Renato Lombardi revisita sua trajetória e revela bastidores de uma vida dedicada ao jornalismo: ‘Quem mantém o repórter vivo são as fontes’
Em entrevista exclusiva ao R7, comentarista de segurança da RECORD relembra jornada premiada e revela o que gosta de fazer quando está longe das câmeras
Entrevista|Giovana Sobral, do R7

Dizem que, no jornalismo, o caminho importa mais que a chegada. E Renato Lombardi, do Balanço Geral, sabe bem disso. De imigrante italiano a um dos comentaristas mais queridos da TV brasileira, ele construiu sua história passo a passo, sempre com a notícia como guia.
Nascido em Nápoles, na Itália, e radicado no Brasil desde 1950, ano em que a televisão começava a ganhar espaço, desde jovem, ele sonhava em trabalhar. Depois de uma longa caminhada, marcada por desafios, oportunidades e muito aprendizado, encontrou o seu verdadeiro propósito.
Formado em jornalismo pela Universidade de São Paulo (USP), começou no Notícias Populares, depois foi repórter especial de O Globo e trabalhou por 27 anos em O Estado de S. Paulo, sempre cobrindo as áreas de segurança e Justiça.
Lombi, como é carinhosamente chamado pelos colegas da RECORD, tem em seu currículo importantes prêmios, como Esso de Reportagem, o Prêmio Jornal O Estado de S. Paulo de Jornalismo e o internacional Príncipe das Astúrias (Espanha).
Hoje, com uma carreira consolidada, ele continua realizando o sonho que o motivou desde o início: informar com paixão e compromisso. Ao R7 Entrevista, ele compartilha sua trajetória.

R7 Entrevista - Qual foi o pontapé inicial para decidir que queria ser jornalista?
Renato Lombardi - Com 13 para 14 anos eu queria trabalhar e nós tínhamos poucos amigos aqui no Brasil [Lombardi nasceu em Nápoles, na Itália e veio para o Brasil com a família aos 5 anos de idade em um navio de imigrantes]. Um casal italiano amigo da família, tinha vários filhos, e um deles trabalhava em um jornal chamado Última Hora, que hoje não existe mais. Ele era responsável pelo setor de tráfego do jornal, dos carros, e eu vivia falando que eu queria trabalhar, só que eu tinha tido uma experiência ruim em uma marcenaria com um amigo. Fiquei um dia lá, falei: ‘Não, isso aqui não é pra mim, obrigado, mas eu vou cair fora’.
Foi então que minha mãe pediu para o filho de uma amiga me arrumar um emprego, contou que eu estava louco para trabalhar, e dias depois comecei como office boy no jornal.
Lembro muito que nessa época eu usava a calça curta, para quem não sabe, antigamente a gente usava a calça curta e sapato com meia. Fui de ônibus com a minha mãe, da Vila Medeiros, em São Paulo, descemos o Largo São Bento, a escadaria que tinha, agora nem existe mais, no viaduto de Santa Ifigênia, e fomos ao jornal. Quando eu cheguei lá, acertei as coisas para trabalhar e me deram duas fardas: uma ficava no jornal, outra eu levava em casa, que era a farda cáqui e uma gravata azul escura. Aí eu perguntei: ‘Aqui a gente vai usar calça comprida?’. Eu nunca tinha tido calça comprida, e foi a partir da aí que eu comecei a trabalhar na Redação.
Eu sempre fui superantenado, eu via os repórteres, eu servia jornal, ia comprar lanche, ia descontar cheque no banco no dia do pagamento... Quando eu vi aquilo, eu falei: ‘É isso aqui que eu quero, ser repórter’. Alguns repórteres lá eram muito legais e começaram a me ensinar as coisas, de vez em quando, eu saía com eles para reportagem.
R7 Entrevista - E como foram os primeiros passos na reportagem?
Renato Lombardi - Quando fiz 18 anos, surgiu uma vaga para trabalhar em uma sucursal do jornal em Santo André (SP), um dos que tinham me ensinado, que depois virou desembargador, o Alexandre Moreira Germano, me disse: ‘Olha, eu vou ser diretor da sucursal de Santo André, todo mundo foi demitido, tá querendo ir?’. Foi meu primeiro emprego. Nessa época, não havia necessidade de ter faculdade.

R7 Entrevista - Além da sólida carreira no jornal, você também fez rádio e televisão. Tem um favorito?
Renato Lombardi - Hoje, o meu favorito é a televisão, mas já foi o jornal. Eu adoro escrever, ganhei Prêmio Esso, fiz centenas de reportagens e adorava fazer matéria especial, do dia a dia, eu que marcava as entrevistas, eu tinha fontes. Estudantes de jornalismo me perguntam: ‘Por que que você resolveu ficar nesse setor de polícia, de segurança e justiça?’ Aí eu digo que é porque quem mantém o repórter vivo, diferenciado, são as fontes. Eu comecei a criar fontes no judiciário, na polícia, tinha um volume tão grande de fontes... Eu sempre adorei, mas aí apareceu o rádio.
“Eu adoro escrever, ganhei Prêmio Esso, fiz centenas de reportagens e adorava fazer matéria especial, do dia a dia, eu que marcava as entrevistas, eu tinha fontes"
Eu fazia ao mesmo tempo, o rádio e o jornal, gravava tudo por telefone, carregava um gravador imenso... Um dia fui chamado por uma diretora da TV Bandeirantes para fazer uns comentários. Insistiram, aí eu comecei a fazer televisão e gostei. Você acaba abrindo seu leque, mas em 2004 eu resolvi pedir demissão do jornal. Depois de 27 anos, após já ter feito tantas coisas, inclusive, fui fazer faculdade na ECA (Escola de Comunicação de Arte).

R7 Entrevista - Como você chegou ao Balanço Geral?
Renato Lombardi - Eu estava na TV Cultura, até que um dia o Ederson Graneto, que é um colega que conhecia do Estadão e trabalhava lá, falou que tinham pedido meu telefone na RECORD. No dia seguinte, recebi uma ligação do Ailton Nasser dizendo que o Douglas Tavolaro perguntou se eu tinha interesse. Eu vim [para a RECORD] no dia seguinte e entrei no ar como convidado no programa que a Luciana Oliveira fazia direto da Redação. Isso foi em uma quarta-feira. Na segunda, eu já estava trabalhando aqui e estou desde agosto de 2009.
R7 Entrevista - Com a chegada de um novo apresentador à bancada, como foi o processo de adaptação e sintonia entre vocês?
Renato Lombardi - A transição demora um pouco, né? Afinal de contas, trabalhei dez anos com a mesma pessoa, tinha um ritmo. Com o [Eleandro] Passaia foi diferente porque quando eu trabalhei aqui pela primeira vez, não trabalhei com ele. Eventualmente, nas férias do [Reinaldo] Gottino, ele ficou durante 15 dias e cada apresentador tem uma linha. A gente demorou um pouquinho, mas estamos superafinados, eu acho muito legal, porque a gente lida quatro horas e meia com notícias, né? Você lida quatro horas com a violência, de vez em quando a gente dá uma “fugidinha” da violência para aliviar um pouco mais, está sendo ótima a parceria.
“Estamos superafinados, eu acho muito legal, porque a gente lida quatro horas e meia com notícias, né?”
R7 Entrevista - A vida mudou muito na frente das câmeras?
Renato Lombardi - Um dia, um desembargador falou comigo: ‘Ué, você mudou de nome? Minha mulher te assiste na televisão e disse que você se chama Lombi’. A Fabíola Reipert me apelidou assim.
Um dia, eu estava almoçando e vi uma senhora com um garoto, ele estava olhando, eu perguntei se estavam precisando de alguma coisa. E ela respondeu que ele queria uma foto, mas estava esperando eu terminar o almoço. Eu falei: ‘Não, vem cá’.
A gente até brinca no A Hora da Venenosa, com a Fabíola [Reipert]. Quando o artista precisa da mídia, ele aparece em todo lugar. Depois, ele não quer dar entrevista? Bobagem isso, amanhã muda, se você deixa de ser artista, jornalista, de aparecer na televisão, de falar no rádio... A gente é o que é.
R7 Entrevista - Quem é a sua grande inspiração no jornalismo?
Renato Lombardi - No jornalismo escrito, tinha uma pessoa que eu conheci com 14 anos na Redação do jornal e ele tinha um valor incrível, porque ele era jornalista policial, eu me inspirei muito nele, porque ele me ensinou muita coisa, pena que ele já morreu faz algum tempo. Ele se chamava Ramão Gomes Portão. No rádio, eu tenho uma admiração muito grande por duas pessoas que já nos deixaram: uma é José Paulo de Andrade e o outro é o Salomão Ésper. Às vezes, você é muito inteligente, mas não é culto, ou você é culto e não é inteligente, ele alinhava as duas coisas. O José ensinava a combater com dignidade, sem massacrar, sempre leal. Quando eu faço uma crítica, eu faço uma crítica construtiva, quando eu defendo, eu defendo.
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R7 Entrevista - Você esteve presente em grandes coberturas do mundo policial. Qual foi a que mais te marcou?
Renato Lombardi - O incêndio do Joelma (1974) eu não esqueço nunca mais. Nós estávamos embaixo, tudo pegando fogo, as pessoas desesperadas pulando, eu estava com o cinegrafista olhando para cima, quando pulou uma pessoa e caiu a menos de 10 metros da gente. Isso foi gravado na minha mente.
Cobri todos os grandes sequestros de São Paulo, eu chorava junto. Um publicitário, uma vez, na entrevista que ele foi dar, falava para mim que no cativeiro ele contava os grãos de arroz do prato, um a um, para poder passar o tempo. Então é uma coisa que realmente é bem marcante e significante. Entrevistei todo tipo de gente. A matéria que eu ganhei o Prêmio Esso foi sobre um contador pobre, morador na zona norte de São Paulo. Descobri que eles fraudavam o INAMPS. Então, um corte no dedo virava uma cirurgia de apêndice. Em cima disso, eu levantei uma grande matéria e acabei ganhando o Prêmio Esso.
O incêndio do Joelma (1974) eu não esqueço nunca mais. Nós estávamos embaixo, tudo pegando fogo, as pessoas desesperadas pulando, eu estava com o cinegrafista olhando para cima, quando pulou uma pessoa e caiu a menos de 10 metros da gente. Isso foi gravado na minha mente"
R7 Entrevista - Qual é o sentimento de receber um reconhecimento tão importante como o Prêmio Esso?
Renato Lombardi - Foi legal porque hoje não tem mais. E eu levantei [as informações] e coordenei tudo. Tinha um grupo de repórteres que também ajudaram a fazer os levantamentos, mas eu que fiz a reportagem, foi muito legal. É uma pena que não tem mais, porque era inspirador. Eu ganhei o primeiro de reportagem, mas também tinha o prêmio de jornalismo, era por categoria.
R7 Entrevista - Como jornalista experiente, acostumado ao formato tradicional da TV policial, como sentiu a transição para o podcast Arquivo Vivo? Quais as principais diferenças no jeito de contar as histórias e se conectar com o público?
Renato Lombardi - Foi uma novidade muito boa, eu percebi que quando trazíamos determinadas autoridades, as pessoas chegavam a ficar nervosas. A Ivalda Aleixo, que é diretora do DHPP, chegou aqui e disse que estava nervosa. Mas como, nervosa? Ela, todos os dias, encara um criminoso. Agora, a gente está desenvolvendo no Balanço Geral matérias que eu cobri durante esses anos todos. A gente já fez a primeira, sobre a morte de Aída Curi, que foi no Rio de Janeiro e vamos fazer [em breve] a do mafioso Tommaso Buscetta, que também cobri a prisão dele.
R7 Entrevista - Hoje você também é uma referência nas redes sociais, com milhares de pessoas acompanhando e interagindo com seus conteúdos. Como é equilibrar a carreira de jornalista com esse papel de influenciar?
Renato Lombardi - Eu deveria cuidar um pouco mais [das redes sociais], tenho um milhão e 100 mil seguidores, mas eu não tenho tempo para cuidar. Às vezes eu respondo [os seguidores], nem todas as vezes. Recebo 500, 600 mensagens, não dá pra responder todo mundo, mas quando eu posso, eu atendo.
R7 Entrevista - Quem é Renato Lombardi quando está fora do ar?
Renato Lombardi - Eu sou uma pessoa igual a qualquer ser humano. Qualquer lugar, cidade e país que eu vá, sou reconhecido. É muito gratificante quando você vê reconhecimento dessa maneira. Eu gosto de viajar, ir a restaurantes. Eu também fiquei viciado em séries. Vejo todo tipo de séries e documentários policiais. Já vi uma parte das coreanas, sul-africanas, polonesas e, de vez em quando, italianas, mas gosto mais para ouvir a língua.
R7 Entrevista - Que conselho você daria para os mais jovens que também sonham em seguir carreira no jornalismo policial?
Renato Lombardi - Eu sempre costumo dizer que você não pode ser “mais um” no jornalismo. Mais um é fazer igual. O jornalista não tem sábado, domingo, feriado... Qualquer profissão é assim, mas no caso do jornalismo, se a pessoa realmente quer ser jornalista, então vai ter que se aplicar completamente. Esqueça de muitas coisas para que você não possa ser “mais um”. Do contrário, você estaciona e não sai daquilo.
“Eu sempre costumo dizer que você não pode ser “mais um” no jornalismo. Mais um é fazer igual. O jornalista não tem sábado, domingo, feriado... Qualquer profissão é assim, mas no caso do jornalismo, se a pessoa realmente quer ser jornalista, então vai ter que se aplicar completamente"
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