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Lula completa um mês de governo com aceno ao passado e crises políticas

Presidente ameaça país de sofrer novo calote ao prometer recursos para o exterior e bate cabeça com equipe

Brasília|Do R7, em Brasília

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva

O terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) completa um mês nesta terça-feira (31), marcado por decisões que remontam à época em que o Brasil emprestou dinheiro a ditaduras da América Latina que até hoje devem ao país e por crises políticas.

Logo na primeira agenda internacional do chefe do Executivo federal, quando visitou a Argentina, há uma semana, Lula disse que fará um "esforço" para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) volte a financiar projetos de países vizinhos.

Ele pretende ampliar financiamentos do banco principalmente em países da América Latina, mas os parceiros atuais do BNDES somam R$ 5,1 bilhões em dívidas com a instituição. Os principais calotes são dos governos ditatoriais de Cuba (R$ 1,1 bilhão) e Venezuela (R$ 3,5 bilhões).

Uma das nações que devem ser privilegiadas pelo governo é a Argentina. O Brasil pretende emprestar dinheiro para a construção de um gasoduto na região de Vaca Muerta, na Patagônia, que tem a segunda maior reserva de gás de xisto do mundo e a quarta maior em óleo de xisto.


A expectativa da Argentina é conseguir financiamento no valor de 689 milhões de dólares. O investimento brasileiro, se concretizado, será aplicado em um gasoduto que utiliza técnicas de exploração consideradas nocivas ao meio ambiente por especialistas na área e contradiz a política ambiental e de transição energética.

A pretensão de Lula em financiar a obra ainda não tem aval do Ministério do Meio Ambiente. A ministra Marina Silva diz que a construção do gasoduto é um projeto que "envolve alto impacto ambiental" e que o possível financiamento do BNDES será analisado "à luz da questão de natureza técnica e processual".


Tropeços em acordos comerciais internacionais

O presidente brasileiro tentou atrapalhar as negociações do Uruguai com a China para firmar um tratado de livre-comércio com a nação asiática. Juntamente com Argentina e Paraguai, o Brasil passou a questionar o acordo e teme que o Uruguai possa ter resultados mais positivos por importar produtos fora da Tarifa Externa Comum, um pacote de taxas que é aplicado em produtos e serviços negociados por todos os países do Mercosul.

Apesar da investida de Lula, o presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, garantiu que "o Uruguai vai avançar nas suas negociações com a China". "O Brasil pode paralelamente fazer seu caminho e, após isso, nós vamos compartilhar tudo o que foi negociado, e o Uruguai pode se ajustar ao que o Brasil propuser."


Para Lula, contudo, o "Brasil não pode crescer sozinho, tem que crescer juntamente com todos os países da região". O presidente brasileiro também acredita que "é urgente avançar nas negociações com a União Europeia".

Sobre o tratado da União Europeia com o Mercosul, Lula também derrapou. Nesta segunda-feira (30), após reunião com o primeiro-ministro da Alemanha, Olaf Scholz, prometeu que o acordo será efetivado até o fim do primeiro semestre de 2023, mas o chanceler alemão freou o entusiasmo. "É realmente impressionante esse anúncio de chegar à conclusão de um acordo ambicioso em tão pouco tempo."

Atrito com militares

O primeiro mês do governo de Lula ainda teve episódios polêmicos que envolveram as Forças Armadas. Depois do ataque de extremistas a Brasília, em 8 de janeiro, o presidente afirmou estar convencido de que algum militar facilitou a ação dos vândalos. "Teve muita gente conivente, muita gente da PM conivente, muita gente das Forças Armadas conivente."

O episódio de vandalismo na capital federal gerou um mal-estar do presidente com o general Júlio César de Arruda, que comandava o Exército — ele acabou exonerado. Outro fator que contribuiu para a saída dele foi a resistência para impedir a promoção do tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Até o momento, Lula já dispensou 95 militares que atuavam na Presidência da República, entre eles vários servidores que trabalhavam no Palácio da Alvorada e na Granja do Torto.

Polêmica com golpe

Ao longo de janeiro, por diversas vezes o presidente tratou o impeachment de Dilma Rousseff (PT) como golpe e se referiu ao ex-presidente Michel Temer (MDB) como "golpista".

Em visita à Argentina nesta semana, o chefe do Executivo federal criticou o processo conduzido pelo Congresso Nacional. "Vocês sabem que depois de um momento auspicioso no Brasil, quando governamos de 2003 a 2016, houve um golpe de Estado. Derrubou-se a companheira Dilma Rousseff com um impeachment. A primeira mulher eleita presidenta da República do Brasil", disse Lula.

Ele repetiu o discurso durante compromisso no Uruguai. "Hoje o Brasil tem 33 milhões de pessoas que passam fome. Significa que quase tudo o que fizemos de benefício social no meu país, em 13 anos de governo, foi destruído em seis anos, ou em sete anos, nos três do golpista Michel Temer e quatro do governo Bolsonaro", afirmou o presidente.

As falas dele fizeram com que ao menos dois deputados apresentassem pedidos de impeachment. Além disso, a Advocacia-Geral da União (AGU), o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR) foram acionados para investigar as declarações de Lula.

Ministra do Turismo

O presidente enfrentou críticas pelas denúncias contra a ministra do Turismo, Daniela Carneiro, conhecida como Daniela do Waguinho (União Brasil), por ligação com Juracy Alves Prudêncio, o Jura, condenado por chefiar uma milícia na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro.

Além disso, Daniela usou dinheiro público para alugar um escritório no Rio de Janeiro por um valor aproximadamente três vezes maior do que a média cobrada nos imóveis da região. Em quatro anos, foram gastos por ela R$ 141 mil com aluguel em Belford Roxo (RJ). A despesa foi paga pela Câmara dos Deputados.

O R7 procurou a assessoria de Daniela Carneiro no Ministério do Turismo. Em resposta à reportagem, a ministra afirmou que ligação política não quer dizer concordar com eventuais atividades criminosas.

"A ministra do Turismo, Daniela Carneiro, durante sua campanha, em 2018, recebeu apoio em diversos municípios. Ela ressalta que o apoio político não significa que ela compactue com qualquer apoiador que porventura tenha cometido algum ato ilícito. Daniela Carneiro salienta que compete à Justiça julgar quem comete possíveis crimes. Quanto às nomeações na prefeitura de Belford Roxo, a ministra enfatiza que não tem nenhuma ingerência, pois o ato é de competência exclusiva do Poder Executivo", disse, em nota.

Sobre os imóveis, a assessoria disse que o endereço abriga seu escritório político no Rio e que "o valor cobrado pelo aluguel é compatível com o tamanho e a localização do imóvel".

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