Com risco de crise no crédito, mercado prevê antecipação da queda dos juros
Segundo especialistas, mudança da projeção considera aperto das condições financeiras do país, ampliado pelo crise da Americanas
Economia|Do R7
Com o risco de piora do mercado de crédito aumentado pela crise da Americanas, alguns economistas preveem uma queda da taxa básica de juros, que hoje é de 13,75%, mais cedo do que o esperado, ainda mais no atual cenário que já é de desaceleração da atividade econômica. Segundo analistas, a ameaça ao crédito poderia ser um aceno "técnico", e não político, do BC (Banco Central) ao governo, de que o corte de juros não está tão distante.
Essa possibilidade não é uma unanimidade, por conta das incertezas que ainda existem em torno da âncora fiscal, com chance de mudança das metas de inflação.
Nos últimos dias, o Banco Alfa e o Banco Fibra anteciparam as expectativas de início do ciclo de cortes, citando o risco de piora do mercado de crédito. Saindo de um cenário de juros estáveis em 13,75% até dezembro, o Fibra diminuiu a sua projeção da Selic no fim de 2023 para 12,5%, incorporando à estimativa cinco cortes de 0,25 p.p. (ponto porcentual) a partir de junho.
O economista-chefe do banco, Cristiano Oliveira, afirma que a mudança da projeção leva em conta o aperto das condições financeiras do país, que pode ser amplificado por problemas de crédito de "algumas empresas varejistas".
Isso significa um impulso negativo do crédito, em um momento no qual a atividade já desacelera naturalmente, devido ao aperto monetário conduzido pelo BC.
"[O contexto] justifica maior atenção do BC para a intensidade da desaceleração da atividade econômica que está sendo contratada neste momento e, certamente, irá desacelerar ainda mais a demanda e a inflação de preços livres", afirma Oliveira, em relatório assinado também por Ágila Cunha, economista do Fibra.
O cenário básico do banco indica desaceleração do crescimento do PIB a 1,0% neste ano, e de 2,9% em 2022.
Oliveira alerta, no entanto, que o mais provável é que a nova proposta de arcabouço fiscal seja menos dura do que o teto de gastos. Nesse caso, a tendência é de que o mercado precifique incerteza no cenário, de forma a manter a curva de juros futuros sob pressão.
Ao mesmo tempo, a desancoragem das expectativas impedirá a convergência da inflação a 3% no médio prazo.
"O mercado de juros deve continuar sendo o principal termômetro de risco macroeconômico, e o spread [a diferença em relação ao valor original] entre os vértices curtos e longos deve continuar elevado, limitando o efeito da queda da taxa básica de juros", diz.
Para o economista-chefe do Banco Alfa, Luís Otávio de Souza Leal, o início do ciclo de cortes nos juros será antecipado de setembro para junho, devido à piora dos dados de crédito. Esse quadro, combinado com a reoneração dos combustíveis e com a apresentação de um arcabouço fiscal crível, pode levar o BC a sinalizar que a redução dos juros será logo, já na próxima reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária, que vai ser realizada no dia 22.
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"Parece que o impacto da política monetária sobre o mercado de crédito está bem encaminhado, seja pelo canal tradicional, seja por uma 'ajudinha extra' do caso Americanas", diz Leal, no relatório semanal de macroeconomia do Alfa. O economista fala que já se observa um aumento da inadimplência e do spread no crédito para pessoas físicas, e que a tendência é de piora também para as empresas.
Mesmo antecipando um início mais rápido do ciclo de cortes, o economista do Alfa diz que o ritmo da diminuição deve ser menor, de 0,25 p.p. por reunião, ante o 0,5 ponto esperado anteriormente. Leal aumenta a projeção de Selic no fim de 2023, de 12,25% para 12,5%, mas afirma que o novo cenário ainda implica juros médios menores no ano, de 13,10%, ante os 13,50% da estimativa anterior.
No entanto, há analistas que consideram baixa a chance de antecipação dos cortes da Selic. "O evento Americanas potencializa marginalmente a desaceleração do ritmo de expansão de crédito, mas a gente não está vendo um evento de crédito que crie um problema sistêmico. Você não pode achar que, se não cortar os juros, a economia vai implodir", diz o economista da BlueLine Asset, Flávio Serrano. "Nesse ambiente, faria mais sentido adotar políticas macroprudenciais, que ataquem o problema microeconômico na margem", avalia.