'Lançaremos o primeiro título sustentável no exterior'
Economia|Do R7
Apesar da imagem ruim do Brasil no exterior na área ambiental, a resposta à pandemia da covid-19 ampliou as linhas de crédito atreladas aos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (OBS), da Organização das Nações Unidas. Presidente da Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), Sergio Gusmão Suchodolski diz que relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontou o potencial das instituições financeiras de desenvolvimento para fomentar novos instrumentos de crédito com o carimbo da sustentabilidade. A primeira emissão de bônus de sustentabilidade, com DNA ambiental e social, está programada para ocorrer nos próximos dias pelo Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG). "Esperamos que, muito em breve, esse tipo de operação em escala se torne uma realidade e o mercado cresça", disse Suchodolski, que comanda também o BDMG, ao Estadão.
A covid-19 exige ainda mais a necessidade de mobilizar financiamento para a agenda de sustentabilidade, mas a grande maioria dos fluxos financeiros não está alinhada ao Acordo de Paris sobre mudanças climáticas. Está faltando dinheiro para o Brasil?
Não diria que está faltando recursos. Mas exige certa disciplina, algumas métricas de como será feito o uso do recurso para fazer os fluxos financeiros chegarem ao Brasil, sobretudo com uma gama de instrumentos diferentes. Na semana passada, a OCDE apresentou um relatório sobre o papel das instituições financeiras de desenvolvimento brasileiras no financiamento sustentável.
O que diz o relatório?
Nós estamos no radar e há grande interesse na nossa atuação na implementação das agendas de sustentabilidade na ponta, atuando como bancos de última milha.
O que é uma instituição de última milha?
São as instituições financeiras subnacionais, que é o caso do BDMG, as agências de fomento, os bancos públicos estaduais e regionais, que estão muito próximos do tema local, de financiamento dos municípios, micro e pequenas empresas. Eles têm um conhecimento do terreno mais profundo do que os bancos multilaterais, que têm suas sedes em Washington, Luxemburgo e Londres.
A covid-19 de alguma forma acelera esse processo, já que a sustentabilidade está atrelada ao meio ambiente e o social?
Sem dúvida. O que observamos em 2020 é não só uma atuação robusta de programas anticíclicos de todas essas instituições, mas vimos um aprofundamento de linhas e recursos que estão atrelados aos 17 OBS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável). É um anticíclico combinado com uma atuação na sustentabilidade.
O Brasil está com a imagem arranhada na área de sustentabilidade. Como atrair financiamento nesse cenário?
Os Estados têm certa autonomia no seu relacionamento internacional. Só em 2020, as instituições financeiras de desenvolvimento captaram mais de US$ 2 bilhões em operações de sete instituições que têm operações externas. No BDMG, captamos mais de R$ 2 bilhões com bancos multilaterais e agências de desenvolvimento internacionais. São números robustos e acreditamos que esse número vai crescer, inclusive não só de operações de crédito direto, mas de outros instrumentos que começam a ser operados.
De que tipo?
O BDMG está a poucos dias de fazer emissão de títulos sustentáveis no mercado internacional.
O que tem de diferente do que já foi feito?
Não é uma linha de crédito com um banco multilateral. É uma emissão de um título sustentável. Portanto, nós poderemos acessar um pool de investidores que vai além de bancos multilaterais. São investidores institucionais, fundos soberanos, que poderão investir nesse bond que será emitido fora do País. Estamos fazendo o registro dele em Nova York. É a primeira vez que um banco de desenvolvimento brasileiro vai fazer uma emissão desse tipo.
Nem mesmo o BNDES tinha feito uma emissão desse tipo?
Ele tinha feito uma emissão de títulos verdes, em 2017, em Luxemburgo e, recentemente, de um Letra Verde aqui no Brasil. Mas será a primeira vez que faremos uma emissão de um bond sustentável no exterior.
Qual a diferença?
O "green bond" pega só o aspecto ambiental (o dinheiro levantado costuma ser carimbado para o uso específico em determinado projeto). O "sustainable bond" abrange o social e ambiental. A captação é mais ampla. Estamos na reta final para a emissão de US$ 50 milhões. Já temos um grupo de investidores que fará esse investimento nos EUA e na Europa. Esse é um patamar de entrada, porque é nossa primeira emissão. Numa segunda e terceira emissões, pretendemos fazer na faixa de US$ 100 milhões, US$ 150 milhões.
Que tipo de projetos esse dinheiro vai financiar?
Desde projeto de energia renovável, saneamento, tratamento de água, iluminação pública, micro e pequenas empresas, projetos de empreendedoras mulheres.
Quanto o País pode atrair desses recursos mesmo com a imagem ruim?
Precisamos desmistificar e apresentar o que estamos fazendo no terreno para além dos discursos inflamados de lado a lado. É óbvio que existe um desafio ambiental e social muito grande no Brasil, que é um País cheio de contraste e precisamos mobilizar recursos justamente para avançar na agenda e dar conta dos desafios. É importante apresentarmos os projetos de maneira bem pragmática e concreta. Esperamos que muito em breve esse tipo de operação em escala se torne uma realidade e o mercado cresça. Vamos dar uma resposta.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.