Brexit sem acordo: o que isso significa para o Reino Unido em 2021?
A duas semanas do prazo final, país e União Europeia ainda discutem acordo, que pode impactar fortemente a economia britânica
Internacional|Giovanna Orlando, do R7
Faltando duas semanas para o fim de 2020, o Reino Unido e a União Europeia correm contra o tempo para encontrar um acordo comercial satisfatório para o Brexit. Apesar de os britânicos terem saído formalmente do bloco europeu no começo deste ano, as novas regras para o comércio só começam a valer em 2021.
Apesar dos anos de negociação e do desejo do Reino Unido de deixar de vez o bloco europeu, as negociações não avançaram significativamente neste ano e agora os dois lados tentam encontrar um acordo comercial que satisfaça os seus requisitos e que permitam que os negócios de ambos continuem funcionando.
Nessa roda de negociações, três problemas emperram a saída de um acordo: a fiscalização no Reino Unido, pesca e uso de águas britânicas e questões ideológicas, apontam especialistas. Com um prazo apertado e sem a chance de uma extensão longa, a possibilidade de o Reino Unido deixar o bloco sem um acordo é grande.
Segundo o professor de Relações Internacionais da USP, Kai Enno Lehmann, o Brexit nunca vai acabar de fato. “Cada vez que a União Europeia mudar alguma coisa, mexer em um acordo ou fechar com algum país com que o Reino Unido não tenha esse acordo, os britânicos vão ter que se mexer”, explica.
Os problemas para o acordo comercial
Nesse momento, o Reino Unido tem alguns pontos de atrito com a União Europeia e os rascunhos para o acordo comercial.
Um deles é o setor da pesca, que apesar de não ser expressivo para a economia britânica, é importante politicamente.
“Você tem uma dificuldade em delimitar as águas e o uso de barcos da União Europeia no território britânico. O Reino Unido está tentando garantir uma maior reserva de mercado, ainda que a União Europeia tenha o costume de usar essa água”, explica o professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, Pedro Brites.
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Em uma tentativa de se beneficiar, o Reino Unido sugeriu que apenas barcos britânicos usassem as águas, fazendo com que pescadores europeus aluguem embarcações inglesas para trabalhar, e consequentemente impulsionar também o próprio mercado naval.
A União Europeia sugeriu um período de transição, para que os dois lados concordem com a delimitação do território marítimo e como a pesca vai funcionar na região.
Um segundo ponto de atrito são as fiscalizações trabalhistas no Reino Unido. O governo britânico não quer ser submetido ao Tribunal da União Europeia e os europeus temem que os britânicos flexibilizem as leis trabalhistas no país, o que daria vantagens nos produtos e serviços do bloco, explica o especialista.
Outro problema é que o acordo comercial exclui a área de serviços, destaca Lehmann. “A economia britânica se baseia em serviços, não em produtos”, explica.
Segundo o professor, outro problema também é a questão ideológica que rege o governo britânico. Enquanto parte do governo britânico defende uma saída sem acordo algum, outra ala espera que exista uma espécie de negociação, ainda que básica.
“Esse acordo é diferente dos outros acordos, porque enquanto eles derrubam barreiras, com esse você tenta criar barreiras que não existem na União Europeia”, analisa.
Como fica o Reino Unido?
Caso o Reino Unido realmente termine o ano sem um acordo comercial com a UE, a expectativa é de caos, brincam os especialistas. Sem saber como as negociações com o bloco europeu ficam, milhares de britânicos que trabalham em outros países vão ficar na incerteza do futuro de seus empregos, além das exportações precisarem de uma nova legislação.
“O caos que vai acontecer no dia 1º vai ser enorme nos dois lados, mas vai ser pior no Reino Unido. A União Europeia tem feito mais preparações práticas para isso”, explica Lehmann.
Sem um acordo bilateral, os dois lados agora terão que negociar através das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), que são ainda mais básicas.
Para 2021, o cenário na economia britânica não é tão animador, mas “a discussão que há é se esse impacto vai ser imediato e muito forte ou se vai ser mais devagar, se vai ser sentido a médio prazo”, analisa Lehmann.
Para Brites, o resultado dessa falta de acordo vai ser sentida na segunda metade de 2021, já que o primeiro semestre ainda vai ser de recuperação da pandemia do novo coronavírus.
O Reino Unido é um dos países mais afetados pela covid-19 na Europa, e foi o primeiro a começar a campanha de vacinação contra a doença.