Crise climática ameaça operações nos portos de São Paulo, Bahia e Rio Grande do Sul, aponta estudo
Pesquisa mostra prejuízos diários de US$ 20 mil a US$ 50 mil com navios atracados. Portos não estão preparados para mudanças
Cidades|Julia Girão, do R7*
A crise climática ameaça o funcionamento e deve causar prejuízos financeiros para os portos de Santos, em São Paulo, Rio Grande, no Rio Grande do Sul, e Aratu, na Bahia. A previsão é mostrada por uma pesquisa divulgada nesta terça-feira (6) e realizada pela Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários). O estudo ressalta ainda que os portos, localizados em importantes regiões geográficas do país, não estão preparados para operar com a chegada das mudanças climáticas nos próximos anos.
O gerente do Polo Clima na I Care, responsável pela realização do estudo, Victor Gonçalves, afirmou ao R7 que chuvas mais frequentes e vendavais são apontados como alguns dos fatores que podem levar à interrupção das navegações nas regiões portuárias.
Cada vez que um navio de carga precisa ficar atracado nos "berços" dos portos, espécies de estacionamentos portuários, por mais tempo do que o planejado, a média da multa é de 20 mil dólares a 50 mil dólares por dia para a embarcação, estima o especialista. Além disso, há ainda as multas contratuais.
O estudo “Levantamento de Riscos Climáticos e Medidas de Adaptação para Infraestruturas Portuárias” afirma ainda que vendavais e chuvas mais frequentes e intensos são algumas das ameaças que podem levar à paralisação da navegação nas regiões portuárias. “Uma vez que se tem uma série de grandes eventos climáticos extremos, pode haver danos físicos nas estruturas dos portos”, explica.
Segundo dados da Antaq, cerca de 95% do comércio exterior, em toneladas, transita pelo sistema portuário nacional, que movimenta R$ 293 bilhões ao ano, cerca de 14% do PIB.
“Dependendo da condição climática, por questões de segurança, a Marinha trava todos os portos e nenhum navio pode entrar nem sair. Isso cria todo um impacto na cadeia logística", afirma Victor Gonçalves.
Os três portos analisados possuem históricos recorrentes de paralisações decorrentes de mudanças climáticas inesperadas, e nenhum deles, segundo o levantamento, está preparado para o aumento de eventos climáticos extremos.
Infraestrutura X clima
A interação das infraestruturas portuárias com o aumento da frequência e da intensidade dos ventos, por exemplo, pode resultar em uma maior demanda por manutenção, aumento de custos e capacidade operacional reduzida.
O porto de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, segundo a pesquisa, é um dos mais propícios a sofrer impactos causados pela crise climática. Até 2026, a região é a que tem maior risco de prejuízos em função dos ventos que vêm do sul e do sudoeste. A frequência dos ventos que atingem o porto, diz o especialista, pode aumentar os custos de manutenção e operacional. Além disso, a região pode ter a capacidade reduzida.
Já no porto de Aratu, na Bahia, o estudo mostrou que as chuvas persistentes serão “muito frequentes” na região, o que se torna a maior causa de preocupação, principalmente para cargas com produtos sólidos, como soja e fertilizantes. Isso porque cargas específicas, como essas, não podem ser transportadas em condições de maior umidade, tampouco sob chuviscos.
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“Não tem uma infraestrutura que não sofra efeitos. O estudo destaca o problema entre a infraestrutura e o clima”, completa Victor Gonçalves.
Entre as possíveis medidas para a redução dos riscos está a criação de bases de dados sistematizados sobre paradas operacionais e danos causados por eventos climáticos. Além da melhoria nos processos de manutenção, investimentos em sistemas repensados para os novos padrões climáticos e o estabelecimento de práticas de monitoramento.
Porto de Santos
No Porto de Santos,um dos maiores e mais importantes do país, o levantamento mostra que as ameaças climáticas de maior probabilidade de ocorrência são as chuvas e os ventos fortes, que podem causar impactos no acesso viário ao terminal, em equipamentos de içamento, entre outros.
A cidade litorânea tem a probabilidade de 120 dias de chuva por ano, e as vagas para o local onde os navios ficam atracados são limitadas, afirma o gerente do Polo Clima.
De acordo com o especialista, Santos, porém, tem especificidades que devem ser levadas em consideração. O canal de acesso é, segundo ele, bastante extenso. Com isso, algumas áreas podem estar mais sujeitas a diversos eventos climáticos. A neblina, afirma ele, pode afetar mais a região de Ponta da Praia, Macuco, Outerinhos, Paquetá e Alemoa. Já a região da ilha de Barnabé pode sofrer com deslizamentos causados por chuvas, o que impacta o acesso viário.
Além disso, por estar imbricado com uma cidade de alta densidade populacional, o porto tem características diferentes dos outros. O acesso viário é dividido entre caminhões de grande porte e carros, o que favorece o aumento do trânsito. Isso ocorre de forma ainda mais acentuada quando o porto é paralisado por conta de eventos climáticos.
As chuvas fortes, que causam queda de árvores, impacto em vias férreas e inundações devido ao entupimento ou à incapacidade do sistema de drenagem das vias, podem levar a custos de reparo e de atraso na movimentação das cargas. Além disso, esses fenômenos provocam problemas de mobilidade na cidade de Santos que poderão impactar diretamente a operação no porto.
* Estagiária do R7, sob supervisão de Fabíola Perez