Estrangeiro quer comprar ações brasileiras, mas risco fiscal preocupa, diz Itaú
Estrategista-chefe do banco explica que os investidores gringos se incomodam com incertezas relacionadas ao BC, discussões envolvendo meta de inflação e mudanças em reformas aprovadas
Economia|Do R7
Um arcabouço fiscal crível e uma perspectiva mais clara de potencial queda da taxa de juros são componentes essenciais para revigorar o investimento estrangeiro nas ações brasileiras, avalia o estrategista-chefe do Itaú BBA, Marcelo Sá, após encontros recentes com investidores nos Estados Unidos.
Ele observou uma deterioração nas expectativas em relação a reuniões realizadas em outubro do ano passado, o que avalia ter se acentuado no começo deste ano, em meio a preocupações com a área fiscal e o respectivo efeito na curva futura de juros.
"Há muitos investidores querendo comprar Brasil, mas preocupados com essa incerteza (fiscal). Se essa incerteza diminui, você tem fluxo porque o Brasil está barato", afirmou Sá. Segundo ele, esses investidores buscam entender o que é apenas retórica do governo e quais as batalhas que realmente quer comprar.
Dados da B3 mostram que as entradas líquidas de estrangeiros na bolsa paulista superaram as vendas em R$ 12,55 bilhões em janeiro. Em fevereiro, porém, até o dia 9, o saldo estava positivo em apenas R$ 1,5 bilhão.
De acordo com o estrategista, grande parte dos números deste começo de ano refletem um fluxo "passivo" e não estrutural, seguindo o movimento para outros emergentes, que está atrelado à tese de reabertura da economia da China e a perspectivas relacionadas à política monetária norte-americana.
"Não existe um 'call' positivo direcional para o Brasil", afirmou, observando que os investidores estrangeiros estão "mais neutros para um pouco negativo" em relação ao país. A avaliação vem a partir das conversas com 22 instituições, em cidades como Nova York, Miami e Boston, realizadas de 30 de janeiro a 3 de fevereiro.
"Provavelmente, a bolsa deve ficar meio de lado até se ter uma visão um pouco melhor do que o governo está propondo do lado fiscal" avaliou ele, ponderando, contudo, que se houver um fluxo muito forte para emergentes o Brasil acaba se beneficiando.
Além do fiscal, ele também citou incertezas relacionadas ao Banco Central, como a questão envolvendo a autonomia da autoridade monetária e o rumo da taxa Selic, além de discussões envolvendo meta de inflação, eventuais mudanças em reformas já aprovadas, entre outros.
"Quais serão de fato as ações a serem tomadas pelo governo e pelo Congresso, se vai ficar na retórica ou se de fato vai haver alguma mudança efetiva? Essa era uma pergunta que a gente recebia de forma constante", relatou sobre as reuniões com os investidores estrangeiros.
No caso específico do arcabouço fiscal, ele observou que há várias possibilidades, mas se for algo crível, que sinalize a estabilização do crescimento da dívida pública no médio prazo e depois queda, seria um "gatilho positivo" para a bolsa paulista.
"Isso é super relevante para a confiança, para o fluxo para o Brasil...Talvez essa era a maior preocupação nas reuniões", afirmou, explicando que a pauta impacta diretamente os juros futuros e o custo de capital das empresas, que tende a ficar mais elevado com a incerteza fiscal.
Sá afirmou que está "do lado mais cauteloso" do mercado, buscando ações de empresas atreladas a commodities, serviços de utilidade pública e varejo alimentar. "Não temos no nosso portfólio muitas ações vinculadas à queda de juros porque ainda temos em nossa visão bastante incerteza em relação a esse tema."
Caso saia um plano fiscal crível, ele disse que deve mudar a composição da carteira de ações para algo que aposte mais no alívio da curva de juros. E aposta que isso deve provocar uma mudança muito rápida de alocação no mercado — neste caso, tanto do investidor externo como do local. "Mas o fluxo maior que pode fazer a bolsa subir viria do investidor estrangeiro", observou. "E esse (fluxo) seria estrutural", acrescentou.