Lula dá recado a Trump: ‘Não há veto a empresas, desde que cumpram legislação’
Petista enviou ao Congresso PL para combater concorrência desleal nas redes digitais e sancionou proteção a crianças na internet
Brasília|Ana Isabel Mansur, do R7, em Brasília

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta quarta-feira (17) que o Brasil não distingue empresas estrangeiras devido ao país de origem, mas exige que as firmas cumpram as leis nacionais.
A declaração foi um recado direto ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Em julho, a Representação Comercial dos EUA (USTR, na sigla em inglês) abriu uma investigação contra o Brasil (leia mais abaixo) por supostas práticas comerciais desleais. O Brasil respondeu à apuração em 18 de agosto.
“Espero que o presidente Trump esteja ouvindo ou assista a este ato. Ou quem for falar com ele fale com seriedade. Porque aqui estamos dando uma demonstração de que não há veto a nenhuma empresa, seja da origem, do país que ela for, que queira vir trabalhar no Brasil e produzir atendendo à legislação brasileira. Pode ser americana, chinesa, russa, argentina, boliviana, pode até ser de Garanhuns [cidade pernambucana em que o petista nasceu]. Tem o direito de vir para cá e produzir, desde que cumpra nossa legislação”, declarou o presidente, durante evento no Palácio do Planalto.
Lula sancionou nesta quarta o PL (projeto de lei) da Adultização, com regras para proteger crianças e adolescentes em ambientes digitais.
No mesmo ato, o petista enviou ao Congresso Nacional um PL para combater a concorrência desleal em ambientes digitais.
O presidente assinou, ainda, uma MP (medida provisória) para trazer o processamento de dados ao Brasil.
Combate à concorrência desleal
O projeto do governo institui a Superintendência de Mercados Digitais no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), ligado ao Ministério da Justiça.
O texto estabelece rito de enquadramento regulatório para plataformas com relevância. Entre os critérios, está o piso de faturamento de R$ 5 bilhões no Brasil e R$ 50 bilhões internacionalmente, a partir de decisão colegiada.
As obrigações proporcionais, quando cabíveis, serão aprovadas pelo Cade após processo administrativo que assegure o contraditório.
Em cada caso, poderão ser determinadas medidas como coibir autopreferência, dar transparência a ranqueamentos e taxas, permitir a portabilidade de dados mediante consentimento, avaliar a interoperabilidade quando necessária e segura, além de exigir a notificação de aquisições com potencial de reduzir a concorrência.
O descumprimento dessas determinações poderá gerar multas e outras medidas corretivas. A proposta também prevê a criação de uma estrutura técnica especializada no Cade para conduzir os casos.
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Segundo o governo, a medida é importante porque amplia as escolhas e possibilita melhores preços, já que regras claras reduzem práticas que elevam custos “por trás da tela” e favorecem o consumidor.
Além disso, contribui para criar um ambiente mais favorável a startups e negócios locais, ao diminuir barreiras impostas por grandes plataformas, como rebaixamento de resultados, taxas opacas ou cláusulas de exclusividade.
Processamento de dados
Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apenas 40% dos dados brasileiros são processados em território nacional.
“Todo o resto é encaminhado por cabo submarino a outras localidades do mundo para ser processados no exterior, onde nossa legislação não alcança. Queremos trazer esse processamento para o Brasil, primeiro para evitar remessas de dólares para o exterior, como está acontecendo. Estamos contratando serviços de fora que deveriam estar ocorrendo aqui. Queremos trazer data centers para o Brasil, para prover serviços baratos para o Brasil”, explicou o ministro.
Para Haddad, a medida pode atrair investimentos sustentáveis para o país.
“Esse tipo de investimento exige regras de sustentabilidade muito elevadas. Há uma série de requisitos que passaremos a exigir desse tipo de investimento, oferecendo regras jurídicas claras para o investidor”, acrescentou.
A iniciativa busca atrair investimentos, estimular o desenvolvimento de máquinas e equipamentos no país e ampliar a oferta de infraestrutura local, organizada em quatro eixos.
O primeiro deles trata da desoneração do investimento em tecnologia da informação e comunicação, com a redução a zero de impostos federais sobre servidores, armazenamento, rede, refrigeração e outros equipamentos de datacenter.
Essas medidas antecipam os efeitos da reforma tributária, que começariam a valer apenas em 2027.
O segundo eixo é o fortalecimento das cadeias de TICs (tecnologias da informação e comunicação), ao estimular o uso de componentes fabricados no Brasil, com isenção de imposto de importação para aqueles sem similar nacional.
O terceiro eixo estabelece a sustentabilidade como regra, ao exigir o uso de energia 100% renovável ou limpa, baixo consumo de água e carbono zero desde o início, com metas e comprovação.
O quarto eixo refere-se ao fomento à inovação e determina que empresas beneficiadas apliquem 2% de seus investimentos em projetos de pesquisa e desenvolvimento no país — em universidades, centros de pesquisa e startups.
A MP também prioriza o mercado nacional, garantindo que pelo menos 10% da nova capacidade seja destinada para uso no Brasil.
Investigação da USTR
A investigação foi aberta em 15 de julho, com base na Seção 301 do Ato de Comércio, de 1974.
Segundo a USTR, a medida visa apurar se atos, políticas e práticas do governo brasileiro são injustificáveis ou discriminatórios e impõem restrições ao comércio norte-americano.
A apuração norte-americana cita áreas como comércio digital, serviços de pagamento eletrônico, tarifas preferenciais, combate à corrupção, proteção de propriedade intelectual, acesso ao mercado de etanol e controle de desmatamento ilegal.
A investigação dos EUA questiona práticas brasileiras em seis frentes:
- Comércio digital e serviços de pagamento eletrônico: o governo norte-americano avalia se o Brasil está retaliando empresas de tecnologia dos EUA por não censurarem discursos políticos, além de restringir sua atuação no país;
- Tarifas preferenciais: os EUA alegam que o Brasil concede tarifas mais baixas a alguns parceiros comerciais competitivos globalmente, o que colocaria exportações americanas em desvantagem;
- Combate à corrupção: há preocupações com a suposta falta de aplicação de medidas anticorrupção e de transparência, o que violaria normas internacionais de combate a subornos;
- Propriedade intelectual: o Brasil é acusado de não oferecer proteção e aplicação eficazes dos direitos de propriedade intelectual, o que prejudicaria trabalhadores americanos de setores baseados em inovação e criatividade;
- Mercado de etanol: os EUA afirmam que o Brasil recuou de compromissos de oferecer tratamento praticamente livre de tarifas para o etanol norte-americano, aplicando agora tarifas substancialmente mais altas;
- Desmatamento ilegal: segundo o USTR, o Brasil estaria falhando na aplicação de leis contra o desmatamento ilegal, o que impactaria negativamente a competitividade de produtores americanos de madeira e produtos agrícolas.
Perguntas e Respostas
Qual foi a declaração de Lula sobre empresas estrangeiras?
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o Brasil não distingue empresas estrangeiras com base no país de origem, mas exige que todas cumpram as leis nacionais. Essa declaração foi um recado ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em resposta a uma investigação da Representação Comercial dos EUA sobre práticas comerciais desleais no Brasil.
O que Lula espera que Trump faça após sua declaração?
Lula expressou a esperança de que Trump ouça sua declaração ou que alguém fale com seriedade com ele, enfatizando que não há veto a nenhuma empresa que queira operar no Brasil, desde que cumpra a legislação brasileira.
Quais medidas Lula sancionou e enviou ao Congresso?
Lula sancionou um projeto de lei para proteger crianças e adolescentes em ambientes digitais e enviou ao Congresso um projeto de lei para combater a concorrência desleal em ambientes digitais. Além disso, assinou uma medida provisória para trazer o processamento de dados para o Brasil.
O que a proposta do governo estabelece em relação às plataformas digitais?
A proposta institui a Superintendência de Mercados Digitais no Cade, estabelecendo critérios regulatórios para plataformas relevantes, como um faturamento mínimo de R$ 5 bilhões no Brasil e R$ 50 bilhões internacionalmente. As obrigações serão aprovadas pelo Cade após um processo administrativo.
Quais são as consequências do descumprimento das determinações?
O descumprimento das determinações pode resultar em multas e outras medidas corretivas. A proposta também prevê a criação de uma estrutura técnica especializada no Cade para lidar com esses casos.
Qual é a importância das medidas propostas pelo governo?
Segundo o governo, as medidas visam ampliar as escolhas dos consumidores e possibilitar melhores preços, além de criar um ambiente mais favorável para startups e negócios locais, reduzindo barreiras impostas por grandes plataformas.
O que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse sobre o processamento de dados?
Fernando Haddad afirmou que apenas 40% dos dados brasileiros são processados no território nacional, e que a medida visa trazer esse processamento para o Brasil, evitando remessas de dólares para o exterior e atraindo investimentos sustentáveis.
Quais são os eixos da iniciativa para atrair investimentos?
A iniciativa é organizada em quatro eixos: desoneração do investimento em tecnologia, fortalecimento das cadeias de TICs, exigência de sustentabilidade e fomento à inovação, com a aplicação de 2% dos investimentos em projetos de pesquisa e desenvolvimento no Brasil.
O que a investigação da USTR visa apurar?
A investigação da USTR visa apurar se as práticas do governo brasileiro são injustificáveis ou discriminatórias e impõem restrições ao comércio norte-americano, abrangendo áreas como comércio digital, serviços de pagamento eletrônico e proteção de propriedade intelectual.
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