Parque temático capacita equipes e instalações por inclusão de autistas
Beto Carrero World, em SC, é o primeiro no país a promover curso especial para receber famílias de autistas. Foram treinados 350 colaboradores
Cidades|Cesar Sacheto, do R7
O Beto Carrero Wolrd, parque temático situado no município de Penha, no litoral norte de Santa Catarina, se tornou o primeiro estabelecimento do setor no Brasil a capacitar a equipe e adaptar as instalações para atender autistas, considerados também como pessoas com deficiência.
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Cerca de 350 colaboradores (85% do efetivo) do parque que atuam em diversas funções de atendimento ao público e nas atrações (bilheteria, operação de brinquedos, monitores, seguranças, bombeiros, enfermeiros, etc.) realizaram o treinamento.
Amanda Ribeiro, especialista em intervenção precoce do autismo pelo CBI Miami (sigla em inglês para Child Behavior Institute of Miami) e uma das idealizadoras do curso, conta que o trabalho incluiu o atendimento prioritário e a inserção do laço, composto pelo quebra-cabeça colorido — símbolo mundial da conscientização sobre o TEA (Transtorno do Espectro Autista) —, emblema ainda desconhecido para muitas pessoas.
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"Além dos treinamentos, uma avaliação técnica orientou os coordenadores do espaço sobre alterações de processos internos que contribuirão para melhor recepção e acolhimento de autistas. Uma empresa que demonstra responsabilidade social, se preparando para recepcionar pessoas com TEA, traz benefícios para os autistas e suas famílias, para o empreendimento e para a sociedade, ampliando a inclusão social", acrescentou a empresária.
Medidas de acessibilidade
O parque adotou uma série de medidas para aprimorar o atendimento aos autistas: distrituição de botons de identificação para o uso de atendentes da linha de frente; alteração das placas de Preferencial para Prioritário no Castelo; criação de uma sala TEA com disponibilização de brinquedos terapêuticos de madeira; disponibilização do selo Amigo do Autista no Comercial; identificação de acento prioritário nos shows; identificação das catracas de acesso prioritário TEA.
Maria Luiza Jordão, especialista em análise do comportamento, psicóloga e sócia da empresa responsável pela capacitação, reforça a importância da preparação de trabalhadores das mais diversas áreas de atendimento para lidar com autistas.
“Essa introdução possibilita que os estabelecimentos e seus colaboradores tenham mais condições para o atendimento a autistas, conhecendo as principais características, suas necessidades e sensibilidades."
Legislação
O avogado Marcelo Roberto Bruno Válio, atuante na área de direito das pessoas com deficiência e membro da Comissão de Defesa dos Direitos dos Autistas da OAB-SP avalia que, na visão jurídica, o parque cumpre a legislação vigente no país para assegurar os direitos dos autistas, prática já amplamente adotada em outras nações, caso dos Estados Unidos.
"Temos a lei brasileira de inclusão que. nos artigos 42 ao 45, fala sobre direito à cultura, esporte, turismo e lazer. Aqui, quando se fala nesses direitos, em igualdade de oportunidade com os demais. todas aquelas barreiras que as pessoas com deficiência encontram devem ser afastadas. Foi aí que o Beto Carreiro levou em consideração esse treinamento. Isso se iniciou nos Estados Unidos, junto à Walt Disney. Tem outros locais no Brasil que estão caminhando muito bem", comentou.
No entanto, o advogado frisou que o tema não pode ser tratado como "mero gracejo" pelos administradores de estabelecimentos de turismo e outros equipamentos de lazer, pois tal responsabilidade é prevista na Lei 13.146/2015.
"Temos também uma lei importantissima que traz o autista e a pessoa com deficiência, que é a Lei 12.7643, de 2012, Fala tão somente da politica nacional de proteção do direito da pessoa com TEA", complementou.
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Marcelo Valio citou o futebol para exemplicar as barreiras sentidas pelos autistas em atividades externas, mas destacou que os mesmos cuidados devem ser adotados em arenas esportivas, cinemas, museus, teatros e casas de shows.
"No estádio [por exemplo], o ruído é muito alto. Aquela pessoa [com TEA] tem uma sensibilidade enorme e precisa de local adequado para que esse ruido não lhe atrapalhe a vida. Na Arena [Neo Química] Corinthians, existe um espaço para a pessoa com TEA, com vidros mais grossos, fones de ouvido, luz baixa. tudo para dar aceso ao lazer mas de forma inclsiva", pontou.
Conscientização e políticas públicas
O especialista em direitos dos autistas Marcelo Valio diz ouvir relatos de muitos pais sobre enormes dificuldades, especialmente nos períodos de férias. A falta de terapias adequadas e o tempo em casa nesses períodos do ano forçam os familiares ou responsáveis a buscarem um tipo de serviço ainda pouco desenvolvido no Brasil.
Por isso, Marcelo Valio aponta a necessidade de uma mudança de mentalidade e de conhecimento da legislação vigente por parte da população, assim como empenho de políticos, legisladores e governos em busca da inclusão social de autistas e pessoas com deficiéncia.
"É a falta de instrução que a nossa população sofre. Não tem instrução de lei que fale da adaptação das pessoas com deficiência aos locais. É o contrário. Falta, acima de tudo, conhecimento por parte da sociedade da existência de legislação que protege [o autista e pessoas com deficiência]. E políticas públicas de conscientização da igualdade de direitos", finalizou o advogado.