Há cerca de seis meses, Dodi Leal, 32 anos, assumiu sua nova identidade. A primeira pessoa para quem ela falou sobre mudar de gênero foi seu namorado na época. No entanto, a reação não foi boa e ele começou a dizer que Dodi tinha alguma doença e os dois se separaram após um ano e meio de relação. Contar para os pais também não foi simples.
— Com a família foi muito desafiador. Eles não compreenderam no começo. Foi motivo de discussão.
Para ajudar nesse processo, Dodi e a família participaram de quatro seções de mediação de conflito no Cejusc (Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania).
— Não chega a ser uma terapia, é uma mediação de conflito. Levei uma queixa de problema de transfobia, e a gente conversa, ouve as partes, todo mundo se abre.
De acordo com Ricardo Pereira Junior, juiz coordenador do Cejusc central, após receber uma solicitação para mediar um conflito, é enviada uma carta para a parte envolvida para marcar um encontro.
— Convidamos a parte para esse encontro e a gente tenta resolver a mediação sem necessidade de processo. Na maioria das vezes, atendemos casos de família e questões de direito do consumidor.
Segundo o juiz, desde 2012, o Cejusc oferece esse tipo de serviço e hoje são cerca de 3.000 mediações ao mês com nível de resolução em 70% dos casos. No entanto, conciliações relacionadas a racismo, homofobia e transfobia ainda são pouco solicitadas.
— Nosso pessoal é preparado para lidar com o problema dessas pessoas, que costumam ser graves, de aceitação na família e discriminação no ambiente de trabalho. Não temos esses casos com muita frequência, mas acho que talvez porque as pessoas não conheçam essa possibilidade.
Para Dodi, essa ajuda com a mediação foi essencial para a evolução da relação com os pais.
— Foi difícil para os meus pais, mas foi possível. Com diálogo [...] eles estavam abertos e falamos de coisas da adolescência. Foram quatro seções muito transformadoras e parecia terapia. A gente tinha que fazer um programa junto, levei os dois no show no Liniker que é aquela coisa que tira todos os padrões das caixinhas e minha mãe frequenta um grupo de mães de pessoas LGBTs. Meu pai tem que me ajudar com meu ex-namorado. Tive que começar assim.
Hoje, segundo Dodi, a relação com os pais está bem diferente e ela já conta com o apoio dos dois nesse processo de transição, ainda em fase inicial.
— Esses dias eles foram ao meu trabalho e me chamaram o tempo todo no feminino... "minha filha”, “ela ama o que ela faz”... Isso dá moral também. A transformação de um, impacta no outro e isso dá um alívio.