PGR vê confissão indireta de Bolsonaro sobre plano para permanecer no poder
Paulo Gonet afirma que, mesmo sem usar a palavra ‘golpe’, Bolsonaro admitiu ter discutido medidas de exceção
Brasília|Do R7, em Brasília

A PGR (Procuradoria-Geral da República) enviou ao STF (Supremo Tribunal Federal) suas alegações finais na ação penal em que acusa o ex-presidente Jair Bolsonaro de tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. No documento, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirma que, mesmo sem usar a palavra “golpe”, Bolsonaro admitiu ter discutido medidas de exceção para tentar se manter no poder, o que, para o órgão, revela a gravidade de sua conduta. O R7 tenta contato com a defesa do ex-presidente.
Durante o interrogatório no STF, em junho deste ano, Bolsonaro negou ter tratado de golpe. Na ocasião, o ex-presidente afirmou que “nunca se falou em golpe”, que “golpe é uma coisa abominável” e que “não foi sequer cogitada esta hipótese de golpe no meu governo”. Apesar da negativa, ele reconheceu ter debatido com seus subordinados alternativas como estado de sítio, estado de defesa e a GLO (Garantia da Lei e da Ordem), sob o argumento de que havia “esgotamento dos meios judiciais” para questionar o resultado eleitoral que deu vitória a Luiz Inácio Lula da Silva.
Para a PGR, a confissão de que medidas de exceção foram discutidas “ao arrepio da Constituição” demonstra o caráter ilícito da iniciativa. Gonet pontua que Bolsonaro tentou minimizar o episódio alegando não ter usado a palavra golpe, mas isso não altera a configuração do crime.
“O réu procurou minimizar a gravidade de sua conduta, ao argumento de que não utilizou a palavra ‘golpe’, de forma explícita, em suas reuniões”, escreveu. Segundo Gonet, “a nomenclatura atribuída pelo próprio réu ao seu intento ilícito é de somenos importância”.
Na avaliação da PGR, o crime de golpe de Estado se caracteriza justamente pela “derrubada ilegal e repentina de um governo constitucionalmente legítimo, realizada por um grupo de dentro ou fora do governo, frequentemente por meios violentos, como um levante militar ou a aprovação de medidas que invalidam a Constituição por meio de suporte armado”.
Ainda de acordo com Gonet, “a essência de um golpe de Estado reside justamente no uso ardiloso da força”, podendo ocorrer de forma disfarçada. “Assim, em vez de simplesmente ‘golpe’, termos como ‘intervenção’, ‘medida necessária’ ou ‘restabelecimento da ordem’ são utilizados para mascarar os verdadeiros interesses de desconstituição institucional”, apontou.
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A PGR também rebateu a tentativa de Bolsonaro de justificar suas falas públicas sobre fraude no sistema eleitoral como uma mera expressão de frustração ou traço de personalidade. Para Gonet, as declarações tiveram objetivo político claro de minar a confiança na democracia e criar ambiente para a ruptura.
“As declarações prestadas em juízo pelo ex-presidente da República revelaram-se de extrema gravidade. Elas indicam que medidas de exceção foram propostas ao arrepio da Constituição, em situação que jamais poderia ensejar tão gravosa intervenção — o inconformismo com uma decisão judicial”, sustentou o procurador-geral.
Segundo Gonet, o conjunto de provas, que inclui materiais apreendidos, transmissões, entrevistas e depoimentos de testemunhas, comprova que Bolsonaro teve papel central nos atos de violência de 8 de janeiro de 2023.
“O conjunto probatório obtido nas investigações demonstra a responsabilidade do réu nas ações que culminaram nos atos violentos de 8.1.2023. As evidências revelam que o ex-presidente foi o principal coordenador da disseminação de notícias falsas e ataques às instituições, utilizando a estrutura do governo para promover a subversão da ordem”, afirmou. “Portanto, cabe a responsabilização do réu pelos crimes descritos na denúncia.”
A PGR conclui que Bolsonaro, ciente da impossibilidade de reverter o resultado eleitoral por vias legais, optou por investir na consumação de um ato de força. “A certeza sobre a impossibilidade de reversão do resultado das eleições, por meios legais e legítimos, fez com que a organização criminosa concentrasse seus esforços na consumação de um ato de força, único meio capaz de garantir a sua permanência no poder”, diz o parecer.
Com isso, a PGR sustenta que não há dúvidas de que o ex-presidente deve ser responsabilizado pela tentativa de derrubar a ordem democrática, ainda que não tenha reconhecido o termo golpe de Estado de forma explícita.
“Instrumentos de exceção, criados para proteger a ordem democrática em situações extremas, são frequentemente manipulados e aplicados de forma diversa de sua finalidade original, com o objetivo de desencadear essa ruptura”, frisou Paulo Gonet.
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