'Fiquei até o final, ajudei a carregar os corpos', diz ex-barman da Kiss
Érico Paulus afirmou ao júri nesta sexta ter visto uma fumaça preta semelhante à de um vulcão antes de deixar a boate
Cidades|Fabíola Perez, do R7, em Porto Alegre (RS)
O barman Érico Paulus Garcia, de 30 anos, afirmou, nesta sexta-feira (3), no julgamento do caso da boate Kiss, em Porto Alegre, que ajudou entre 15 e 20 pessoas a deixar a casa noturna na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013, após o incêndio que deixou 242 mortos e mais de 600 feridos. “Fiquei até o final, ajudei a carregar os corpos até o caminhão”, disse ao juiz Orlando Faccini Neto.
Garcia atua hoje como policial militar, mas na época do incêndio trabalhava havia quase três anos na Kiss e prestava serviços gerais.
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O então funcionário da boate disse ainda que, ao olhar para trás, no ambiente em que estava, avistou uma "nuvem preta", segundo ele, "semelhante à de um vulcão". Ele disse ainda que, para deixar a casa noturna, tirou a camiseta e tampou a boca com ela para conseguir respirar melhor. “Tirei a camiseta e tampei a boca. Respirei a fumaça e saí vomitando”, recorda. O ex-barman disse ainda que havia táxis estacionados em frente ao estabelecimento que impediam a saída dos jovens. “Uma pessoa chegou a quebrar o para-brisa de um táxi.”
Garcia lembra que, conforme os equipamentos de ar-condicionado pararam de funcionar, a fumaça passou a ficar mais densa no local. Nesse momento, ele relata que entrou e saiu da Kiss algumas vezes para salvar frequentadores. “Conseguimos trazer as pessoas arrastadas até a porta, e aí os bombeiros as retiravam.” Segundo ele, inicialmente as pessoas foram impedidas de sair pelos seguranças, até o momento em que perceberam o incêndio. “Não reconheci ninguém, a única pessoa que reconheci foi uma amiga nossa por causa do sapatinho dourado. Ela foi levada para o hospital, mas não resistiu e faleceu no meio do caminho.”
O ex-funcionário disse que ligou para a mãe às 4h37, mas antes disso os bombeiros jogaram água em seu corpo para que o fogo não o atingisse. “Percebi que tinha uma pessoa respirando lá dentro, mas já não conseguia chegar até o fundo porque o ar estava ficando pesado. Aí, o bombeiro disse que ‘quem tá lá dentro já está morto’. Um bombeiro disse que não poderia emprestar o equipamento”, afirmou.
Após ter ajudado a levar corpos de vítimas até o caminhão, Garcia disse que uma delegada da Polícia Civil perguntou se ele era funcionário do estabelecimento e o levou para prestar depoimento. Em seguida, ele recorda ter voltado para casa, tomado banho e, convencido por um amigo, foi para o hospital.
Garcia relatou ainda que ajudou a colocar espuma no palco e no teto. Contudo, ele diz que não saberia dizer se o material era inflamável ou não e se era de boa qualidade ou não. “Quando eu cheguei lá, os rolos já estavam.” Em relação à estrutura do estabelecimento, o ex-funcionário confirma a existência das barras de ferro que dividem os espaços. Ele disse ainda que avistou as placas de saída.
Uma mulher da Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Boate Kiss passou mal durante o relato de Garcia. Com isso, o advogado do réu Mauro Hoffmann, Bruno Seligman de Menezes, pediu que o Ministério Público evitasse exibir imagens do dia do incêndio e as considerou “apelativas”.