Kiss: mãe passa mal, e familiares se retiram durante fala de ex-prefeito
Presidente da Associação de Familiares, Flávio da Silva, disse que o depoimento do prefeito “provocou náuseas” nos presentes
Cidades|Fabíola Perez, do R7, em Porto Alegre (RS)
Em protesto ao depoimento do ex-prefeito de Santa Maria, familiares e sobreviventes do incêndio deixaram a sala do plenário do Foro Central I às 10h. Os parentes dos jovens mortos e feridos na boate Kiss criticaram as falas do prefeito, que criticou o inquérito da polícia e isentou a prefeitura de eventuais responsabilidades pelo incêndio. Uma mãe de vítima passou mal.
“É um sinal de protesto a todos os desrespeitos que estamos ouvindo lá. O prefeito deveria ter agido na hora porque ele era o gestor e não o fez. Agora ele vem aqui para se promover politicamente. É um desrespeito muito grande com as famílias e com os jurados. As palavras que saem da boca dele nos causam náuseas e não somos obrigados a aturar aquilo que nos faz mal”, disse Flávio da Silva, presidente da Associação de Vítimas e Familiares da Tragédia da Boate Kiss.
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Uma das mães, que integra a associação de vítimas e familiares, deixou o plenário ao passar mal. Ela se sentou nas cadeiras na parte externa da sala e começou a chorar. "Por que mataram meu filho?" A mulher teve de ser atendida pela equipe de profissionais do ambulatório médico do prédio. Os integrantes da associação deixaram o plenário e se recolheram em uma das salas de apoio do Tribunal de Justiça destinadas ao grupo.
Fátima de Oliveira Carvalho, mãe da vítima Rafael Carvalho, disse que os familiares estavam na expectativa de saber como seria o depoimento do ex-prefeito. No entanto, ao acompanhar o interrogatório, consideraram as falas de teor político. “Meu sentimento em particular é de que ele estava usando o meu filho, os nossos filhos, a nossa dor para se promover. Não é justo isso. Começamos a criar entre nós uma vontade de sair. Não podemos nos manifestar e pensamos em sair todos juntos para mostrar que não concordamos com essa atitude para mostrar que não estávamos satisfeitos”, disse ela.
A família de Rafael Carvalho vive em São Paulo. Ela conta que o filho fez um intercâmbio na Nova Zelândia, onde conheceu amigos de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. No dia do aniversário de Rafael, ele havia decidido comemorar com os amigos na casa noturna. “Foi um depoimento apelativo, uma atitude horrível e de desrespeito conosco. Senti que ele estava fazendo uma propaganda política ali.”
Fátima disse também que os sobreviventes que depuseram no plenário revivem o trauma da tragédia. “É difícil, mas é necessário. Poderíamos ter vivido tudo isso na época certa se a justiça não fosse tão morosa, se não houvesse tanto desejo de adiarem isso”, diz. “Vim pelo meu filho e por todos os outros. Quis estar aqui com as outras mães que estão na mesma situação que eu acompanhar o sofrimento das mães que estão na mesma situação que eu. Por isso achei um ato de muita maldade, criminoso até, de utilizar esse momento para se promover. Não é fácil ouvir tudo que estamos ouvindo.”
O que disse Cezar Schirmer
Além de narrar como recebeu a notícia do incêndio e como foram as primeira ações na madrugada do dia 27 de janeiro, o ex-prefeito de Santa Maria criticou o inquérito realizado pela polícia civil para investigar as causas do incêndio e vinculou a atuação os delegados a interesses políticos. “Havia uma divergência profunda e histórica entre as minhas posições político partidária e a do partido com quem eu disputei e venci. Tenho convencimento de que os delegados agiram em função disso.”
Scrirmer reforçou ainda a existência de uma narrativa de que mais pessoas deveriam estar no banco dos réus. “Havia um esforço desde o começo de que ‘falta mais gente no julgamento’. Isso era uma narrativa para responsabilizar, é uma estratégia da defesa. Não fiz nada que pudesse comprometer a mim e nenhum servidor da prefeitura. Aquilo foi um incêndio. Faltou coragem, isenção, responsabilidade. O inquérito é muito ruim. Mais de 150 funcionários foram chamados. Não foi nem uma nem duas vezes que eu tive que acompanhar funcionárias chorando com a truculência da polícia.”
“Nos primeiros dias fiquei muito abalado por tudo que estava ocorrendo, agora que estou na prefeitura. Uma das minhas filhas me disse: ‘pai isso é uma missão que Deus te deu. Tu tem que cuidar da cidade, das famílias, dos sobreviventes, dos doentes’ e foi o que eu fiz. Nunca dei entrevista para evitar constranger mais ainda o ambiente difícil e traumático que vivia a minha cidade”, disse o prefeito à promotora de Justiça do Ministério Público, Lúcia Helena Gallegari.