Autor de foto famosa na praça da Paz Celestial diz que clique 'foi sorte'
Imagem do homem desarmado que ficou na frente de uma coluna de tanques do Exército chinês se transformou em símbolo do poder das fotografias
Internacional|Da EFE
Jeff Widener, autor da famosa foto do "Homem do Tanque", no massacre na praça da Paz Celestial, em Pequim (China), contou à Agência Efe que a imagem, na realidade, foi produto do acaso, embora ele reconheça "a influência que teve na percepção que as pessoas têm do mundo".
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"Muitos a consideram um ícone. Eu considero que 'foi sorte'. Eu estava no lugar errado na hora certa", lembra Widener, que viajou para Pequim a partir de sua posição fixa, em Bangcoc, para cobrir os protestos estudantis contra a corrupção.
A imagem do homem desarmado que ficou na frente de uma coluna de tanques do Exército chinês se transformou "em uma amostra de que as fotografias podem ser muito poderosas", comenta o fotógrafo americano, por e-mail, três décadas depois.
Era manhã de 5 de junho, quando Widener conseguiu escalar, graças à "inestimável ajuda de um estudante chinês", ao sexto andar do Hotel Beijing para tirar a simbólica foto a cerca de 200 metros da praça, até então sob o controle dos militares.
"Uma imagem dessa", opina, "teria o mesmo impacto que há 30 anos", apesar do fato de que "agora há tantas pessoas tirando todo tipo de foto que acabam saturando". "Vivemos em um constante bombardeio de imagens que insensibiliza os sentidos", afirma.
Aos 62 anos, o autor do "Homem do Tanque", pelo qual foi finalista dos prêmios Pulitzer, em 1990, admite que nem mesmo em seus melhores sonhos, achava que uma foto sua poderia provocar reações tão maciças.
"A fotografia mudou minha vida e continua a inspirar muitas pessoas, exceto na China, onde ainda é proibida", ressalta.
Widener afirmou que ainda hoje a imagem "dá nos nervos do governo chinês".
"Quando publico no Instagram, recibo muitos comentários negativos de autoridades chinesas, embora também haja muitos comentários positivos de pessoas que me apoiam", disse.
Sobre aqueles dias, o fotógrafo lembra que recebeu a incumbência da agência "Associated Press" de cobrir os protestos como algo "incrível", embora tenha sentido "medo" que o resultado se tornasse fatal.
O americano fotografou as discussões inflamadas dos estudantes e tirou fotos da estátua da Deusa da Democracia, construída sobre uma estrutura metálica revestida de poliestireno e papel machê.
Mas, depois de uma semana, Widener começou a ter a sensação de que algo ruim iria acontecer.
"Acho que a maioria dos jornalistas tem um sexto sentido quando o perigo se aproxima", diz ele, sobre os dias que antecederam o massacre.
Ele lembra de pessoas indo a pé até os tanques, falando palavras de ordem, com o megafone nas mãos e atacando os tanques: "Aquilo não ia acabar bem. Na noite de 3 de junho, recebi o impacto de uma pedra na minha cabeça, e temi muito pela minha vida", narra o fotojornalista.
"Felizmente, a câmera absorveu o impacto e eu fui capaz de me salvar. Tudo parecia surreal, nada me surpreendia mais", acrescenta.
Widener pensou então que o melhor seria se retirar, até que no dia 5, finalmente conseguiu entrar no Hotel Beijing para fotografar o "Homem do Tanque", "quase por engano e apesar de estar ferido e doente".
"O que o governo chinês deveria fazer? A situação estava fora de controle, com milhares de manifestantes ameaçando com vandalismo. Os estudantes tiveram a oportunidade de obter algumas concessões menores, mas eles não foram organizados. Acho que foram longe demais", comenta o fotógrafo.
"Além disso, o povo chinês nunca havia experimentado conceitos como a liberdade e não tinha experiência com diplomacia, não estou justificando os assassinatos, mas, na minha opinião, canhões de água e gás lacrimogêneo só poderiam ter piorado a situação. Admiro a coragem daqueles chineses, mas sua falta de experiência em negociar condenou seus sonhos", concluiu.