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Por que os cheques de papel ainda são tão usados nos Estados Unidos?

Medo de fraudes, facilidade de emissão e fuga das taxas são alguns dos motivos que afastam alguns do pagamento por crédito

Economia|Ron Lieber, do The New York Times


É difícil evitar dores de cabeça – ou fraude – quando se é obrigado a pagar usando papel e caneta Martin Haake/The New York Times

A Target, rede de lojas de varejo dos Estados Unidos, deixou de aceitar cheques pessoais como forma de pagamento neste mês de julho, o que suscita a seguinte pergunta: por que demorou tanto?

Os casos de fraude com cheques aumentaram mais que o dobro nos anos recentes. Nos Estados Unidos, cada um deles custa às empresas pelo menos US$ 1 para ser processado. Muitos adultos jovens nem sequer assinaram um cheque na vida.

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Mas se você não o usa há anos e o considera uma espécie de medalha de honra, isso pode dizer muito sobre onde você mora e pelo que paga. Em muitas indústrias, o cheque ainda é uma forma popular de pagamento, e, em alguns casos, é exigido.

Segundo dados de pesquisas com consumidores do Banco da Reserva Federal de Atlanta, que acompanha o percentual de pagamentos que os consumidores efetuam com cheque, os seguintes setores são os que mais os recebem: os contratantes, como eletricistas e encanadores, recebem 25 por cento do pagamento dessa forma. As organizações de caridade e religiosas ocupam o segundo lugar, com 22 por cento. Os locadores, as autoridades tributárias do governo e as empresas de serviços profissionais também recebem um percentual de dois dígitos de pagamentos com cheque.


Em muitos contextos comerciais ele é obrigatório. Os leitores do “The New York Times” escreveram para reclamar que têm de pagar várias coisas com cheque, como as taxas da associação de moradores, cortes de cabelo, concursos de cães ou a ocasional apólice de seguro em longo prazo.

Algumas pessoas gostam que seja assim, embora as razões variem muito. As emoções influenciam, bem como as taxas. Outro fator é o medo.


Em resumo, é complicado, por isso os cheques não vão desaparecer em um futuro próximo. Estas são algumas das razões principais:

Aperto de mão (ou abraço)

“O cheque, na verdade, é um significante cultural fundamental do comércio baseado em relacionamentos. É quase como um aperto de mão”, explicou Scott Anchin, vice-presidente sênior de risco operacional e política de pagamentos da Associação Independente de Banqueiros da América, que quer reduzir o número de pagamentos em cheque.


Um exemplo é a arrecadação da igreja. Sem dúvida, você pode preencher um formulário e pagar com cartão de crédito. Mas há todo um ritual associado ao ato de assinar um cheque na hora. “Quero sentir a ação de doar”, afirmou Anne Thomas, de 65 anos, que mora em State College, na Pensilvânia, onde trabalha e oferece ajuda como voluntária em várias igrejas.

Outro exemplo são os presentes. Enviar dinheiro por intermédio de uma plataforma de pagamentos digitais como a Venmo não é, de fato, igual a um abraço afetuoso – mesmo com emojis. E usar cartões-presente pode ser muito incômodo: se o que você quer é enviar um cartão pelo correio com um presente monetário, talvez sinta que a melhor opção é o cheque.

Medo

Para cada pessoa que foi vítima de alguma fraude com cheque, há outra que se deparou com criminosos on-line.

Uma experiência com uma pessoa mal-intencionada no Venmo ou em algum serviço de pagamento semelhante, como o PayPal ou o Zelle – e a batalha consequente para recuperar o dinheiro – pode ser suficiente para que as pessoas decidam voltar a usar o cheque. Além disso, dado o volume elevado de violações de segurança, muita gente evita guardar as informações de sua conta bancária em um site qualquer se o único benefício é facilitar o pagamento de taxas algumas vezes ao ano.

Se você não tem nenhuma experiência com os pagamentos on-line, o medo de adicionar um zero a mais ou que um pagamento não seja processado porque você clicou no lugar errado pode parecer pior que os incômodos e o risco de fraude associados aos cheques.

Simplicidade

Nesta categoria estão as inoportunas taxas da associação de moradores. Imagine que os próprios residentes são os responsáveis pela administração da associação e que este ano você teve a má sorte de ser o tesoureiro.

Você tem um trabalho em tempo integral, além de família e amigos com quem gosta de se reunir. Também tem hobbies, e nenhum deles inclui investigar tudo sobre os sistemas de pagamentos eletrônicos do único banco local disposto a abrir uma conta para sua associação de moradores sem cobrar comissões ou investigar se há outras opções.

Afinal, sua associação de moradores hipotética conta só com dez membros. Por isso o mais simples é que paguem com cheque.

A comissão de três por cento

Rebecca Symmes, de 71 anos, tinha acabado de se mudar para Delaplane, na Virgínia, com a intenção de se aposentar e arrumar seu terreno. Para isso, precisava de podadores, tratores, trituradores e outros equipamentos.

Não era um problema para os fornecedores locais que ela pagasse com cartão de crédito, o que lhe daria milhas aéreas – mas queriam cobrar uma comissão. “No fim das contas, isso equivale quase ao custo de uma passagem aérea”, observou ela. Por isso, preferiu assinar cheques, que não custam nada.

“O que muitos usuários de cartões de crédito e débito não sabem é que o fornecedor é quem paga por seus pontos de recompensa para viagens e reembolsos em dinheiro com as comissões cobradas pelas empresas que processam os pagamentos”, disse Laura Bair, de 61 anos, cabeleireira de Santa Fé, no Novo México. Depois de um episódio particularmente desagradável com uma das empresas processadoras, Bair cortou todas as relações com os cartões. Agora, só aceita dinheiro ou cheques.

O empurrãozinho de US$ 1,50

No condado de Queen Anne, em Maryland, para processar um pagamento com cartão de crédito é cobrada uma taxa fixa de 2,95 por cento. Se você quiser aproveitar uma opção que o condado chama de E-checks (cheques eletrônicos) para efetuar um pagamento direto de sua conta bancária, o custo é de US$ 1,50.

Mas pagar com um cheque tradicional não custa nada além do selo postal e do valor que você atribui ao tempo necessário para encontrar seu talão de cheques e um envelope.

E o que dizer do encargo adicional para ajudar as empresas emissoras de faturas a evitar o uso de papel e as comissões por cartões de crédito? Michael A. McCreary, diretor e gerente de operações da Pure Property Management, serviço de administração de empresas, em Atlanta, culpa os fornecedores de serviços financeiros pelo aumento nas tarifas cobradas sobre empresas como a sua. Mas também entende o motivo dessas cobranças, e seus clientes pagam US$ 2,95 para fazer pagamentos eletrônicos diretamente de sua conta bancária: “Embora muita coisa possa ser controlada por software, é necessário que existam seres humanos envolvidos, o que gera custos para os dois lados.”

Vantagem (e quem a tem)

Se tem dinheiro e quer doá-lo, você é quem o envia, e as instituições de caridade e as congregações religiosas, se puderem evitar, não vão impor restrições. “Nunca vamos dizer não às pessoas como fazem na Target. O custo de processar e depositar o cheque é menor do que o custo de não receber a doação”, comentou Rick Cohen, diretor de comunicações e operações do Conselho Nacional de Organizações sem Fins Lucrativos.

Os contratantes podem ser teimosos. Se você está instalando fiações elétricas como autônomo há 30 anos, e os cheques funcionam bem, por que se preocupar com o Venmo? E quando os encanadores chegam para consertar seu vaso sanitário entupido em seu apartamento com um único banheiro, quem manda são eles, não você.

Depois, considere profissionais como a que Paul Buckley, de 58 anos, emprega. Ele tem cerca de 20 mil metros quadrados de vegetação selvagem no condado de Bucks, na Pensilvânia, e uma jardineira dedica algumas horas por semana para ajudá-lo a manter o terreno. Buckley escreveu em um e-mail que essa pessoa não sabe nada sobre o Venmo ou a Zelle, nem se interessa em saber.

Antes, ela só aceitava dinheiro, o que implicava uma ida ao banco para quem queria pagar por seu serviço. “Por isso, quando ela por fim concordou em aceitar cheque, foi um alívio”, disse Buckley.

c. 2024 The New York Times Company

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