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Esforço da Samarco para recuperar rio Doce deve gerar gasto extra no futuro

Estudo da USP em parceria com Greenpeace revela erros e acertos em replantio de florestas

Cidades|Gustavo Basso, do R7

Mais de 30 bilhões de litros de lama devastaram margens de rios e afluentes
Mais de 30 bilhões de litros de lama devastaram margens de rios e afluentes

A estratégia utilizada na recuperação das florestas e matas ciliares destruídas pela tragédia da Samarco em Minas Gerais deverá gerar trabalho extra no futuro, afirma o pesquisador da USP que comandou um estudo, em parceria com o Greenpeace, sobre a recuperação das margens dos rios devastadas pela lama do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG).

“O esforço que a Samarco e a Renova estão fazendo é válido, mas [foi] feito sob muita urgência, meio no desespero. Falta olhar para essa recuperação com mais cuidado, de um ângulo experimental, testando em áreas pequenas o que é mais eficiente e, então, replicar em larga escala”, afirma o professor de Ciências Biológicas da Esalq/USP Ricardo Ribeiro.

A fundação Renova foi criada em março de 2016 após um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado entre o MPF (Ministério Público Federal) e Samarco, BHP Billiton e Vale, suas acionistas.

Ribeiro aponta como falhas no projeto o plantio somente de plantas de crescimento rápido, processo conhecido como adubo verde, e a escolha das espécies usadas nesta etapa. “Para reduzir custos e prazos, o método mais usado é plantar espécies nativas junto com o adubo verde. Essa estratégia deles vai aumentar significativamente o custo”, afirma, destacando que o modelo já é usado em áreas de floresta em todo o Brasil com resultados positivos.


Após a tragédia, a Samarco contratou a multinacional Golder Associates para executar a recuperação ambiental das áreas atingidas. Foram selecionadas 15 espécies de rápido crescimento. “Estas espécies, algumas leguminosas, servem para proteger o solo, incorporar matéria orgânica nele e prevenir a erosão”, explica Leonardo Silva, engenheiro agrônomo à frente do projeto na fundação Renova, que substituiu a Golder.

Árvores mortas pela lama de Fundão
Árvores mortas pela lama de Fundão

Silva explica que foi escolhido um trabalho em duas etapas. A primeira contempla a recuperação de 101 afluentes em 113 km dos rios Gualaxo do Norte, Carmo e Doce, e o plantio desse adubo verde em 2.100 hectares (área maior que a ilha de Fernando de Noronha) até dezembro de 2017. “A partir disso faremos o plantio de 600 hectares de florestas até 2020, acompanhando o desenvolvimento até 2026”, conta.


O professor titular da USP critica a escolha das espécies.“Algumas destas plantas são agressivas com as nativas, então terão de ser retiradas manualmente pela Renova, o que representa mais trabalho e custo”, afirma, comentando que optaria por duas espécies que são mais utilizadas em recuperações de floresta em todo Brasil e consideradas mais seguras.

Dimensão inédita


Em 5 de novembro de 2015, 34 bilhões de litros de rejeitos de mineração de ferro da mineradora Samarco foram lançados no meio ambiente após o rompimento da barragem de Fundão, que ainda causou o transbordamento da barragem Santarém. Grande parte desse material se depositou nas margens de rios em Minas Gerais, formando uma espécie de tampão sobre o solo, como conclui o estudo produzido pela Esalq/USP e divulgado nesta segunda-feira (15).

A dimensão da tragédia e seu impacto representam um desafio nunca enfrentado por especialistas em recuperação ambiental, nem mesmo em outras partes do mundo, segundo Ribeiro. “Estamos desenvolvendo uma metodologia que nunca foi usada, e esperamos que não volte a ser”.

De acordo com o texto, “a lama de rejeito, após a secagem, forma uma crosta espessa e compacta que funciona como barreira física ao desenvolvimento de raízes e novas plantas, além de dificultar a infiltração de água no solo compactado. Essa crosta formada pelos rejeitos de minério apresenta níveis muito baixos de matéria orgânica e de alguns nutrientes fundamentais para o desenvolvimento de espécies florestais”.

Ribeiro e a Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queirós) são consultores no projeto de recuperação de 20.000 hectares realizado no Espírito Santo pela empresa de celulose Fibria. Ele comenta o passo-a-passo do trabalho, o maior do Brasil atualmente. "Eles começaram plantando apenas árvores nativas, mas acabaram adotando o método misto com adubo verde porque diminui muito o custa com resultados iguais ou melhores”.

Segundo Leonardo Silva, da Renova, a área a ser recuperada em Minas é bem menor, cerca de 10% da área da Fibria no Espírito Santo, mas nunca foi feita uma restauração de floresta sobre lama de rejeitos nessas proporções. “Não estamos preocupados com o gasto gerado; o método a ser adotado foi escolhido em parceria com a Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais) por ser considerado o mais eficaz”, defende. Em sua página institucional, a estatal mineira afirma ser referência nacional e primeira empresa do ramo no Brasil.

Árvores Mortas

Árvores mortas não serão retiradas, funcionando como poleiro de aves
Árvores mortas não serão retiradas, funcionando como poleiro de aves

Outro problema visível às margens do rio Gualaxo do Norte, o mais próximo a Bento Rodrigues e mais afetado na tragédia, é a grande quantidade de árvores mortas. Às margens dos rios ficam povoados também devastados, como Gesteira e Paracatu de Baixo, e também muitas áreas de florestas.

Muitas árvores dessas áreas foram arrancadas pelo ‘tsunami’ de lama ocorrido em 5 de novembro de 2015. No entanto, as que permaneceram e estão mais próximas dos leitos dos rios estão aparentemente mortas.

“Nós questionamos se deveríamos arrancar estas árvores — mas antes estamos aguardando, porque algumas podem se regenerar”, conta Leonardo Silva.

— No entanto, foi avaliado que a existência destas árvores é importante por funcionarem como poleiros de aves. E estas aves realizam a adubação do solo e a dispersão de sementes através das fezes.

Entre erros e acertos apontados, ambos especialistas afirmam que o ineditismo da situação gerada pelo maior rompimento de uma barragem de mineração no mundo apresenta um desafio para a recuperação do meio ambiente, em uma região já historicamente degradada pela exploração da floresta e matas ciliares para a agricultura e pecuária.

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