Adesão à OCDE será concluída com Bolsonaro, diz secretário
Segundo Marcos Troyjo, as vantagens da adesão são acelerar as reformas, o aumento de fontes de liquidez e permite a participação em acordos
Economia|Do R7
O secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais, Marcos Troyjo, prevê concluir a adesão do Brasil à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) ainda na primeira administração do governo Jair Bolsonaro.
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Segundo ele, há três grandes vantagens da adesão: acelera as reformas ao fortalecer as instituições, "vira a chave do cofre” de fontes de liquidez que hoje enfrentam restrições para aplicar o dinheiro no Brasil e permite a participação em acordos em outras esferas além de tarifas e cotas.
Troyjo diz ainda que a inflexão política na Argentina ajudou a acelerar o processo de apoio dos americanos à candidatura brasileira. "Num momento em que a Argentina tem uma inflexão e todas as suas sinalizações de política pública parecem se afastar dos princípios que são preconizados pela OCDE, é apenas natural que a maior economia da OCDE tenha que priorizar outro candidato, que no caso é o Brasil", afirma. Confira os principais trechos da entrevista:
O que mudou do final do ano após os Estados Unidos terem colocado a Argentina na frente na lista de apoio à adesão na OCDE?
Quando houve o momento de aproximação estratégica dos presidentes Bolsonaro e Trump, a Argentina já era candidata. É natural que tenha um critério cronológico. Num momento em que a Argentina tem uma inflexão e todas as suas sinalizações de política pública parecem se afastar dos princípios que são preconizados pela OCDE, é apenas natural que a maior economia da OCDE tenha que priorizar outro candidato, que no caso é o Brasil.
Qual é o caminho a partir de agora?
É uma mistura de coordenação com os países-membros. Muitos deles já endossaram formalmente seu apoio ao Brasil: Japão, Alemanha, Reino Unido, etc. Acelerar as reformas ainda mais, e aí é um processo natural. No âmbito dessa primeira administração Jair Bolsonaro.
Parte daquilo que é preconizado na OCDE tem a ver com mecanismos de combate à corrupção, transparência pública, diminuição do papel do Estado na economia, melhor ambiente de negócios. Isso tudo é cotidiano das pessoas, seja você uma empresa que trabalha com exportação e importação ou não.
É um processo muito importante de ascensão do Brasil à OCDE, que teve ontem (14) o seu auge. Entrar na OCDE é igual a ficar sócio de um clube. Você tem que apresentar uma documentação, mas você não pode levar um não dos sócios. Havia a resistência de alguns países, e essa visão do presidente Bolsonaro de reconstruir uma aliança com os Estados Unidos. O Brasil está em busca do tempo perdido. É muito estranho. São as duas maiores democracias do Ocidente e economias da América. Deveriam ter um intercâmbio comercial muito maior. Os americanos estavam jogando com um critério cronológico. Transcorreu-se um período de ciclo eleitoral na Argentina e isso permitiu agora (o apoio ao Brasil), como está se oficializando hoje em Paris.
A Argentina estava na frente. E teve toda a polêmica com o fato de o Brasil ter aberto mão do tratamento especial na OMC...
A crítica que se fez no segundo semestre do ano passado me parece mal findada porque por um lado os EUA nunca deixaram de apoiar o Brasil, e mais uma vez entrar na OCDE é um processo. É mais parecido com um rali do que um prova de tiro de curta distância. Você ganha no final se cumprir todas as etapas. Em relação à OMC, se esse tratamento especial e diferenciado fosse tão importante para o Brasil, por que não somos uma potência comercial? Por que o comércio exterior nos últimos 50 anos não desempenhou um papel importante para o desenvolvimento brasileiro? Por que o Brasil continua como um das economias mais fechadas do mundo? Começou a abrir mão de algo que não gerou benefícios completos.
Teremos três benefícios muito concretos. Em primeiro lugar, a relação de tarefas que o País tem que cumprir para se tornar membro são em si um grande movimento na direção do fortalecimento institucional. O que casa com as reformas internas que estamos fazendo. Aqui começa um jogo de espelhos muito interessante.
O país vai fazendo a sua reforma interna porque tem mais condições de entrar nesse clube de elite que é a OCDE. Estar no caminho para entrar na OCDE funciona como um catalisador, uma acelerador das reformas internas no Brasil.
Total. Mais importante, se fizermos uma análise da trajetória de ascensão de outros países, o rumo e a predisposição trabalham de mãos dadas com o cumprimento de cada uma delas. Não precisa necessariamente ter cumprido todos os critérios, seja para ter seu acesso iniciado, seja para se tornar membro efetivo da organização. Mas precisa ter o compromisso. De todos os países que estão apresentando pleito na OCDE, o que está mais avançado é o Brasil. No momento em que você vai fazendo sua lição de casa para entrar na OCDE, os ganhos institucionais são tão grandes que depois é muito difícil retroceder. (Entre os que aderiram) Tem uma só exceção: o México.
Isso funciona também com uma grande lição para o Brasil. O México deveria ter feito reformas modernizantes internas em termos de sindicatos, abertura de negócios, diversificado os seus parceiros internacionais. Ele destinou muito do seu comércio para Estados Unidos e Canadá.
Com os efeitos de compliance (termo em inglês que costuma ser traduzido como "conformidade", é o conjunto de normas e procedimentos para evitar desvios de função em empresas e governos, como pagamentos de propinas e vantagens indevidas) e estatutários que se seguiram à grande recessão de 2008, muitas fontes de liquidez (disponibilidade de recursos) do mundo, como investidores institucionais, só têm a possibilidade de fazer alocação de recursos em países que obedecem a critérios de investment grade ou que se associem às regras preconizadas na OCDE. No momento que o Brasil entra, ele vira a chave do cofre de determinadas fontes de liquidez, sobretudo de investimentos de longo prazo para infraestrutura, a que não temos acesso.
Os acordos comerciais do futuro não serão necessariamente sobre tarifas e cotas. Mas, por exemplo, quais são os critérios de propriedade intelectual que você abraça, de compras públicas, qual o papel que permite o funcionamento de empresas estatais, que regimes internacionais de produção se adequa... Essas regras, que são da OCDE, formam a matéria-prima dos acordos comerciais de investimentos de quarta geração. No momento que faz o dever de casa para entrar na OCDE, (o Brasil) está automaticamente criando musculatura para participar dos acordos comerciais de quarta geração, que são mais sobre padrões do que tarifas e cotas.
Na lição de casa ainda por fazer, o que precisamos acelerar?
É uma combinação de ambiente de negócios, que foi muito endereçado pela Lei de Liberdade Econômica, e a modernização tributária do Brasil.
Veja, a grande maioria de membros é do continente europeu, que tem como principal associação política e econômica a União Europeia. A União Europeia concluiu um acordo com o Mercosul, cuja principal economia é o Brasil. Se você fizer uma radiografia dos apoios que o Brasil tinha antes do governo Bolsonaro, a grande maioria delas era de países europeus, o que continuou neste ano. O grande elo que faltava era o endosso do governo dos Estados Unidos, que nós não apenas obtivemos como conseguimos elevar, graças à atuação do presidente, à condição prioritária.
Depende muito da audiência com quem você está falando. Quer um exemplo maior da importância do Brasil do que a própria União Europeia ter concluído o acordo com o Mercosul? Setenta por cento do Mercosul é o Brasil. Nesse processo da OCDE, sempre contamos com o apoio dos países europeus. Concretamente, como a OCDE é uma instituição sobre padrões, isso mostra predisposição do Brasil em se vincular àquilo que ela considera as melhores práticas da vida política no século 21. O próprio acordo Mercosul-União Europeia tem um dos mecanismos mais sofisticados e avançados sobre a relação entre comércio, investimento e desenvolvimento sustentável e meio e ambiente. Todos se comprometem a se manter vinculados a instrumentos institucionais internacionais de proteção ao meio ambiente.
O mais importante para o Brasil é na linha das incertezas para as reformas, que são mais eficientemente conduzidas se o ambiente externo é favorável. Um entendimento dessa natureza, que acontece no sentido de diminuir a incerteza global, é do interesse do Brasil. O Brasil tem mais a ganhar com um ambiente internacional favorável do que com oportunidades comerciais pontuais que possam aparecer aqui e ali nesse reajuste entre os Estados Unidos e a China.
Qual é o risco para o Brasil e para a economia global se o acordo fracassar e houver uma guerra comercial entre Estados Unidos e China?
O risco é grande porque ele opera na formação de expectativas e você acaba segurando a tomada de decisões. Nesse aspecto, os efeitos negativos para o Brasil de um acirramento do momento comercial entre EUA e China são uma diminuição do nível de atividade econômica global. Ainda mais um país que está fazendo o nível de reformas estruturais que a gente está fazendo, é muito melhor a gente fazer essas reformas num momento de dia ensolarado lá fora do que num momento de tempestade. Agora, o Brasil está nadando contra a corrente e está recebendo mais investimento estrangeiro direto, e vai continuar em 2020. Essas oportunidades de crise são também oportunidades de grande diferenciação. Aliás, muitos fatores positivos confluíram para a gente ter resultado positivo na conclusão das negociações Mercosul-União Europeia. E o cenário mais conflagrado no comércio internacional foi um deles. É justamente porque você tem mais focos protecionistas no mundo que você incutiu nos negociadores a importância de acelerar o processo. Nesse momento em que há dificuldade de aprovação de novos sistemas previdenciários na França, no Chile, você ter uma reforma da Previdência como teve no Brasil é um elemento de grande diferenciação.
De maneira alguma. Se você pegar todos os países do mundo, a grande maioria deles tem como grande parceiro comercial a China, não os Estados Unidos. Pela própria natureza do crescimento Chinês, do processo de agregação de camadas da população chinesa ao universo de consumidores. Agora, no caso específico dos Estados Unidos, o que é típico do Brasil é que nós estávamos muito atrás. Vivemos um apagão de décadas. Isso levou a que as relações econômicas entre Brasil e Estados Unidos estivessem abaixo de sua altura de voo, do seu potencial. É uma deseconomia brutal.
O importante aqui é que as negociações formalmente comecem por meio daquilo que os técnicos chamam de troca de uma lista de ofertas. Outro elemento que vai entrar nessa equação é qual vai ser o formato do Mercosul. Até agora temos sido uma união aduaneira. Se vamos negociar um acordo com os americanos que envolva tarifas e cotas, então nós precisamos negociar com o chapéu do Mercosul. Ou então, nos próximos meses, nós vamos buscar uma flexibilização, o que eu chamo de ‘Mercosul flex’, para permitir que os países individualmente busquem esses acordos.
Vai depender muito da maneira como você constrói isso.
Ainda não. O primeiro passo é montar um cronograma. Como a gente avançou bastante nesses entendimentos, os dois presidentes falaram positivamente, o Ministério das Relações Exteriores também tem uma conversa importante com o governo americano... você está com o palco razoavelmente montado para que isso aconteça. Agora, a gente entende também que tem as circunstâncias tanto do Brasil quanto dos Estados Unidos. A circunstância do Brasil é: nós precisamos que o Mercosul tenha a cara que a gente quer, um veículo de integração. Temos que ter essa certeza para se lançar numa negociação com a maior economia do mundo. E por parte dos Estados Unidos, eles estão nesse contexto desse reajuste das relações econômicas com a China, o que consome muita energia e foco das equipes negociadoras, e você tem outro elemento importante que é um ano de eleição nos Estados Unidos. Agora, o presidente Trump já disse que quer negociar.
Sim. Mas também não vamos ficar parados nessa agenda. Tem uma série de questões regulatórias, intelectuais, de tecnologia, onde não necessariamente o Brasil precisa utilizar o chapéu do Mercosul. Um exemplo é o comércio eletrônico.
Você não tem exemplo de país que tenha tido aumento expressivo de renda per capita nas últimas décadas sem relacionamento econômico-comercial preferencial com os Estados Unidos. É o caso da Alemanha, do Japão, da Coreia do Sul, da Cingapura, do Chile. E tem o caso mais notório de todos, que é o caso da China. Temos que preencher essa lacuna.
A principal mensagem que o ministro Paulo Guedes vai levar tem a ver com o que dissemos em janeiro do ano passado. Apresentamos o plano de voo e agora vamos mostrar como percorremos esses caminhos no campo da Previdência, na abertura da economia via acordos internacionais de comércio, na melhoria do ambiente de negócios por meio da aprovação da Lei de Liberdade Econômica, por meio de mais de R$ 100 bilhões em privatizações. Esse quinteto de reformas (Previdência, reforma do Estado, melhoria de ambiente de negócios, privatizações e concessões e integração da economia no mundo) perfaz a mais importante dinâmica de transformações estruturais que está acontecendo no mundo. Em que lugar no mundo está acontecendo o mais dramático processo de reformas institucionais e reformas estruturais? É no Brasil.
O ano de 2019 foi o mais importante da história, concluímos um tratado com 27% da economia mundial, que é a União Europeia mais EFTA. Esse ano estamos indo pra frente com Canadá, Coreia do Sul, Cingapura. Tanto o presidente (dos Estados Unidos, Donald) Trump quanto o presidente Bolsonaro já sinalizaram que querem um acordo comercial iniciado. É muito importante o Brasil aproveitar a janela de oportunidade que o presidente Trump tem o mandato para promover acordos comerciais até julho de 2021.