Pandemia e prejuízos agravam problemas do transporte público
Cerca de 65% da população usa ônibus, trens e metrô; especialista avalia que a pandemia trouxe novas complicações ao setor, mas apontou caminhos para melhorias
Folha Vitória|Do R7
A pandemia do novo coronavírus impôs novos desafios ao transporte coletivo no Brasil, que já enfrentava velhos problemas relacionados principalmente à impontualidade, à superlotação dos veículos, à insegurança e à falta de estrutura em pontos de ônibus e terminais de embarque. Esses problemas são os mais comuns entre os cerca de 2.910 municípios que dispõem de sistemas próprios ou compartilhados de transporte público.
De acordo com a NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), cerca de 65% da população brasileira usa o ônibus, trem ou metrô como principal meio de transporte. E 28% das viagens e deslocamentos dos usuários são feitos diariamente pelo transporte coletivo, sendo que o ônibus responde por 85,7% desse total.
Segundo o professor Rooseman de Oliveira Silva, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Tiradentes (Unit Sergipe), as restrições impostas pelas autoridades de saúde à circulação de pessoas, sobretudo no começo da pandemia, geraram algumas consequências negativas, como a redução do número de veículos e o risco de aumento da contaminação entre aqueles que precisam se deslocar para trabalhar, como profissionais da área de saúde, de segurança, de estabelecimentos comerciais, como farmácias, supermercados, etc.
“Além disso, pode-se destacar também o impacto financeiro nas empresas de ônibus que tiveram suas receitas reduzidas”, disse o professor, referindo-se à queda da demanda de passageiros. Isso é corroborado por outros dados da NTU. Conforme a entidade, as empresas de transporte coletivo acumularam prejuízos de R$ 11,75 bilhões no período de março de 2020 a fevereiro de 2021, o que se refletiu em recentes greves e paralisações de rodoviários em cidades como Aracaju (SE), Natal (RN), São Luís (MA), João Pessoa (PB), Campinas (SP), Florianópolis (SC) e Belo Horizonte (MG).
Somam-se a esses problemas os que já eram enfrentados no cotidiano, que segundo Rooseman, podem variar de acordo com a cultura e a realidade urbana de cada região. Para ele, os mais comuns são a qualidade do serviço, a acessibilidade para pessoas com deficiência, as condições de conforto do veículo e dos espaços de embarque e de desembarque, o cumprimento dos horários estabelecidos para a passagem dos coletivos, a adequação da capacidade dos veículos e o risco de crimes como furto, assalto e assédio a passageiros. O professor resume a questão usando uma frase do urbanista espanhol Arturo Soria y Mata (1844-1920): “Dos problemas da locomoção derivam-se todos os demais da urbanização”.
Caminhos
Mas mesmo com esse cenário, algumas consequências positivas são ressaltadas pelo professor como desdobramentos da pandemia para o transporte público: “Estão relacionadas à redução de acidentes e mortes no trânsito, devido a viabilidade do home office, tem relação também com a redução da poluição atmosférica e com o aproveitamento do tempo para aqueles que antes ficavam boa parte do dia em corredores engarrafados de trânsito. Essas consequências devem ser equacionadas no presente momento, visando a economia urbana, o equilíbrio ambiental e as necessidades da população. E cada uma dessas consequências deve ser analisada com bastante atenção para que sejam tomadas decisões adequadas no futuro pós-pandêmico”, destaca o arquiteto.
Para ele, a resolução das demandas do transporte público no Brasil passa pelo planejamento estratégico de cada município, através do Plano Diretor e também dos Planos de Mobilidade Urbana, determinados pela Lei 12587/2012, para cidades com mais de 20 mil habitantes.
“Dessa forma, poderemos não apenas ‘dar conta das demandas de passageiros’, mas também integrar o sistema de transporte ao plano de mobilidade. É uma orquestração de planos que, estando em consonância e atentos aos problemas do município, pode contribuir para estabelecer um controle sobre a ocupação do solo urbano, um monitoramento sobre o crescimento da cidade em equilíbrio com o meio ambiente e uma integração dos modais de transporte”, orienta Rooseman, citando alternativas de mobilidade urbana como a caminhabilidade, o sistema cicloviário, incluindo programas de incentivo à bicicleta de acesso público e o uso da carona compartilhada em veículos particulares.