Brasileiros na Ucrânia enfrentam incertezas por ameaça russa
Em meio à tensão na fronteira, estrangeiros se deparam com a possibilidade de precisar deixar o país às pressas
Internacional|Letícia Sepúlveda, do R7
As tensões entre Rússia e Ucrânia se intensificaram nos últimos meses. Os países, que já tiveram um confronto territorial em 2014, com a anexação da península da Crimeia pelos russos, voltaram a preocupar o Ocidente.
Nesse contexto, a Rússia intensificou a presença de tropas na região da fronteira ucraniana, com mais de 100 mil soldados, mas nega ter interesse em invadir o país. O presidente Vladimir Putin não aceita que o país vizinho faça parte da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
O território ucraniano faz fronteira com a Rússia e com países da União Europeia. Dessa forma, o governo russo teme uma ofensiva do Ocidente, a partir da presença na Ucrânia da aliança militar. Os russos também pedem o fim da atuação da Otan na Polônia e nas repúblicas bálticas (Estônia, Letônia e Lituânia).
Já os EUA, que adquiriram certa influência no conflito, ameaçam a Rússia com sanções econômicas caso o país promova uma invasão. Entre elas estão o cancelamento do gasoduto de gás natural Nord Stream 2, que vai da Alemanha até o território russo, e a quebra de relações com o sistema bancário em âmbito mundial.
Na última quarta-feira (26), em resposta às propostas russas para resolver o conflito na região, os Estados Unidos não aceitaram barrar a entrada da Ucrânia na Otan. Os americanos dizem que vão defender a soberania da ex-república soviética.
Entre tantos impasses, existem brasileiros que fizeram da Ucrânia seu lar e que se sentem inseguros com a possibilidade de uma ofensiva militar envolvendo duas pontecias militares.
A jornalista Paula Pereira, de 36 anos, é natural de Jundiaí (SP), casada com um ucraniano e vive desde outubro de 2020 em Odessa, cidade localizada no sul do país.
Ela explica que entre os ucranianos com os quais convive não existe a sensação de medo. Apesar da enorme presença de militares na fronteira, eles não acreditam que a tensão entre os países resulte em uma invasão. Segundo Paula, “os ucranianos estão acostumados com essa pressão russa”.
“Como brasileira, por estar assistindo a essa situação, eu me sinto um pouco dividida. Vejo que os brasileiros que estão aqui parecem mais assustados, talvez por causa da grande mídia. Para nós, estrangeiros, talvez seja o momento em que nos questionamos sobre valer a pena esperar ou tomar alguma atitude”, pondera.
Paula afirma que em Odessa muitas pessoas são descendentes de russos, inclusive seu marido. “O idioma russo também é muito utilizado aqui, mas isso não significa que a população seja pró-Rússia, as pessoas ficam bem divididas.”
Na capital, Kiev, Rony de Moura, de 34 anos, natural de Niquelândia (GO), se prepara para as últimas provas antes de se formar em medicina. Começou a graduação na Rússia, mas cursou os últimos três anos na Ucrânia.
“Cheguei à Rússia dois dias antes da invasão na Crimeia. Quando estava em Moscou, vi os tanques de guerra nos comboios dos trens partindo para a região”, lembra o brasileiro.
Ele afirma não concordar com a entrada da Ucrânia na Otan, diz que em meio à crise está do lado da Rússia. Para Rony, a inclusão dos ucranianos na aliança militar facilitaria o repasse de armas dos países-membros para a fronteira, o que aumentaria a tensão na região.
Ele também ressalta que os ucranianos com quem convive em Kiev temem a invasão. “Apesar de os costumes serem bem parecidos, eles tentam se afastar ao máximo da Rússia.”
Prestes a concluir a graduação, Rony já entrou em contato com a embaixada brasileira e está disposto a deixar o país caso o conflito se agrave.
Paula e o marido decidiram não sair da Ucrânia. “Até temos uma bolsa preparada com alguns documentos essenciais, mas decidimos esperar. (...) Poderia voltar para o Brasil para não me expor ao risco, mas ao mesmo tempo não quero sair daqui às pressas.”
“Penso que o melhor caminho para a Ucrânia é conseguir liberdade para fazer suas escolhas políticas e econômicas, independentemente de aliados”, completa.
Devido à tensão na fronteira, o governo dos Estado Unidos recomendou que os cidadãos americanos saiam imediatamente do território ucraniano. O Departamento de Estado retirou de Kiev as famílias dos trabalhadores da embaixada. O Canadá, o Reino Unido e a Austrália também retiraram diplomatas e seus familiares do país após o aumento das tensões militares e diplomáticas na região.