No final do ano, histórias de chegadas e partidas se cruzam na rodoviária
Gazeta Digital|Do R7
Levando todas as suas roupas, as do marido e dos 5 filhos, a dona de casa Ester Nogueira, 40, abandonou seus 18 anos vividos em Juína (735 km a noroeste de Cuiabá) para voltar para sua cidade natal, Bom Jesus da Lapa, na Bahia. Na semana passada, na quarta-feira (26) logo após o Natal, ela embarcou numa viagem prevista para durar 3 dias.
Ao lado dos filhos gêmeos, de 6 anos, na rodoviária de Cuiabá, Ester esperava o 2º ônibus dos 3 que deveria utilizar para chegar à cidade baiana. No terminal rodoviário, diversas pessoas esperavam impacientes pelo horário de partida ou de chegada. Atentos aos ponteiros do relógio, carregavam além das mochilas e malas, histórias de recomeços, despedidas ou encontros.
Recém-casada e com uma filha de 2 anos, há 18 anos Ester saiu da Bahia junto ao esposo para tentar a sorte em uma fazenda de café no interior de Mato Grosso. Eles seguiram os passos de uma cunhada, que veio para o cerrado junto com o marido.
Os anos vividos em solo mato-grossense foram sustentados com a venda de leite e café que eram produzidos pela família. Ester teve mais 4 filhos. Há 3 anos, contudo, o cunhado morreu enquanto cortava madeira na propriedade. Foi o suficiente para que toda a família sentisse a necessidade de voltar para casa.
"Não saía do papel. É uma questão de morte e minha cunhada tinha muita coisa para resolver. Essas coisas não se resolvem assim, só veio terminar de resolver agora. Como ela é sozinha e não tem filhos, a gente esperou ela terminar de resolver tudo primeiro", explicou.
No Natal, a família passou a ceia arrumando as malas para a nova jornada. Os móveis foram vendidos e as roupas compactadas em mais de 10 malas, que eram carregadas com dificuldade pelo patriarca. O resto da família se dividiu em 2 carros.
Desde o nascimento dos gêmeos, há 6 anos, Ester não vê os pais. Apesar de não terem nada definido, a expectativa é que em 2019 a família trabalhe em uma chácara perto da cidade, para que as crianças possam estudar e a filha mais velha faça faculdade de medicina veterinária.
"Minha família está esperando a gente para o ano novo. Vamos chegar lá para ver. Estão planejando, estou empolgada. Estou muito feliz pelo tempo que não via eles. Eu gosto de Juína, não vou dizer que não tenho boas lembranças, mas perto da família é bem melhor. Não sei se vou me sentir completa. Não sinto medo, mas é um recomeço", disse.
Amor à distância
Sentado na plataforma oposta a de Ester, o barbeiro Rafael Caetano, 24, esperava seu 2º ônibus com destino ao Rio de Janeiro, sua cidade natal. Há 2 meses, ele largou tudo para encontrar uma mulher que conheceu pela internet em Vilhena, Rondônia. Sem ter se acostumado com o clima pacato do Município, o barbeiro decidiu voltar para casa.
"Eu conheci essa pessoa através do meu irmão. Ela curtiu uma foto minha que publiquei com ele. Eu fui lá e pedi o 'zap' dela. Meu irmão já conhecia ela. Fiquei conversando com ela por 2 meses e decidi ver ela. Eu vim porque ela tinha medo do Rio", explicou.
Autônomo, ele abandonou seu salão e separou o dinheiro que havia economizado ao longo de vários anos de trabalho para embarcar rumo à cidade desconhecida. O que atraiu Rafael foi a "humildade" da amada. Nos 2 meses em que ficaram juntos, o barbeiro trabalhou em um salão de Vilhena e conheceu pontos turísticos, mas não foi o suficiente para que tivesse vontade de ficar.
"Eu gostei um pouco dela, mas para mim o lugar não é agradável. Sou acostumado com um ritmo mais rápido. Eu gosto de curtir balada e ela não gosta muito. Ela não consegue nem acompanhar meu jeito de falar, diz que falo com gíria", pontua ele sobre as diferenças que o motivaram a voltar para o Rio de Janeiro.
O tempo em que ficou em Rondônia, contudo, não foi o suficiente para conhecer tudo sobre a mulher. Apesar de ter morado na casa dela, Rafael não descobriu qual era a sua profissão. Os planos para o futuro agora consistem em fazer com que ela vá visitá-lo no Rio de Janeiro.
"Ela vai ter que ir. Já disse que se ela me quisesse até viria buscar ela, sem problema nenhum. Já fiz muito para isso dar certo, agora é a vez dela. Eu já me desdobrei, já fiz um sacrifício. Ela falou que nunca ninguém tinha feito isso por ela, vir de tão longe assim. Eu praticamente atravessei o Brasil", finalizou.