Manutenção do dólar em baixa vai frear disparada da inflação
Moeda americana desabou mais de 15% neste ano, guiada por salto da taxa Selic e entrada de investidores no Brasil
Economia|Alexandre Garcia, do R7
O drama de deparar com preços mais elevados a cada ida ao supermercado ou posto de combustíveis pode estar com os dias contados. O alívio no bolso, segundo economistas, deve ser motivado pela manutenção do dólar em um nível abaixo de R$ 5.
Desde a virada do ano, a moeda americana já desabou 15% até o pregão de quinta-feira (7), de R$ 5,57 para R$ 4,71. A queda da divisa ante o real é motivada pela entrada de investidores estrangeiros no Brasil em meio à guerra na Ucrânia e pelo salto da taxa básica de juros.
“O dólar mais baixo ajuda a reduzir o custo para importações, o que pode deixar mais baratos os importados ou aqueles [produtos] que usam matérias-primas que vêm de fora”, avalia Rafael Marques, CEO da assessoria de investimentos Philos Invest.
De acordo com João Beck, economista e sócio da BRA, cada queda de 10% reduz a inflação em 1 ponto percentual. "O impacto ocorre principalmente no setor de alimentos", destaca ele ao mencionar o papel essencial da divisa no preço de commodities (matérias-primas com cotação internacional) e derivados, como carnes, laticínios e pães.
Jansen da Costa, sócio-fundador da Fatorial Investimentos, explica que a queda no valor dos produtos importados é determinante para aliviar a alta dos preços. “Empresas que normalmente têm custo com matéria-prima em dólar e aquelas que precisam de componentes importados são diretamente afetadas [pela variação cambial], e seus produtos tendem a ficar mais baratos", afirma.
Apesar do cenário mais favorável ao real, as quedas recentes do dólar ainda não se refletiram no bolso das famílias. Somente em fevereiro, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) disparou 1%, a maior alta para o mês em sete anos, e manteve a inflação oficial acima dos 10% no acumulado dos últimos 12 meses.
“Em fevereiro, o grupo de alimentação sofreu impactos dos excessos de chuvas e também de estiagens que prejudicaram a produção em diversas regiões de cultivo no Brasil", ressaltou Pedro Kislanov, gerente responsável pela pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) na divulgação dos dados.
Futuro incerto
Ainda que a sequência de quedas do dólar ante o real seja uma realidade, há fatores adversos que podem elevar a cotação da moeda americana novamente acima dos R$ 5, movimento que limitaria a alta da inflação em ritmo menor.
Ao reforçar que as recentes variações da divisa foram estimuladas pelo aumento da taxa Selic para o patamar de 11,75% ao ano, Costa ressalta que a decisão do Banco Central dos Estados Unidos de elevar os juros pode atrair de volta os investidores que passaram a apostar no Brasil.
Outra questão que pode acarretar a reversão da valorização do real envolve o conflito entre Rússia e Ucrânia, que ajudou a balança comercial brasileira a atrair dólares diante da valorização das matérias-primas após sanções impostas contra insumos russos.
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"Dependendo do formato que essa guerra continuar, as sanções podem persistir e manter o preço das commodities e a inflação mundial em alta. Como consequência, isso pode ocasionar uma atuação mais forte do Banco Central dos EUA para conter os preços com a elevação dos juros", reforça Marques, da Philos Invest.
Mesmo diante da queda recente, as últimas expectativas do mercado financeiro, consultado pelo BC (Banco Central), indicam que o dólar fechará 2020 negociado a R$ 5,25. Para Beck, no entanto, os dados apresentados semanalmente não devem ser usados para obter uma visão futura da moeda americana.
"O valor presente do câmbio já incorpora os fluxos futuros esperados. Já no Boletim Focus, é considerada uma estimativa baseada no valor presente da moeda acrescida da taxa de juros esperada no período de análise", explica o economista.