Brasileira que resgatou mais de 150 civis na Ucrânia mostra itens coletados na guerra
Clara Magalhães Martins ajudou pessoas a cruzarem as fronteiras do país e levou alimentos e remédios para regiões sob ataque
Internacional|Letícia Sepúlveda, do R7
Assim que a guerra na Ucrânia começou, a brasileira Clara Magalhães Martins, radicada na Alemanha, fez um grupo no Telegram para ajudar os brasileiros que tentavam fugir da situação de perigo. Em seguida, alugou um carro para ir até a fronteira ucraniana com a Polônia para resgatar as pessoas com quem entrou em contato. Após três meses de conflito, ela está de volta ao Brasil com artefatos da guerra em sua bagagem e o objetivo de fazer uma conscientização sobre a situação no leste europeu.
“É importante que as pessoas entendam como essa guerra também nos prejudica, mesmo estando longe ela influencia nos preços altos que enfrentamos e até nas nossas eleições. Eu acho que os artefatos que trouxe ajudam a aproximar essa realidade”, explica em entrevista ao R7.
Apenas três dias após o começo da invasão russa, a brasileira vivenciou o caos na fronteira da Ucrânia com a Polônia em meio às filas de carros com mais de 50 Km. Ela conta que levou 36 horas para conseguir fazer seu primeiro resgate de refugiados.
“Milhares de pessoas estavam tentando sair, os centros de refugiados estavam lotados e eu estava sem internet para falar com as pessoas que estava tentando encontrar", diz Clara.
Em meio ao terror do conflito, muitos pedidos de resgate começaram a surgir e Clara criou a Frente Brazucra ao lado de outros brasileiros. O projeto ajuda a retirar civis das zonas de conflito, compartilhar rotas de fuga, organizar doações de alimentos e remédios e arrecadar fundos. O grupo resgatou mais de 150 pessoas de várias nacionalidades e levantou R$ 200 mil em uma vaquinha criada na internet.
Os resgates passam pelo exercício de se colocar no lugar de quem tentava desesperadamente sair do país invadido. Nos dez primeiros dias de conflito mais de 2 milhões de pessoas cruzaram as fronteiras ucranianas.
No terceiro dia da guerra, Clara entrou na Ucrânia com seu carro cheio de alimentos e remédios para doações, mas esse era só começo da sua trajetória de ajuda humanitária.
“O primeiro dia foi muito doído para mim, tive que aprender muita coisa e muito rápido. Eu comecei a entender que o pessoal que estava perto da fronteira não poderia pegar o tanto de doações e medicamentos que queriam, porque o intuito do nosso grupo é ajudar o maior número de pessoas possível”, explica.
“Quando eu for embora será a pior noite da sua vida”
Ao tomar a iniciativa de ajudar quem tentava fugir da Ucrânia, Clara viu de perto os horrores da guerra, enquanto várias famílias precisavam se separar sem a certeza de que se veriam de novo. Após o início da invasão russa, o governo ucraniano proibiu os homens entre 18 e 60 anos de sair do país.
“Uma mãe ucraniana e seus dois filhos entraram no meu carro depois que o pai da família precisou ficar na zona de conflito. Eles choraram muito, eu precisei segurar minhas lágrimas para que a minha ajuda também trouxesse esperança”, conta a brasileira.
“‘Quando eu for embora vai ser a pior noite da sua vida’, foi isso que eu falei para a mulher quando ela recusou o dinheiro arrecadado para que os filhos pudessem comprar roupas. "Enquanto eu estivesse ali, eles teriam apoio, depois estariam por conta própria.”
“É muito difícil entender os motivos da guerra”
Além dos resgates, a brasileira se distanciou muito da fronteira da Ucrânia para levar doações às cidades que foram devastadas pela guerra. Clara conheceu Irpen e Bucha, onde vários corpos foram encontrados após a saída das tropas russas da região.
Ao visitar Mykolaiv, no sul do país, ela descobriu que os moradores da região estavam sem água, já que o encanamento da cidade foi destruído por explosões dos ataques russos.
Durante suas viagens pelo interior da Ucrânia, ela ainda recolheu artefatos da guerra para que o conflito se tornasse mais próximo ao mostrá-los para quem não viveu essa realidade de perto, como ela.
Clara também ganhou vários distintivos de soldados e policiais ucranianos que cruzaram o seu caminho para levar ajuda pelo país. Os presentes se tornaram uma forma de agradecimento pelo seu trabalho humanitário.
“Eu vi explosões de mísseis e ouvi bombas caírem em vários lugares que passei na Ucrânia, inclusive uma das bombas caiu a 1 Km de onde eu estava. É uma situação bizarra, é muito difícil entender por que esses ataques acontecem e os motivos dessa guerra.”
Volta ao Brasil e conscientização
A conscientização sobre as consequências da guerra foi um dos motivos que fez Clara voltar ao Brasil. Para ela, é importante explicar como a guerra afeta as pessoas, mesmo que estejam muito longe da linha de frente.
A brasileira também está organizando um evento no dia 3 de junho para arrecadar fundos para resgates e doações na Ucrânia, para onde voltará no próximo dia 7.
Apesar de todo o desgaste causado pelos dias em que esteve em zonas de conflito ativo, ela segue com os planos de ajuda à Ucrânia. “Eu me sinto exausta emocionalmente todos os dias, mas no grupo temos a ajuda de psicólogos porque passamos por pressões muito grandes.”
“Acho que essa guerra é uma oportunidade para que a sociedade civil possa formar uma oposição e fazer algo em relação a essa realidade. Se você opta por não fazer nada, acho que precisa repensar que tipo de pessoa quer ser.”
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