridade para pedir a elaboração da pauta, porque ela está comandando essas investigações", sinalizou.
Para conseguir fechar o relatório, Eliziane ainda batalha para garantir a quebra de sigilo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. "Nós precisamos compatibilizar depoimentos com as quebras que nós estamos defendendo que ocorram. Dentre elas, a quebra de sigilo de relatórios do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] e também as quebras telemáticas."
Ela diz que há necessidade de entender as transações financeiras para avaliar se há relação com os atos extremistas. Os governistas afirmam que a própria Polícia Federal tem acesso ao sigilo do ex-presidente, mas a CPMI nem sequer conseguiu levantar o Relatório de Inteligência Financeira (RIF).
O presidente da comissão tem sido resistente a permitir a votação de quebra de sigilo mirando Bolsonaro e Michelle. Para ele, há desvio de foco justificar as quebras com o suposto esquema de corrupção na venda ilegal de joias. A oposição faz coro a esse argumento e batalha para garantir que as informações não cheguem à CPMI.
"A não ser que exista uma vinculação que possa demonstrar que havia algum tipo de ação dessa natureza, não vejo sentido para quebrar o sigilo apenas porque é ex-presidente da República", disse Maia. A afirmação foi vista como uma abertura do presidente para aceitar incluir o pedido na pauta de votação. Com isso, haveria um compromisso de acelerar o término dos trabalhos.
Tanto parlamentares da base governista quanto da oposição com quem a reportagem conversou mostram interesse em concluir os trabalhos. Para a ala ligada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o interesse consiste em apresentar um relatório "forte", garantindo indiciamento de Bolsonaro, e não propriamente prolongar a investigação pública. Por isso mesmo é que uma convocação do ex-presidente não é mais vista como estratégica pela base governista, já que daria espaço midiático a ele.
Entenda: Ala governista da CPMI se opõe à convocação de Jair Bolsonaro
A relatora avalia que há "fortes condições" de se chegar a um indiciamento de Bolsonaro, sobretudo a partir do depoimento dado pelo hacker Walter Delgatti Neto. Na oitiva, ele afirmou ter se encontrado com o então presidente, que teria solicitado a ele que fraudasse uma urna eletrônica. A defesa de Bolsonaro nega as acusações.
A oposição quer proteger os aliados de Bolsonaro e o próprio ex-presidente e, como é minoria no colegiado, enfrenta dificuldade em pautar requerimentos. "Não tem razão em falar em prorrogação de CPMI quando ela foge totalmente ao objetivo dela", disse o senador Marcos Rogério (PL-RO). Por isso, o caminho estudado é a apresentação de um relatório paralelo que consiste em tirar Bolsonaro do foco e concentrar a responsabilização das invasões aos prédios dos Três Poderes nas forças de segurança do DF e na omissão dos gestores federais do governo Lula.
Sem acordo
Apesar do movimento direcionando para o fim da CPMI, tem se tornado cada vez mais acirrada a disputa entre governistas e oposição sobre requerimentos a serem votados. Na última semana, a reunião para organizar a pauta terminou sem acordo e com ânimos exaltados. Os reflexos foram expostos durante a sessão de quinta-feira (24), com brigas protagonizadas entre parlamentares. O desgaste tem desagradado a Maia, dando mais um motivo para que ele articule o encerramento mais rápido dos trabalhos.
Por causa da falta de acordo, o presidente da CPMI ameaçou pôr em votação todos os requerimentos apresentados até agora, cerca de 800, de uma só vez. "Se não tiver acordo, não me resta outra alternativa a não ser colocar todos os requerimentos de votação, e o resultado sabemos qual vai ser", afirmou. Maia tem seguido um modelo de votação de requerimentos que funciona a partir de acordos construídos previamente.
Caso a mudança de estratégia ocorra, a oposição ficará em desvantagem, já que o governo tem a maioria de parlamentares na comissão. Neste caso, a expectativa é de um desgaste ainda maior entre as alas e discussões mais acaloradas.