Retração do PIB dos EUA não deve preocupar Brasil e o mundo
Consumo acelerado mantém risco de recessão longe do país, mas inflação e juros prolongam receio quanto a 2023
Economia|Camila Nascimento*, do R7
O PIB (Produto Interno Bruto) dos Estados Unidos registrou retração de 1,4% no primeiro trimestre, informou o Escritório Oficial de Estatísticas do Departamento de Comércio, na semana passada. Essa queda não deve ser motivo de preocupação para o Brasil nem aponta para uma recessão global.
Por enquanto, o consumo acelerado deve assegurar o crescimento da economia norte-americana. A recessão econômica não é uma realidade, apesar da inflação e dos juros altos, que devem se tornar pontos de atenção em 2023.
Nesta quarta, o Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos, elevou a taxa básica de juros para o intervalo entre 0,75% e 1%, uma alta de 0,5 ponto percentual, justificando o salto da inflação no país. O Fed não fazia um aumento dessa magnitude desde maio de 2000.
A queda na atividade econômica do país foi uma surpresa, já que o PIB teve um forte crescimento (6,9%) no último trimestre de 2021. Essa foi a primeira contração desde o início da pandemia, em 2020.
Queda não deve ameaçar economia americana, nem a global
Uma das principais causas para o recuo do PIB foram os casos de Covid-19, que voltaram a subir no início de 2022, por conta da variante Ômicron. “As restrições aumentaram, o que afetou as cadeias de produção”, aponta o professor Joelson Sampaio, economista da FGV.
Outros fatores pontuais também contribuíram para o resultado do PIB, segundo o economista-chefe do Banco Original, Marco Caruso. “Houve um aumento expressivo nas importações dos Estados Unidos, o que contabilmente diminui esse indicador. Mas não é necessariamente um desdobramento negativo, mostra ainda uma economia pujante, que está demandando produtos de fora. Tivemos uma queda nos estoques, que são voláteis”, analisa.
Mesmo com um número negativo, os Estados Unidos não dão sinais de recessão, de acordo com Caruso. Principalmente porque o desemprego está em níveis baixos, o número de pedidos iniciais de auxílio-desemprego caíram em 5.000, ficando em 180.000 na última semana de abril.
Sampaio lembra, ainda, que os indicadores de consumo das famílias e outros investimentos em capital fixo têm aumentado, o que deve contribuir para a alta do PIB no fim do ano. “Esses fatores afastam um cenário de estagflação. A expectativa é que a economia norte-americana cresça, mesmo que menos, por causa da guerra entre Rússia e Ucrânia”, conclui.
A projeção do FMI (Fundo Monetário Internacional) é de que o PIB dos Estados Unidos cresça 3,7%, acima da média global.
Efeitos para o Brasil
Como os EUA são uma das principais economias do mundo, dificilmente os indicadores norte-americanos deixam de impactar outros países. Por isso, uma possível desaceleração da economia do país pode afetar o Brasil. “Um PIB americano em queda puxa para baixo a economia global”, afirma Caruso.
“Temos que pensar, ainda, que a China, outro grande consumidor global, não serve de contrabalança para esse PIB, porque também está perdendo fôlego no seu crescimento. A situação desenha um PIB global mais fraco, inclusive para o Brasil, afetado via comércio internacional”, completa o economista.
Uma possível queda do PIB dos Estados Unidos e do restante do mundo mexeria com os mercados, porque os investidores tendem a priorizar países mais seguros. “Em um mundo em desaceleração, o fluxo de capitais e os investidores acabam sendo muito mais seletivos, eles olham mais para os países com economias e finanças nos trilhos. E os desafios afloram, principalmente para emergentes, como o Brasil, considerados locais com mais risco”, analisa Caruso.
Inflação e juros altos trazem alerta para o futuro
Segundo Caruso, a queda do PIB por si só não apresenta um risco para o mercado pujante dos Estados Unidos. Contudo, somado a um cenário de inflação alta e à necessidade do aumento dos juros para controlar os preços, é preciso ficar atento aos riscos no futuro. “A probabilidade de uma recessão, fazendo contas e usando modelos do próprio do Fed (Federal Reserve), pode estar perto dos 20% para daqui 12 a 18 meses”, afirma o economista.
“Não se vê sinais de crise. Mas essa é uma discussão que já está no mercado financeiro, que olha para os desafios de diminuir a inflação, que passou dos 8%, ficando bem longe do teto (2%). Isso exige uma considerável elevação dos juros, o que não se vê desde a crise do subprime em 2008, com essa taxa caminhando para 3%. Quando os juros americanos sobem muito rapidamente, as chances de recessão aumentam”, ressalta o economista.
O aumento desenfreado dos preços traz ainda mais um risco, “a economia pode entrar numa espiral de inflação e salários altos. A disparada dos bens e o pleno emprego traz salários cada vez mais altos. Para quebrar isso, o Fed vai ter que apertar os juros. A grande pergunta é: até onde vai essa taxa?”, complementa.
Além disso, ele observa que, historicamente, poucos ciclos acompanhados de aumento nas taxas de juros não resultaram em recessão, e que quando o desemprego está baixo, o desafio dos juros de segurar a inflação é maior.
*Estagiária do R7, sob supervisão de Ana Vinhas