Com escândalo em Portugal, casos de abuso sexual se aproximam de 360 mil na Igreja Católica
Estimativas mostram que maior parte dos casos ocorreu na França, com cerca de 330 mil menores vítimas de padres desde 1950
Internacional|Do R7, com informações da EFE e AFP
Os quase 5.000 crianças e adolescentes que foram vítimas de abusos sexuais de integrantes da Igreja Católica, somente em Portugal, engrossam uma lista com centenas de milhares de vítimas de padres, religiosos e pessoas próximas à instituição religiosa nas últimas décadas.
Com as descobertas hoje em Portugal, a estimativa de vítimas de abuso sexual dentro da Igreja Católica chega à marca de 359.279 casos desde os anos 1950 — a maior parte na França, com mais de 330 mil casos, de acordo com os cálculos.
O número representa o somatório de casos apontados em países como França, EUA, Chile, Irlanda, Alemanha, Polônia e Austrália — veja a lista abaixo.
Portugal
Precisamente, o número de menores que sofreram abusos de membros da Igreja Católica alcança 4.815 no país ibérico, de acordo com um relatório divulgado nesta segunda-feira (13), feito por uma comissão independente depois de ouvir centenas de depoimentos.
Desse total, 112 testemunhos de vítimas foram oficialmente validados. Do número de denúncias recebidas, o grupo encaminhou ao Ministério Público apenas 25, porque a maioria já prescreveu — embora esteja sendo preparada uma lista de abusadores que ainda estão na ativa. As investigações já estão em andamento.
"Não é possível quantificar o total de crimes", disse o coordenador do grupo, o psicólogo Pedro Strecht, que garantiu que "a maioria das vítimas foi abusada por mais de uma vez", de acordo com as conclusões da apuração feita pela comissão dos casos ocorridos na Igreja Católica nos últimos 70 anos em Portugal.
A investigação foi solicitada em 2021 pela Igreja de Portugal, um país de arraigada tradição católica. Em outubro, uma equipe de seis especialistas, liderada por Strecht, anunciou que havia registrado 424 testemunhos legítimos de supostas vítimas, mas advertiu que o número total era "muito maior".
Os fatos denunciados revelam "situações graves que persistiram durante décadas, que se tornam mais evidentes à medida que se recua no tempo e que, em alguns locais, adquiriram proporções verdadeiramente endêmicas", concluiu a equipe em outubro, em um relatório preliminar.
Um dos 25 casos é o de Alexandra, o segundo nome de uma mulher de 43 anos que prefere permanecer no anonimato e que foi estuprada por um padre quando se preparava para a vida de freira aos 17 anos.
Perfil das vítimas de abuso
A maioria dos autores dos abusos era homem (96% do total) e exercia a função de padre — cerca de 70%. Na maior parte das vezes, os atos aconteceram em seminários, centros de acolhimento, escolas ou instituições esportivas.
A média de idade das vítimas era de pouco mais de 11 anos, com a maioria em torno de 52 atualmente. Grande parte era de crianças, que se afastaram da Igreja.
Por regiões, os crimes ocorreram em todo o país, com maior incidência em Lisboa, Porto e Braga.
A comissão cobrou ações da Justiça local e pediu acompanhamento psicológico para as vítimas e a suspensão da prescrição dos crimes, que é de 30 anos.
Escândalo na França
O documento divulgado hoje em Portugal integra uma série de escândalos sexuais que envolvem padres da Igreja Católica. Em outubro de 2021, outra comissão independente, da França, emitiu um relatório que chocou o mundo.
Na ocasião, a investigação sobre a violência sexual dentro da Igreja Católica francesa calculou em 330 mil o número de menores que foram vítimas de padres, religiosos e pessoas próximas a instituições católicas desde 1950. Esses números são uma estimativa.
Crimes nos EUA
Entre 1950 e 2018, a Igreja Católica nos Estados Unidos recebeu denúncias de mais de 20 mil menores que afirmaram ter sido vítimas de abuso por parte de cerca de 7.000 membros do clero, segundo o site bispo-accountability.org, que compila casos.
Em 2002, o jornal Boston Globe revelou que a hierarquia católica de Boston, incluindo o arcebispo Bernard Law, encobriu agressões sexuais cometidas por quase 90 padres ao longo de décadas.
Em 2019, o papa Francisco expulsou o cardeal Theodore McCarrick da Igreja sob acusação de ter abusado sexualmente de adolescentes na década de 1970.
Chile
Mais de 200 membros da Igreja chilena foram investigados por 150 casos de agressões sexuais. Mais de 240 vítimas foram identificadas, 123 delas menores de idade.
O escândalo mais divulgado foi o que envolveu o padre Fernando Karadima por seus ataques contra menores entre as décadas de 1980 e 1990 em uma rica paróquia da capital, Santiago.
Em uma polêmica visita ao Chile em 2018, o papa Francisco foi censurado por não agir, ao apoiar um bispo acusado de encobrir crimes atribuídos a Karadima. O pontífice fez um mea culpa e em Roma aceitou a renúncia de sete bispos chilenos.
Abusos sexuais na Alemanha
Uma pesquisa de 2017 descobriu que pelo menos 547 menores de um coro católico de Regensburg foram abusados entre 1945 e o início dos anos 1990.
Em 2018, um estudo de acadêmicos concluiu que 3.677 menores foram vítimas de violência sexual na Alemanha entre 1946 e 2014.
O papa Bento 16, que morreu em dezembro do ano passado, foi questionado quando já era emérito em 2022 por sua gestão da pedofilia na Alemanha quando era arcebispo de Munique.
Segundo um relatório dessa diocese, entre 1945 e 2019 pelo menos 497 pessoas, a maioria crianças e adolescentes, foram vítimas de agressões sexuais.
Escândalos da Igreja Católica na Irlanda
Na Irlanda, as primeiras alegações surgiram na década de 1980.
A partir de 2008, a Igreja iniciou uma série de investigações internas sobre a alegação de agressões sexuais cometidas desde 1975 por pelo menos 85 padres.
Polônia
Desde 2018, a Igreja Católica na Polônia recebeu centenas de denúncias sobre agressões sexuais contra menores atribuídas ao clero.
Em 2019, admitiu que quase 400 padres abusaram sexualmente de crianças ao longo de três décadas.
Austrália
Após uma série de escândalos, uma comissão do governo investigou, entre 2013 e 2017, a Igreja Católica e outras instituições que abrigam menores.
O relatório concluiu que 7% dos religiosos católicos receberam denúncias de agressão sexual contra menores entre 1950 e 2010, sem que isso implicasse uma investigação dos fatos.